Texto de: Prof. Dr. Nazeer Ahmed

Mais de mil anos antes das nações modernas estabelecerem as operações de inteligência ‘’punhal e capa’’, a arte de assassinato político foi aperfeiçoada na Ásia Ocidental. O arquiteto desta arte foi Hassan al Sabbah, um personagem sombrio e exótico, envolto em mistério, sobre quem tanta informação como desinformação chegou até nós.

Os seljúcidas inclinaram a balança interna do poder dentro do mundo islâmico, decididamente a favor dos sunitas. A vitória de Tughril Beg sobre o desafio combinado dos fatímidas e buídas, ambas dinastias xiitas, entre 1056 e 1060, marcou o ponto de viragem nesta luta. Com esta vitória, a maré fatímida recuou em direção ao Cairo.

A manutenção dos abássidas em Bagdá estava garantida. A partir de então, a visão ortodoxa do Islã, com um acento no componente da escola de jurisprudência hanafi e teologia ash’ari, iria dominar a história muçulmana. Isto não é surpresa, considerando que os turcos abraçaram e defenderam a escola de jurisprudência hanafi e a perspectiva filosófica/teológica ashari.

A resposta fatímida à sua derrocada em Bagdá foi uma guerra clandestina mortal dirigida às lideranças do islamismo sunita. A técnica consistia em usar o assassinato como uma ferramenta política.

O arquiteto do Movimento Assassino foi Hassan al Sabbah (1050–1124). Hassan, em seus primeiros anos, era um colega de escola de Nizam al-Mulk, que passou a se tornar o vizir mais célebres do período seljúcida. Conta-se que Hassan foi rejeitado em suas ambições de obter uma posição alta na administração seljúcida.

Seja por convicção ou despeito, ele se tornou ismaelita, passando para o lado fatímida, e com o consentimento e conivência dos califas do Cairo, voltou seu punhal contra a cabeça da liderança sunita.

Hassan al Sabbah retirou-se para as montanhas do norte da Síria, e estabeleceu seu esconderijo nas áreas montanhosas remotas de Mazanderan. Lá, ele montou sua sede e iniciou um reinado de terror. A estrutura do seu movimento clandestino era piramidal com Hassan no vértice da pirâmide.

Ele recebeu o título de Shaykh al Jabal, ou “O velho da montanha”. Em seguida na hierarquia, estavam os dais, divulgadores ou missionários, que eram treinados para propagar o movimento. Abaixo do estrado estavam os fidayin ( “devotos”, “mártires” ou “aqueles que se redimem pelo sacrifício”), que eram doutrinados como verdadeiros crentes na doutrina de Hassan e agiam como agentes de seu mestre.

Eles foram encarregados com a responsabilidade de realizar os assassinatos nos cantos mais distantes dos domínios islâmicos. Na parte inferior do degrau estavam os rafiqs, os recrutas não iniciados, que eram submetidos a doutrinação antes da sua iniciação de fidayis.

Em 1175 durante o cerco de Alepo, membros da seita dos assassinos designaram-se a servir Saladino como soldados, porém na primeira oportunidade tentaram esfaquear o sultão, que escapou por pouco da morte devido a armadura sob suas vestes.

O termo ‘’assassino’’ deriva da palavra árabe hashashin (aqueles que consomem haxixe), porque os fidayis utilizavam haxixe como intoxicante, para que embriagados cometessem seus crimes.

O haxixe era importado principalmente da Índia, embora também fosse cultivado localmente. O termo hindustani para o haxixe é “ganja”, um produto semelhante à maconha, ainda amplamente cultivado e utilizado no subcontinente.

O movimento assassino também é chamado de movimento fidayi e seus seguidores são referidos como fidayin. Em turco são conhecidos como o movimento nizari. Ambas as designações implicam numa vontade de morrer pela causa de um movimento. Os árabes os chamavam de fidayeenmulahida (os ímpios).

Em um vale perto de seu quartel-general, Hassan criou um verdadeiro paraíso com pomares, jardins e centenas de belas mulheres jovens. Os recrutas eram fortemente drogados com haxixe e depois levados para o vale.

Quando acordavam na companhia de belas mulheres entre os jardins, os jovens acreditavam estar no céu, como descrito no Alcorão. Aqui eles recebiam uma dose pesada de doutrinação nos segredos do movimento assassino. Obediência total e completa para os comandos do mestre era exigida dos iniciados.

