“A seita, vital em si mesma, era introvertida em sentimentos e em política. 
Um nusairita jamais trairia outro, e dificilmente não trairia um infiel.”
(T.E. Lawrence, o famoso “Lawrence da Arábia” em seu livro Seven 
Pillars of Wisdom, cap. 58)
Os Nusayrī-ʿAlawīs, os alauítas, também conhecidos como nusairitas ou 
ansaris, são um secto muçulmano xiita que rompeu com o xiismo 
convencional no final do século IX. Ainda que suas doutrinas sejam 
altamente sincréticas, heterodoxas e consideradas pós-islâmicas por alguns, 
sua histórica é indissociável dos estudos islâmicos. Originados do 
movimento Ghulāt, cujas características veremos em seguida, os alauítas, 
comumente chamados por seus adversários de nusairitas em virtude do 
nome do fundador do secto, Muhammad ibn Nusayr, um jovem estudante e 
místico xiita de Kufa, no atual Iraque. Ao longo dos séculos, foram 
duramente perseguidos por suas crenças, uma amálgama de diversas 
doutrinas das religiões do Oriente Próximo e ficaram no fogo cruzado entre 
potências, revoltas e guerras santas, sempre à margem da sociedade e 
civilização islâmicas. A sua principal área de habitação é na cadeia de 
montanhas do litoral sírio, conhecido não à toa como Jabal al-Nusairiyya 
(Montanhas dos Nusairis), estando presentes também em grande número 
nas províncias de Homs e Hama; habitam também no distrito libanês de 
Akkar, ao sul de Latakia (norte do Líbano) e no bairro de Jabal Mohsen, 
em Trípoli; nas províncias turcas de Hatay (antigamente conhecidas como 
Alexandretta ou Iskandarun), Seyhan (Adana) e Tarsus. Havia até pouco 
tempo atrás algumas famílias alauítas na Cisjordânia, que acabaram se 
retirando para a vila de Ghajar, nas colinas do Golã, onde até hoje há uma 
comunidade alauíta com cidadania israelense. Eles também vivem em 
grandes centros urbanos sírios, como Damasco, Aleppo, Hama etc.
Para começar, quem eram os ghulats? Os ghulats, isto é, os exageradores 
eram uma denominação dada pelos xiitas e sunitas ortodoxos àqueles xiitas 
que exageravam na sua devoção à alguma figura central do Islam: o Profeta 
Muhammad, o Imam Ali, a Ahl ul bayt (família do Profeta, especificamente 
Ali, Fátima, Hassan e Hussein) e o Imamato (os Doze Imãs do Xiismo 
Jafari, também conhecido como duodecimano), a ponto de considera-los 
Divinos ou mesmo Deus encarnado (ou apenas manifestado), tal qual Jesus 
para os cristãos. Um desses sectos, os mukhamissa de Abu al-Khattab, 
consideravam que Deus havia encarnado em Muhammad e posteriormente, 
nos Imãs. As ideias de Abu al-Khattab tiveram um grande impacto e 
influência nas ideias mais tarde elaboradas por ibn Nusayr. Havia muitos 
outros sectos, ainda, que divinizavam os Imãs e os Ahl ul Bayt; os 
nusairitas viriam a ser apenas mais um, com a diferença de que eles são um 
dos únicos sectos ghulat a sobreviver até os dias de hoje, crendo que Ali 
ibn Abu Talib era uma manifestação de Deus, assim como também foi o 
Profeta Muhammad, o sahaba Salman al-Farsi e Muhammad ibn Nusayr, 
embora Ali seja o maior de todos: ele é a manifestação mais “pura” de 
Deus.
