Autor: Adam Ali

A história está repleta de personagens que são considerados vilões. Suas histórias são geralmente mais complexas e muitas vezes dependem de quem as conta. Seria esse o caso quando se trata de al-Hajjaj?

Al-Hajjaj ibn Yusuf al-Thaqafi foi o governante mais famoso e mais capacitado do califado Omíada. Ele administrou a “super província” oriental do califado que incluía o Iraque, o Khurasan e o Sijistão de 694 a 714. Ele restaurou a ordem nos domínios indisciplinados que governava, expandiu as fronteiras do império mais a leste por meio de novas conquistas na Transoxiana e instituiu reformas políticas, fiscais, administrativas e agrícolas. Apesar de suas realizações, al-Hajjaj é retratado de maneira bastante negativa nas fontes históricas. É importante notar que a maior parte do material que sobreviveu sobre o período Omíada foi composta durante o governo dos Abássidas, que derrubaram os omíadas. Portanto, não deveria ser surpreendente que essas fontes frequentemente sejam tendenciosas contra os califas omíadas e seus apoiadores. Eles são descritos como materialistas, mundanos, sedentos de poder, ímpios e imorais. A imagem que as fontes traçam de al-Hajjaj é a de um homem sem escrúpulos; ele era duro, implacável e que sem escrúpulos fazia o que fosse necessário para dar conta do recado.

Al-Hajjaj ganhou destaque durante um período de instabilidade e incerteza. O regime omíada estava lutando para sobreviver durante a Segunda Fitna (a Segunda Guerra Civil Islâmica, 680-692). Vários grupos lutavam pelo poder dentro do califado durante este conflito. O desafio de Al-Husayn à ascensão do segundo califa omíada, Yazid, inaugurou o conflito. Ele era neto do profeta por meio de sua filha Fátima, filho de Ali ibn Abi Talib, o quarto califa Rashidun. Al-Husayn e seu bando de cerca de 70 seguidores foram interceptados e massacrados em Karbala por uma força omíada muito superior em 680. O episódio de Al-Husayn na Segunda Fitna parece insignificante em comparação com alguns dos outros incidentes. Mas sua morte enviou ondas de choque por todo o império e ampliou o abismo entre os apoiadores dos Alidas e os demais muçulmanos, sendo um dos eventos centrais que levaria à formação de uma outra seita xiita (e que se dividiria em várias sub-seitas) no futuro.

Ameaças mais sérias ao governo omíada vieram dos kharijitas que se rebelaram no Iraque; a rebelião de Mukhtar em Kufa e o desafio dos zubayridas, liderados por Abdallah ibn al-Zubayr, que criou um califado rival. Os kharijitas continuaram sendo uma ameaça durante o período abássida, mas veremos que al-Hajjaj os levou a ceder durante seu mandato como governante do Iraque. A revolta Alida de Mukhtar tirou Kufa temporariamente do controle do califado. Mukhtar lançou sua rebelião em nome de Muhammad ibn al-Hanafiyya, filho de Ali ibn Abi Talib e uma de suas concubinas. Mukhtar atraiu tribos árabes insatisfeitas e convertidos não árabes ao Islã (chamados nessa época de mawali). Mukhtar foi derrotado por Mu’sab ibn al-Zubayr, o governante Zubayrida de Basra.

Os zubayridas representaram o maior desafio para os omíadas. Abdallah ibn al-Zunayr autoproclamou-se califa em Meca e criou um califado rival que controlava a Arábia, o Egito e o Iraque no auge de seu poder. Ele era filho de al-Zubayr ibn al-Awwam, um companheiro próximo do profeta e seu primo materno. A Segunda Fitna terminou com a derrota e a morte de Abdallah ibn al-Zubayr em 692. Al-Hajjaj desempenhou um papel proeminente no fim da guerra civil e, mais uma vez, unindo o califado sob o governo Omíada.