Os graduados seriam soltos nos vastos domínios dos reis e sultões, e fomentariam a vingança pela derrota dos fatímidas nas mãos dos seljúcidas. Os assassinos dirigiram-se para a “cabeça” do islamismo sunita. Centenas de notáveis vizires e generais caíram para os punhais dos assassinos ou copos de veneno dos fidayin.

O provavelmente mais notável entre aqueles assassinados estava Nizam al-Mulk, o grão-vizir do sultão seljúcida Malik Shah. Nizam foi sem dúvida um dos mais hábeis administradores produzidos pelos muçulmanos. Seu celebre livro, Siasatnama, escrito em persa, é uma obra-prima da arte da administração e política. Foi Nizam que forneceu uma âncora estável para o navio seljúcida.

Ele estabeleceu as universidades em que algumas das mentes mais capazes da era lecionaram. Ele construiu hospitais, estradas e canais, a agricultura foi incentivada, o poderio militar foi reforçado, a arrecadação de impostos racionalizada, políticas fiscais implementadas, e promoveu o comércio nacional e internacional com a Índia e a China.

Os seljúcidas prosperaram e Bagdá, mais uma vez tornou-se a primeira cidade do mundo. Um dos estudiosos mais notáveis ​​que ensinaram na Universidade Nizamiya em Bagdá foi o Imam al-Ghazali que mudou o curso da história islâmica pela completa e pura força de sua caneta.

Miniatura do século XIV e sua reconstrução retratando o assassinato de Nizam al-Mulk por um membro da seita dos assassinos.

As universidades islâmicas da época não eram apenas grandes centros de ensino. Elas eram também centros de propaganda para os pontos de vista dos seus patronos.

A rivalidade política entre os califas fatímidas e abássidas se refletia nos respectivos ensinamentos das universidades em Bagdá e Cairo, tanto quanto as perspectivas capitalistas e socialistas foram refletidas nas ciências sociais ensinadas nos Estados Unidos e na União Soviética até tempos recentes.

A Universidade de Al Azhar foi fundada em 969 pelos fatímidas não só como uma grande universidade, mas também como um centro de propaganda fatímida. As universidades em Bagdá serviam como um contraponto as do Cairo.

A Universidade Nizamiya em Bagdá não só foi um grande centro para a ciência, gramática e jurisprudência islâmica, foi também um centro de contrapropaganda para o islamismo sunita. Por exemplo, nos escritos de al-Ghazali , encontramos uma dialética simultânea contra a posição fatímida e contra o desafio secular da filosofia helênica.

As ruínas da fortaleza dos Assassinos em Alamut, Irã. Foi aqui que em 1256 o reinado de terror da seita dos ”hashashins” teve um fim sob os mongóis liderados por Hulago Khan.

O assassinato de Nizam ul Mulk em 1091 foi um grande golpe para o mundo islâmico. Não só por privar os seljúcidas dos serviços de um administrador de primeira qualidade, como também por acelerar as forças centrífugas no vasto Império Seljúcida.

Outros que caíram para os fidayin incluem os celebres emires Maudud (1127) e Zengi (1146) de Mosul e o atabek Imaduddin. Cem anos depois, o próprio Saladino escapou por pouco do punhal de um assassino em duas ocasiões distintas. Mohammed Ghuri, conquistador de Delhi, não teve tanta sorte e morreu nas mãos de um assassino perto de Cabul em 1206.

O seljúcidas atacaram os assassinos e repetidamente, mas a cada investida eles escapavam. Não foi até 1251 que os mongóis, sob Hulagu Khan, finalmente conquistaram os territórios dos assassinos e os expulsaram de seus esconderijos.

Isto não foi um consolo para o mundo muçulmano, porque os mongóis estavam em seu caminho para Bagdá para dizimar o coração da civilização islâmica. Não obstante os mongóis, os fidayin continuaram a sobreviver em locais do norte da Síria e do Iraque até os tempos modernos.

Após a Primeira Guerra Mundial, com a derrota do Império Otomano, essas áreas ficaram sob ocupação britânica e receberam proteção. E, depois da morte de Nizam ul Mulk, o poder seljúcida se dissipou.

O império dividiu-se em pequenos principados. Querelas eclodiram entre os príncipes e emires, resultando em uma guerra aberta. Foi nesse fossilizado corpo político muçulmano que os cruzados injetaram seu poder em 1096.

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