Abū Shu’ayb Muhammad ibn Nusayr al-‘Abdī al-Bakrī al-Numayri foi um 
estudante e místico xiita - “um tariqueiro”, como diz Olavo de Caravalho -
que teve, alegadamente, contato com o décimo e o décimo-primeiro 
Imãs,‘Alī al-Hādī e Ḥassan al-‘Askarī, respectivamente (o décimo-segundo 
imã, o Imã Mohammed al-Mahdi foi, segundo a tradição xiita 
duodecimana, oculto por Deus para retornar no fim dos tempos). Pouco se 
sabe sobre sua vida antes de sua polêmica atuação no campo religoso do 
efervescente Iraque do final do primeiro milênios após Cristo, exceto que 
ele era membro da tribo árabe dos Banu Numayr, ou Banu Numayriyya (daí 
seu sobrenome al-Numayri) e que teria estudado na Índia em sua 
juventude. É dito que ibn Nusayr detinha um círculo de alunos que logo 
evoluiu para uma tariqa, um círculo esotérico, com ibn Nusayr ensinando 
suas doutrinas controversas (para não dizer heréticas) que causaram, por 
duas vezes, sua excomunhão pública: transmigração das almas 
(reencarnação), divinização do Imã (à época, al-Hādī) e reclamando o dom 
da profecia para si mesmo; na segunda vez, após a morte do imã Ḥassan al-
‘Askarī, ibn Nusayr “revelou” ser o bāb do falecido imã, isto é, seu enviado 
íntimo, a quem teria sido ensinado conhecimentos secretos pelo divino imã. 
Além disso, também reclamava para si o título de representante do imã 
sumido, o Imã Mahdi, representando-o em sua ausência. Publicamente 
excomungado e amaldiçoado, ibn Nusayr tentaria, em vão, se desculpar 
com a ulemá. No entanto, a essa altura, sua seita já estava bem estabelecida 
entre os Banu Numayr, contando com muitos aderentes e capítulos (grupos) 
em outras cidades, como Samarra, especialmente através de financiamento 
pela rica tribo dos Banu al-Furat, uma rica dinastia a quem pertenciam 
poderosos comerciantes e homens públicos da região. Os Banu al-Furat 
durante muito tempo financiariam a tariqa nusairita, num elo entre religião 
e poder, mas seriam mais tarde descobertos pelos Abássidas – inimigos 
mortais dos nusairitas – e liquidados por eles. Os Numairiyya, no entanto, 
conseguiram sobreviver num ambiente hostil pois a maioria de seus 
membros eram intelectuais de classe média e se utilizavam de taqiyyah, 
isto é, escondiam suas verdadeiras crenças e se apresentavam como 
muçulmanos ortodoxos; secretamente, em suas reuniões, não chamavam a 
si mesmos de “muslimin”, mas sim de muwwahidun: “monoteístas”, por 
crerem ser os únicos detentores do real monoteísmo, ocasionado pela fusão 
do exotérico (zahir) e esotérico (batin). O fim de ibn Nusayr foi ser
executado por blasfêmia, atribuindo divindade ao imã, uma “profissão de 
fé” chamada de nidāʾ. Para a seita, ibn Nusayr não foi morto de fato, mas 
apenas em aparência, isto é, de maneira ilusória. Tempos mais tarde, alKhasībī, o segundo maior nome do nusairismo, diria que o Imã Hussein ibn 
Ali, filho de Ali ibn Abu Talib e segundo imã, morto em combate, não teria 
sido de fato morto, mas apenas aparentemente morto, uma vez que ele, 
assim como ibn Nusayr (embora Hussein como imã seja maior que Nusayr) 
eram forças divinas cujo corpo era uma manifestação, não sendo carnal de 
fato. Esta doutrina ecoa as doutrinas chamadas “docéticas” de alguns 
cristãos gnósticos que achavam que Jesus Cristo não poderia ter morrido na 
Cruz; antes, sua crucificação e morte foram uma ilusão de ótica. Tal como 
a crucificação de Jesus, assim teria sido o martírio de Hussein ibn ali e a 
execução de Muhammad ibn Nusayr.
Muhammad ibn Nusayr foi sucedido por Muhammad ibn Jundab, seu mais 
proeminente aluno. Nesse tempo, ainda sob os Abássidas sunitas, o 
ambiente era hostil: rebeliões e execuções, prisões de líderes xiitas e 
ataques por extremistas cármatas aos sul tornavam o uso da taqiyyah 
obrigatório para a sobrevivência do secto. De fato, a taqiyyah foi tão 
efetiva que as autoridades não sabiam quem era o sucessor de Nusayr. 