O início da carreira de Al-Hajjaj

Pouco se sabe sobre o início da vida e carreira de al-Hajjaj. Ele nasceu em 661 na tribo Thaqif em Ta’if, uma cidade tradicionalmente aliada a Meca antes mesmo do surgimento do Islã. Sua família era pobre e de origem humilde. Na verdade, seus ancestrais ganhavam a vida como construtores e carregadores de pedra. Antes de ocupar cargos públicos, al-Hajjaj foi professor em Ta’if. Da mesma forma, muito pouco se sabe sobre o início de sua carreira. Ele participou de duas campanhas militares do lado omíada no início da guerra civil, mas não se destacou em nenhuma delas. Ele esteve presente na Batalha de Harra em 682, que viu a derrota do povo de Medina que havia saído em apoio a Ibn al-Zunayr, derrotados por um exército Omíada. Ele também participou da fracassada expedição omíada contra Medina, que culminou na Batalha de Rabhada (também conhecida como Batalha de Marj Rahit) em 684. Al-Hajjaj e seu pai, Yusuf ibn al-Hakam, escaparam do desastre com um único camelo, e al-Tabari relata que eles estavam entre os poucos que sobreviveram à batalha e voltaram vivos para a Síria.

Mapa do Oriente Médio em 685-687 – by AhmadLX / Wikimedia Commons

A sorte de al-Hajjaj começou a mudar após a ascensão de Abd al-Malik (r. 685-705) ao califado omíada. Ele se juntou à shurta (a força policial e a unidade de elite das forças sírias dos omíadas) e chamou a atenção de seu soberano porque foi capaz de conter rapidamente um motim entre as tropas que o califa pretendia liderar em uma campanha contra os zubayridas no Iraque. A maneira draconiana com que restaurou a disciplina entre as tropas rebeldes se tornaria sua marca registrada e o elevaria à infâmia. Na campanha que se seguiu, al-Hajjaj comandou a retaguarda dos omíadas e se destacou contra as forças de Mus’ab ibn al-Zubayr (irmão de Abdallah ibn al-Zubayr e governador no Iraque). A derrota de Mus’ab em 691 resultou nos omíadas reafirmando seu controle sobre o Iraque e as regiões orientais do califado, privando Abdallah ibn al-Zubayr de recursos vitais e de mão de obra.

Pouco depois de derrotar Mus’ab, Abd al-Malik incumbiu al-Hajjaj de pôr fim aos zubayridas e o enviou contra Abdallah ibn al-Zubayr em Meca com 2.000 soldados sírios. O califa ordenou a al-Hajjaj que tentasse garantir a rendição de Ibn al-Zubayr com a promessa de perdão se ele se rendesse, e também para evitar derramamento de sangue nos arredores de uma das cidades mais sagradas do Islã. Al-Hajjaj marchou para o sul e imediatamente tomou Ta’if, sua cidade natal, sem batalhar, e a usou como sua base de operações. Abdallah ibn al-Zubayr rejeitou a oferta omíada e al-Hajjaj recebeu permissão do califa para sitiar Meca. Al-Hajjaj, depois de receber mais reforços, começou a bombardear Meca com catapultas. Este bombardeio não diminuiu nem durante a peregrinação e nem mesmo a Caaba foi poupada. O cerco durou sete meses. Durante esse tempo, mais de 10.000 dos homens de Ibn al-Zubayr, incluindo dois de seus filhos, desertaram para o lado de al-Hajjaj. Ibn al-Zubayr e um grupo de seus últimos seguidores leais, incluindo seu filho mais novo, foram mortos lutando ao redor da Caaba enquanto tentavam se defender das esmagadoras tropas de al-Hajjaj em outubro de 692. Al-Hajjaj amarrou o corpo de ibn al-Zubayr perto da Caaba e sua mãe só teve permissão para recuperá-lo depois que o califa deu sua permissão.

Al-Hajjaj foi recompensado por seus serviços por Abd al-Malik com o governo do Hijaz (oeste da Arábia), Iêmen e Yamama. Ele liderou o Hajj (peregrinação anual) a Meca pessoalmente em 693 e 694, consertou a Caaba e restaurou-a às suas dimensões originais (tinha sido alterada por Abdallah ibn al-Zubayr). Ele também restaurou a paz e a ordem no Hijaz. No entanto, a extrema severidade de seus métodos exigia que o califa interviesse com frequência devido às reclamações contra seu governador excessivamente zeloso.