Muhammad ibn Jundab foi sucedido por ‘Abdallāh al-Jannān al-Junbulānī, 
natural da vila de Junbula, entre Kufa (principal centro dos nusairitas) e 
Wāsit. Seria um conterrâneo de al-Jannān, um outro al-Junbulānī, que viria 
a ser o maior nome de toda a história e teologia nusairita, seu mais notável 
líder, tão grande quanto o próprio Muhammad ibn Nusayr.
É impossível falar ou entender a história e as doutrinas nusairitas sem falar 
de Abū ‘Abdallāh al-Ḥussein ibn Hamdān al-Khasībī al-Junbulānī, um 
homem que veio de uma proeminente e religiosa família de devotos xiitas: 
seu pai, Hamdān, era um transmissor de tradições xiitas, especialmente as 
biográficas relacionadas ao Profeta Muhammad. Seu tio, Ibrahim, era 
assistente do Imam al-‘Askarī e seus tios eram igualmente bem quistos. 
Desse modo, al-Khasībī foi desde muito cedo exposto à religião e à mística, 
fazendo o Hajj e vários outras peregrinações em sua juventude, além de 
estudar poesia, hádices e exegética corânica. Por influência de seu tio 
Ahmad, al-Khasībī foi apresentado a al-Jannān; não demorou muito para 
que al-Jannān “adotasse” o jovem prodígio como seu filho espiritual. Esta 
adoção, no entanto, não era apenas uma relação de professor-aluno, mas 
sim uma verdadeira iniciação esotérica de al-Khasībī na tariqa nusairi. 
Após a morte de al-Jannān, a tradição nusairita pontua que al-Khasībī, para 
completar seus estudos, foi ao encontro de um senhor supostamente 
discípulo de ibn Nusayr. Lá, no dia do feriado xiita de ʿāshūrāʾ, além de 
completar seus estudos e iniciação, teria sido visitado pelos últimos dois 
Imãs (al-Hādī e al-‘Askarī) que teriam lhe revelado diversos conhecimentos 
ocultos, dentre os quais aquele que colocava ibn Nusayr como “Portão 
(bāb) para Deus e líder dos fiéis”; munido das bênçãos e conhecimentos 
ocultos dos Imãs, al-Khasībī estava pronto para liderar a comunidade 
nusairita para uma nova era de florescimento. Al-Khasībī logo decidiu 
fazer o nidā’, tal qual ibn Nusayr o fizera, e pregar as doutrinas do secto 
publicamente: foi preso. Após um misterioso escape da prisão, a quem os 
nusairitas atribuem a uma milagrosa intervenção do espírito de Jesus (Isā), 
fato esse muito significante na sua vida, al-Khasībī decidiu mudar-se com 
seu séquito do turbulento e caótico Iraque do século X para a região da 
Síria, onde ele conseguiu se estabelecer com seus companheiros na cidade 
de Harran, na atual Turquia, um local bem conhecido por ser lar dos 
últimos pagãos da região: os sabeus, seguidores de uma religião sincrética 
que misturava o hermetismo, o neoplatonismo e o culto às estrelas e à uma 
antiga divindade lunar mesopotâmica. Não se sabe se os sabeus de Harran 
influenciaram os nusairitas de algum modo; alguns autores como René 
Dussaud em sua obra Histoire et religion des Nosairîs, dizem que sim, mas 
tal afirmação é extremamente difícil de se comprovar. O que se sabe é que, 
apesar de haver uma presença xiita em Harran, a Síria se provou 
inicialmente um ambiente um tanto quanto hostil ao grupo, no entanto, ela 
logo se tornou um importante centro nusairita, lar dos Banu Shu’ba, uma 
tribo nusairi que durou o mesmo tempo que a “era de ouro” dos nusairis, 
até o final do século XI. Após a dinastia xiita dos Buídas tomar o poder no 
Iraque, al-Khasībī retornou ao Iraque, onde posou como um xiita ortodoxo 
e escreveu uma considerável quantidade de obras. Inicialmente, al-Khasībī 
acumulou imenso pretígio na Academia xiita da época, sendo bendito por 
vários escolares e influentes sheykhs da época; obteve uma ijaza (uma 
licença oficial para lecionar determinado autor) para lecionar sobre um 
importante acadêmico xiita. Mais tarde, porém, ele aparece sendo 
condenado algumas vezes por alguns estudiosos xiitas, que o acusam de 
acreditar em reencarnação das almas e na encarnação da Divindade em Ali 
ibn Abu Talib; a maioria de tais acusações foram provavelmente 
censuradas para limpara a reputação de al-Khasībī. Nos seus últimos anos 
de vida, al-Khasībī retornou para a Síria, onde foi acolhido pelo governante 
da dinastia Hamdanita em sua corte, em Aleppo, deixando um certo al-Jīsri 
para comandar os “monoteístas” no Iraque. Após sua morte, foi sucedido 
por Muhammad ibn ‘Alī al-Jillī. Ao contrário de seus antecessores que 
pouco escreveram, al-Khasībī era um ávido escritor, legando diversas obras 
a seus irmãos e filhos espirituais, assim como novas doutrinas. Muitas 
doutrinas e detalhes doutrinários novos foram adicionadas ao catálogo do 
secto, dentre as mais notáveis: a transmigração cíclica das almas, as Tríades 
Divinas e suas manifestações (aparentes, pois o Divino não pode ser 
encarnado, uma doutrina idêntica ao conceito dos avataras do Hinduísmo) 
através da história (antes era um Díade e o bāb não era considerado 
totalmente divino), além de conceitos da emanação da Divindade 
(semelhantes ao Neoplatonismo) e interpretações místicas, esotéricas e 
alegóricas do Alcorão, além de muitas outras.
Após a morte de al-Khasībī em 957 d.e.c., al-Jillī herdou a liderança da 
comunidade. No entanto, seu período de liderança foi dramático: a Síria já 
passava por maus bocados quando, em 962, os bizantinos sob o imperador 
Nicéforo Focas incendiaram Aleppo e mataram o patrocinador do secto. 
Para garantir a sua sobrevivência, os nusairitas precisavam espalhar sua 
mensagem, aumentar seus números. Mas como fazer isso sendo que o 
grosso da população do Levante, à época, era de sunitas hostis ao xiismo? 
A solução encontrada foi pregar entre os não-muçulmanos. Os cristãos, 
especialmente os da Galileia, do Golã e da costa síria de Latakia, região do 
Jabal, foram alvo do dawa (proselitismo) do secto. Muitas obras nesse 
período utilizam termos teológicos cristãos, mas isso não representa uma 
“cristianização” do nusairismo, ou que os nusairis viriam a ser “cristãos 
islamizados” como a grande maioria dos estudiosos e acadêmicos 
ocidentais do século XIX e do começo do XX dizia, mas sim uma 
“nusairização” ou “islamização” dos termos e alguns conceitos e até 
doutrinas cristãs. Vários feriados cristãos passaram a ser feriados nusairitas 
também, sendo ressignificados, com o intuito de atrair cristãos para as 
fileiras nusairis, especialmente aqueles cristãos nestorianos e siríacos que 
se encontravam ao relento, considerados heréticos pelos bizantinos 
ortodoxistas e infiéis pelos árabes sunitas. Logo, o secto estabeleceu uma 
forte presença nas áreas rurais de Aleppo, Harran, Tiberias e Beirute.
Al-Jillī foi sucedido po Maymūn ibn al-Qāsim al-Tabarānī, um estudioso 
com extenso conhecimento do Islam xiita, teologia cristã, filosofia grega e 
religiões persas (masdeístas), além de ser o primeiro a usar cifras e “letras 
mágicas” em seus escritos. Al-Tabarānī é conhecido por ser o líder 
espiritual nusairita que mais produziu obras escritas, superando até mesmo 
al-Khasībī; nessa época hpuve a grande divisão entre as massas iniciadas e 
as não-iniciadas.