O discurso

Em 694, al-Hajjaj foi nomeado governante do Iraque. O governo do Iraque era o cargo administrativo mais importante no califado porque a rebeldia das tropas estacionadas no Iraque tinha sido como um espinho para os califas desde o reinado de Uthman (r. 644-656) e especialmente durante as duas primeiras Guerras Civis Islâmicas. Além disso, os Kharijitas também estavam alocados no Iraque e estavam constantemente criando agitações contra o governo central. Não somente, as regiões a leste do Iraque que foram conquistadas pelas tropas estabelecidas em Basra e Kufa também ficaram sob a jurisdição do governante do Iraque, cujas responsabilidades incluíam o cuidado da fronteira e a posterior expansão para o leste. Al-Hajjaj tinha 33 anos quando assumiu este cargo.

Inicialmente, seu governo excluía as regiões orientais do Khurasan e Sijistão, mas em 697 essas regiões foram adicionadas à sua jurisdição. Portanto, como governador do Iraque, al-Hajjaj administrava uma enorme super província ou vice-realeza que se estendia da Mesopotâmia à Ásia Central e ao subcontinente indiano, onde as fronteiras do califado ainda estavam se expandindo. Esses territórios compreendiam metade do Califado e produziam mais da metade de sua renda.

Apesar de estar sob o governo Omíada após sua vitória na Segunda Fitna, o Iraque ainda estava em desordem. Os soldados estavam amotinados e a disciplina era fraca. Na época em que al-Hajjaj se tornou governador, as tropas deveriam estar guarnecidas em um acampamento em Ramhurmuz, no outro lado do Tigre, sob o comando de Muhallab ibn Abi Sufra. Muitos desses soldados haviam deixado o acampamento sem permissão e voltado para suas casas em Kufa, onde estavam vagando pela cidade. A primeira tarefa de Al-Hajjaj foi restaurar a ordem e a disciplina nas fileiras. Quando seu exército se aproximou de Kufa, al-Hajjaj cavalgou à frente de suas tropas e entrou na cidade sozinho. Ele entrou na mesquita de Kufa, subiu ao púlpito e fez seu famoso discurso inaugural como governante. Por meio desse discurso, ele deixou bem claro sobre o quanto falava sério e como não toleraria nenhuma desobediência por parte da soldadesca do Iraque. O que se segue é uma tradução de Eric Schroeder desse discurso em Muhammad’s People: A Tale by Anthology:

“Sou um homem famoso; minhas ações aumentam meu louvor. Se eu tirar meu turbante, ainda assim vocês reconhecerão meu rosto!

Deem boa uma olhada em mim! Vejo olhos e pescoços tensos – cabeças maduras para a colheita! Bem, eu sou um mestre nisso; já acho que vejo o brilho de sangue entre aqueles turbantes e aquelas barbas.

O Príncipe dos Verdadeiros Crentes esvaziou sua aljava e encontrou em mim sua flecha mais cruel, do aço mais afiado, da madeira mais resistente. Ó iraquianos! Rebeldes e traidores! Corações vis! Não sou um homem para ser amassado como um figo, seus escravos açoitados e filhos de mães escravas! Eu sou Hajjaj ibn Yusuf, um homem, eu prometo a vocês, que não ameaço, mas o executo, nem tosqueio, e sim esfolo. Não haverão mais encontros em multidões! Sem mais reuniões! Sem mais falatórios! Chega de: ”O que há de novo? Quais as novidades?”

Que negócio é esse, seus filhos da puta? Que cada homem cuide da sua vida. E ai do homem em quem eu colocar minhas mãos! Andem sempre em frente e não virem para a direita nem para a esquerda. Sigam seus oficiais, façam o juramento e se encolham!

E lembre-se disso: não quero falar duas vezes. Gosto da oratória para mim tanto quanto gosto da covardia em vocês, ou da traição, como a sua. Deixe esta espada sair uma vez de sua bainha, e ela não será embainhada, venha o inverno, venha o verão, até que o Príncipe dos Verdadeiros Crentes, com a ajuda de Deus, endireite cada homem que se afasta e derrube todos vocês que levantam a cabeça.

Chega! O Príncipe dos Verdadeiros Crentes me instruiu a lhes dar seu pagamento e despachá-los contra o inimigo, sob o comando de Muhallab. Eu dou a vocês essas ordens; e concedo três dias de graça. E que Deus ouça este juramento e me chame para prestar contas por ele: cada soldado do exército de Muhallab que eu encontrar aqui ao término desse mandato perderá sua cabeça, e seus bens serão pilhados”.