Após al-Tabarānī, o secto ficou enfraquecido, tornando-se descentralizado
entre os diversos sheykhs e comunidades diferentes. Em troca de proteção, 
os nusairis se submeteram a clãs encastelados na região costeira do 
Levante, de Aleppo e Golã até Beirute.
Durante as Cruzadas, muitos nusairitas foram mortos quando os cruzados 
europeus tomaram o Monte Líbano. Eles logo, no entanto, compreenderam 
que o estranho povo não era de fato “sarraceno”, muçulmano, e passaram a 
forjar alianças com os sheykhs nusairis. Através dessa parceria, os 
nusairitas reganharam muitos castelos na região que ainda estavam sob 
poder dos ismailitas e de sunitas.
Os Aiúbidas (1171–1260) trouxeram curdos ocupar e patrulhar a região, 
bem como manter os nusairitas sobre controle. Durante o período cruzado, 
ainda, os Ismailitas nizaris, seguidores do “Velho da Montanha” Hassan 
ibn Sabbah, conhecidos como hashshashins também ocuparam algumas 
fortalezas do Jabal, oprimindo a população local. A tradição nusairita então 
narra a vinda de um “salvador” diretamente da província iraquiana do 
Sinjar, notável por sua população de outro secto, os yezidis, Abū 
Muḥammad al-Hasan ibn Yūsuf al-Makzūn al-Sinjārī, ou al-Makzūn para 
os íntimos, liderando um grande exército que expulsou os curdos e os 
nizaris, além de massacrar os rivais intelectuais dos nusairis, os ishaqiyyas 
(seguidores do Ishaq al-Ahmar, um rival de Muhammad ibn Nusayr) e os 
duhabiyyas. Esses guerreiros e suas famílias são tidos como os ancestrais 
da maioria dos atuais nusairitas/alauítas da Síria, inclusive a da atual 
família presidencial síria, os al-Assad, cuja nata é a tribo dos Kalbiyya, 
vinda do Sinjar. Al-Makzūn levou um revivalismo do secto na região, tanto 
na área demográfica quanto na área teológica: poetas podiam escrever 
sobre as crenças e temas secretos, desde que codificassem-nos; uma 
linguagem “militar” passou a permear os escritos teológicos nusairis da 
época, sendo introduzido o conceito de jihad esotérica e exotérica e houve 
também alguns elementos sufis trazidos por al-Makzūn, chamando o 
nusairismo de ‘ilm al tassawuf, “ciência do sufismo”, ao mesmo tempo que 
al-Makzūn ataca Mansūr al-Hallaj (místico persa sunita, 858 – 922) e o 
conceito sufi de união com Deus como heresia, favorecendo a visão de um 
Deus puramente transcendental e oculto (na tradição nusairita, Deus é 
muitas vezes chamado pelo epíteto Al-Ghāyba, “A Ausência” ou “O 
Oculto”), ou seja, inalcançável. 
Após expulsar as hordas mongóis em Ain Jalut (1260) junto coms grande 
parte dos hashashins, o sultão do Egito, Baybars, estabeleceu o poder da 
dinastia dos Mamelucos (1250–1517). Devotamente sunitas e hostis a 
qualquer forma de xiismo, sobrou para os já marginalizados nusairitas e 
druzos: o sultão ordenou que mesquitas (os nusairitas não rezam em 
mesquitas e raramente têm casas de oração, a maioria das cerimônias são 
feitas em residências ou tumbas de sheykhs) em cada vilarejo nusairi, o 
aumento de impostos para os nusairitas e a proibição da fabricação, 
importação e consumo de vinho (os nusairitas, diferente dos muçulmanos, 
tomam vinho sem preocupação alguma e ele é inclusive utilizado em 
cerimônias religiosas chamadas qadassah, que possuam uma semelhança 
muito grande com as missas do cristianismo). O mais severo decreto foi, no 
entanto, a proibição da iniciação na religião, algo que significaria, a longo 
prazo, no desparecimento dela. Tais tentativas falharam miseravelmente, 
levando o historiador árabe ibn Battuta a dizer, ironicamente, que os 
nusairitas “fizeram das mesquitas currais para seu gado” (ibn Battuta, 
Tuhfat al-nuzzar, pg. 291). Tais supressões contra a religião nusairita, 
aliadas à miséria, marginalização e dificuldades econômicas levaram a um 
revolta com foco na província de Jabala em 1317, que ficaria conhecida 
como “A Revolta do Mahdi” (o Mahdi, o “messias islâmico” é um conceito 
central da teologia xiita duodecimana, da qual o nusairismo descende 
diretamente). 
Os nusairitas de Jabala, descendentes daqueles guerreiros que al-Makzūn 
trouxera do Sinjar, se rebelaram pregando jihad guerra santa contra seus 
opressores sunitas, como nos conta o historiador muçulmano 
contemporâneo ibn Kathir, aos gritos de “Não há Deus além de Ali [ibn 
Abu Talib], não há véu além de Muhammad [ibn Abdallah, o Profeta] e 
não há Portão além de Salman (al-Farsi)”, proclamando os muçulmanos 
como infiéis (kaffirun) e proclamando que apenas os nusairitas detinham a 
Verdade; por vezes, o tal mahdi dizia ser “Ali ibn Abu Talib, o Criador dos 
Céus e da Terra (i.e., Deus) ou Muhammad ibn Abdallah, o ‘Senhor da 
Terra’.” O mesmo ibn Kathir, além de um outro historiador chamado alMaqrisi, nos narra que após tomar a cidade de Jabala, matar ou escravizar 
seus habitantes e saquear o assentamento, o mahdi encontrou seu fim nas 
mãos do governador da província em uma batalha e a rebelião foi sufocada. 
Tais descrições nos dão uma descrição bem resumida e superficial das 
doutrinas nusairitas: a Divindade de Ali ibn Abu Talib. Vale comentar que 
a revolta foi apenas na região do Jabal, poisos nusairitas das outras 
localidades não se juntaram à ela.
Seguindo este evento marcante, uma fatwa, um tipo de decreto religioso
islâmico, como uma encíclica, foi publicada pelo estudioso e teólogo 
muçulmano sunita ibn Taymīyyah (1263 – 1328). Um controverso e 
conservador membro da escola Hanbali, que alguns estudiosos dizem ser o 
precursor das modernas heresias do wahabismo e do salafismo, ibn 
Taymīyyah escreveu e lançou sua fatwa contra os nusairitas acusando-os de 
idolatria (shirk) e exortando os fiéis muçulmanos a os liquidarem. Esta foi a 
primeira fatwa com os nusairis, mas não seria a última. Temendo por suas 
vidas, os nusairitas enviaram emissário à Trípoli para pedirem para serem 
incluídos aos “Povos do Livro” (ahl ul kitab, cristãos, judeus e sabeus) e 
pagarem a jízia, em troca de proteção. Para a sorte dos seguidores de ibn 
Nusayr, ibn Taymīyyah era visto como um fanático exagerado pela maioria 
das pessoas de seu tempo (até hoje, pelas pessoas sensatas), e isso incluía 
os mamelucos; somando-se a isso, estava o fato de que os nusairitas eram 
uma comunidade produtiva, que pagava os impostos e dia e cultivava a 
terra: não sofreram represálias nem ataques, mas sua condição tampouco 
ficaria melhor.
Apesar de serem odiados pelos seus vizinhos muçulmanos e olhados com 
no mínimo desconfiança pelos cristãos, os nusairitas eram conhecidos por 
serem um povo trabalhador e pobre, essencialmente camponês. Assolados 
por um ambiente hostil, disputas entre os clãs nusairitas e os clãs sunitas e 
cristãos (e até mesmo entre os próprios nusairitas, por vezes), a quem 
bandidos e quadrilhas nusairis atacavam sem dó, profundamente 
empobrecidos, o povo de ibn Nusayr se via numa posição desesperadora na 
busca da sobrevivência; os senhores de terra sunitas, necessitando de mãode-obra barata, viam nos nusairitas uma grande fonte disto, empregando-os 
nas lavouras e deixando-os relativamente em paz. 