O discurso teve um efeito imediato e os soldados voltaram para o acampamento, onde receberam o pagamento diretamente de al-Hajjaj. Mais uma vez, houve um motim porque houve uma redução nos salários dos soldados, mas al-Hajjaj pôs fim a isso com mão pesada. Depois que a ordem e a disciplina foram restauradas nas fileiras, as tropas foram imediatamente enviadas para lutar contra os Kharijitas, os mais perigosos e extremistas dos quais eram os Azariqa liderados por Katari ibn Fujaa’a. Este grupo foi derrotado em 696. Outro exército Kharijita liderado por Shabib ibn Yazid estava operando no norte do Iraque. O exército também foi enviado contra eles e conseguiu derrotá-los em 697, após vários reveses e com a ajuda de tropas sírias enviadas como reforços. Nesse mesmo ano, al-Hajjaj também agiu contra e derrotou o governante rebelde de Madain (Ctesiphon, a antiga capital sassânida), que se rebelou e invadiu suas terras junto com os Kharijitas. Foi depois de derrotar os kharijitas no Iraque e neutralizá-los como uma ameaça ao califa que al-Hajjaj recebeu jurisdição sobre todo o lado oriental do califado.

A Rebelião Final

A última e provavelmente a mais perigosa rebelião que al-Hajjaj teve de subjugar foi a revolta de Abd al-Rahman ibn al-Ashath. Em 698, Zunbil, que era o governante semi-independente do Zabulistão (uma região de fronteira entre o Khurasan e a Índia no atual sul do Afeganistão), derrotou severamente um exército de árabes enviado pelo governador do Sistão. Ele os atraiu para dentro de seus domínios montanhosos e então os emboscou e impediu sua fuga. Os Zunbils (título dos governantes desta região) eram ferozmente independentes e resistiram à invasão do califado até sua derrota final para os Saffardis no século IX. Os Zunbils eram provavelmente pagãos que praticavam a adoração do sol. Os habitantes de seus domínios também incluíam budistas e alguns zoroastristas, além de uma variedade de cultos pagãos.

Al-Hajjaj despachou Ibn al-Ashath com um grande e bem equipado exército para invadir e conquistar o Zabulistão. Este exército é mencionado nas fontes como “Exército Pavão” porque foi equipado com as melhores armaduras, armas e equipamentos. Ibn al-Ashath sistematicamente começou sua campanha subjugando e conquistando todas as aldeias, cidades e fortalezas nas terras baixas que cercavam a área central montanhosa dos domínios de Zunbil. Depois de fortificar e guarnecer as regiões conquistadas, Ibn al-Ashath retirou-se para Bust durante o inverno. Essa mudança não agradou a al-Hajjaj, que exigiu que ele continuasse fazendo campanha durante o inverno.

A desavença entre o general e o governante escalou ao ponto onde Ibn al-Ashath ergueu as bandeiras da revolta e começou a marchar para o oeste. À medida que avançava no Iraque, ele reuniu para si um grande número de árabes e não árabes que estavam insatisfeitos com as políticas severas de al-Hajjaj e o governo Omíada. Al-Hajjaj foi sitiado em Basra, mas foi capaz de derrotar Ibn al-Ashath, mais uma vez com reforços da Síria em 701. O resultado dessa revolta foi a desmobilização dos exércitos do Iraque que estavam baseados em Kufa e Basra e sua remoção da folha de pagamento militar. O novo exército imperial era composto principalmente de soldados sírios leais. Uma nova cidade-guarnição, Wasit, foi construída por al-Hajjaj no meio do caminho entre Kufa e Basra e guarnecida por um exército sírio para manter a ordem no Iraque e os baçorinos e kufanos na linha.

Al-Hajjaj tornou-se o único poder nas partes orientais do califado depois de derrotar Ibn al-Ashath. Sua influência aumentou ainda mais após a morte de Abd al-Malik em 705. O novo califa, al-Walid (r. 705-715), agradeceu a al-Hajjaj por seu apoio em sua ascensão ao trono e concedeu-lhe liberdade para agir. Algumas das maiores vitórias e conquistas no leste desde a primeira onda de expansões ocorreram durante o reinado de al-Walid, tudo graças aos esforços de al-Hajjaj. Ele nomeou generais competentes para realizar suas campanhas meticulosamente planejadas e bem financiadas. Qutayba ibn Muslim conquistou a Transoxania (Ásia Central), Mujja’a ibn Si’r conquistou o Omã e Muhammad ibn Qasim al-Thaqafi conquistou Sind e Multan (no atual Paquistão).