Durante a época do Império Otomano, T.E, Lawrence, o conhecido 
“Lawrence da Arábia”, narra que o secto não se envolvia em políticas nem 
assuntos públicos, “deixando as autoridades otomanas em paz esperando 
uma resposta recíproca”. Nem sempre funcionava e, devido ao preconceito 
dos seus vizinhos e a miséria dos nusairitas – que muitas vezes acabavam 
indo para a bandidagem, tornando-se gângsteres, ladrões de gado e 
salteadores -, os nusairitas acabavam sofrendo nas mãos das autoridades 
otomanas, não tendo o status nem de dhimmis (minoria protegida). Eram 
párias da sociedade. Essa perseguição e desprezo mútuo são evidenciadas 
pelo fato dos nusairitas creem que os muçulmanos sunitas são heréticos (os 
xiitas são ignorantes) e rezam por sua destruição. Há uma curiosa crença 
entre os nusairis que narra que sheykhs sunitas reencarnam como mulas, 
enquanto padres cristãos reencarnam como macacos. 
Um verdadeiro faroeste havia vingado nas terras do Jabal al-Nusairyya: a 
região era conhecida por ser o lar de conflitos sectários entre nusairitas e 
seus vizinhos ismailitas e pela atuação de bandidos. O território de um dos 
principais quatro clãs nusairitas, aquele dos Kalbiyya ou Banu Kalb, era 
considerado o mais fora-da-lei. Comuns também eram as expedições 
punitivas otomanas contra os “bandidos” nusairitas: em 1760, um físico 
inglês foi morto no Jabal e a comunidade se recusou a colaborar nas 
investigações; o governador otomano então reuniu um exército e marchou 
sobre o Jabal, matando centenas de nusairitas, dentre os quais 70 líderes 
tribais e sheykhs dos nusairis, decapitando-os e espetando suas cabeças em 
lanças. Durante o século XIX um missionário inglês, Reverendo Samuel 
Lyde, viveu entre os nusairitas entre 1853 e 1859, destacando a melancolia 
intrínseca que permeava todos os aspectos da vida desse povo, além do 
constante conflito que a perpassava; nas palavras de Lyde, a sociedade 
nusairita era um “inferno sobre a terra”. Midhat Pasha, apontado 
governador da Síria em 1879 apresentou medidas para “disciplinar” o 
arruaceiro povo das montanhas, que incluíam a abertura de escolas, 
autonomia para a comunidade e parar com a opressão dos órgãos 
governamentais. Os sunitas de Damasco ficaram ultrajados e pediram para 
o sultão Abdülhamid II removê-lo; Abdülhamid, que detestava o estilo 
reformista liberal e democrático de Midhat, o retirou do governo em 1880.
Após a derrocada do Império Otomano, a França ocupou os territórios do 
Líbano e Síria (incluindo Iskenderun) e, utilizando-se da estratégia do 
“dividir e conquistar”, fragmentou seus domínios em áreas étnicoreligiosas: o “Grande Líbano”, com maioria da população composta por 
cristãos maronitas e ortodoxos; o “Jabal el-Druze”, uma região autônoma 
para os druzos; o Estado de Damasco e o Estado de Aleppo, com maioria 
sunita e por fim, o “Estado Alauíta” (primeiro uso frequente do nome 
“alauíta”) no que seria o Governorado de Latakia, no Jabal al-Nusairiyya. 