Dirham de prata contendo os motivos sassânidas, cravado em nome de al-Hajjaj – imagem cortesia do Classical Numismatic Group, Inc. http://www.cngcoins.com

Após a pacificação de seus territórios e décadas de guerra, o principal objetivo de al-Hajjaj era tornar prósperos os domínios de seu governo. Ele empreendeu grandes projetos para melhorar a produtividade agrícola. Um desses projetos foi a drenagem dos pântanos no sul do Iraque usando um sistema de canais e a recuperação de terras para uso agrícola. Ele proibiu a migração de pessoas das regiões rurais para as cidades e até rejeitou a conversão de milhares de camponeses iranianos ao Islã. Em vez disso, ele os mandou de volta para suas terras e ordenou que continuassem a cultivá-las e a pagar seus impostos. Isso não é surpreendente para um homem tão pragmático, cujo objetivo principal era maximizar a produção agrícola e a cobrança de impostos. Muitos dos camponeses se converteram ao Islã para evitar o pagamento de impostos e também para se alistarem no exército e receber estipêndios. Se al-Hajjaj tivesse permitido que isso ocorresse, haveria menos terra cultivada, menor rendimento de impostos e maiores despesas militares. Na verdade, a conversão de povos conquistados raramente era uma prioridade durante os primeiros períodos do califado e em muitas partes do califado os conquistadores muçulmanos permaneceram uma minoria em alguns casos por até dois séculos.

Al-Hajjaj também começou a cunhar moedas árabes em conjunto com as reformas monetárias de Abd al-Malik. Essas moedas eventualmente substituíram as moedas bizantinas e sassânidas que permaneceram em circulação após as primeiras conquistas. Ele fundou casas da moeda em Basra e Wasit e nomeou Sumayr, um judeu, para supervisioná-las. Ele também mandou traduzir os diwan (registros) fiscais do persa e do aramaico para o árabe, a fim de revisá-los pessoalmente. Isso aconteceu de mãos dadas com as reformas administrativas de Abd al-Malik na capital, que viram a arabização da administração, que até então havia sido conduzida principalmente em grego. Al-Hajjaj até deixou sua marca no Alcorão. Alguns estudiosos atribuem a ele os diacríticos e vogais curtas, bem como sua divisão em partes (ajza’).

Definindo o vilão

Então, como pode al-Hajjaj ser avaliado? Existem vários argumentos a favor e contra ele. Os abássidas são especialmente hostis. Quando se tratava de questões de estado, ele era severo e impiedoso e não tinha escrúpulos quando se tratava de derramar o sangue de rebeldes e traidores e até mesmo da dizimação de suas próprias tropas se elas se amotinassem. Ele até mesmo bombardeou a Caaba e derramou sangue dentro dos recintos sagrados, a fim de pôr fim à Segunda Fitna. Ele também era impiedoso e draconiano quando se tratava de conduzir seus soldados durante as campanhas militares e também ao coletar impostos.

Talvez seja essa crueldade que lhe rendeu a imagem negativa nas fontes e o ódio daqueles que governou. Em seu livro The End of the Jihad StateKhalid Yahya Blankenship o descreve como “honesto, escrupulosamente leal ao califa e impiedoso na coleta de impostos”. Em uma anedota relatada por al-Tabari, um homem elogiou al-Hajjaj na presença do califa abássida al-Mansur (r. 754-775). Um de seus cortesãos reclamou: “Nunca pensei que viveria para ver o dia em que Hajjaj fosse elogiado em sua presença”. A isso, al-Mansur respondeu: “E por que negar? Este homem era confiável por seus patronos, e ele garantiu o estado para eles. Quem dera eu pudesse encontrar alguém em quem confiar, como fizeram com ele, e me dar tempo longe do governo!”

Ainda ficamos com a questão de saber se al-Hajjaj foi um vilão histórico ou um servo leal e eficaz dos califas e um pragmático que fez tudo o que julgou necessário para alcançar o sucesso. Tudo depende de como se define um “vilão”.

Fonte: Medievalists.net