Como os sírios sunitas se recusavam a colaborar com os franceses e alistar 
seus filhos no exército, os franceses, vendo nos druzos e alauítas as únicas 
“raças guerreiras” da região, escoraram-se neles para preencher os postos 
de seu exército colonial. Não demorou muito para os alauítas tornarem-se 
proeminentes e dominantes no exército colonial sírio, posição que lhes 
seria muito favorável após a independência. Apesar dessa colaboração, nem 
todos os nusairitas eram amistosos com os franceses e, em 1918, uma 
revolta nusairi eclodiu, com os insurretos tendo à sua frente o sheykh Salih 
Ahmad al-Ali. Após unir vários sheykhs à sua causa e sendo apoiado pelo 
presidente turco Mustafá Kemal Atatürk, emboscou e derrotou uma grande 
força francesa enviada para dar-lhe fim; após isso, ele reorganizou o 
exército numa força regular. Al-Ali atacou também os ismailitas (que 
haviam se aliado aos franceses e ajudado-os em suas expedições contra alAli) em sua principal cidade, Qadmus, ocupando-a. Derrotando os 
franceses mais três vezes seguidas (nem canhões e ataques contra civis 
alauítas puderam ajuda-los), em 1920 al-Ali fez os franceses proporem paz, 
e juntos fizeram uma trégua; os franceses no entanto, violaram o tratado de 
paz, o que fez as hostilidades reacenderem. Em 1921, al-Ali foi forçado a 
se esconder, sendo julgado e condenado à morte in absentia por um tribunal
militar. Os franceses, cansados de procurá-lo, o perdoaram e distribuíram 
panfletos por avião pelo Jabal. Al-Ali se entregou e, perguntado pelo seu 
””captor””’, o General Billote , pelo motivo da rendição, al-Ali respondeu: 
“Por Deus!Se eu apenas tivesse uns 10 homens para lutar, eu não me 
renderia”.
Durante a década de 30, às vésperas da independência síria, com os 
franceses cedendo às pressões nacionalistas, os alauítas, cuja imensa 
maioria permanecia leal e amigável à França, não queriam, num eventual 
fim do regime colonial francês, serem unidos a seus tradicionais inimigos e 
algozes. Em 1936 um memorando foi enviado ao premiê francês Leon 
Blum, assinado por 6 notáveis alauítas, dentre eles Suleyman al-Assad, pai 
do futuro presidente sírio Hafez al-Assad e avô do atual, Bashar. O 
memorando – um apelo desesperado à França – revelava o ódio dos 
alauítas pelos seus vizinhos nacionalistas sunitas e seu temor pela 
unificação com eles novamente; suas esperanças eram a independência de 
um estado alauíta separado que juntar-se-ia com o Líbano (lar da segunda 
maior população de alauítas à época). Tudo em vão: com o fim da Segunda 
Guerra Mundial, veio o fim do mandato francês na Síria, que se tornou um 
país independente. Ao mesmo tempo, a nova geração de alauítas, educadas 
em escolas elementares e europeias, tornavam-se mais dóceis a seus 
compatriotas sunitas do interior do país, ao mesmo tempo que deixavam o 
estilo de vida tribal de seus antepassados. Um desses jovens era Hafez alAssad, filho do importante líder alauíta Suleyman al-Assad, da tribo dos alKalbiyya. Mas ainda não chegou a hora de falar dele. A ascensão dos 
alauítas ao poder na Síria foi lenta, ocorrendo através de dois canais: o 
exército e o Partido Baath, ou Partido Socialista Árabe que, apesar do 
nome, repudiava o marxismo e pregava o nacionalismo árabe e o panarabismo (a união de todos os árabes). Como já foi citado, a condição 
deplorável de vida dos alauítas tornavam o alistamento militar de seus 
filhos um alívio para eles e para as famílias; uma vez no exército, os 
recrutas poderiam ir para a Academia Militar e aprimorar seus estudos, 
feitos na escola secundária. Isso acabou tornado os alauítas uma espécie de 
“casta militar” (junto aos druzos, mas estes em menor número), enquanto 
os sunitas conseguiam pagar o badal, uma isenção do serviço militar, 
rechaçando-o como imperialismo estrangeiro. 
O Partido Baath conseguiu atrair para suas fileiras muitos alauítas, 
especialmente por sua retórica em prol do secularismo, oferecendo 
oportunidades para todos. Em 1958, a Síria se uniu com o Egito, formando 
a República Árabe Unida. Ironicamente, a facção síria do Baath foi 
extinguida por Gamal Abdel Nasser, mostrando quem seria o novo mandachuva do pedaço. Os alauítas do Baath enxergaram com maus olhados essa
união: seu medo era se unirem a um maioria sunita; agora, estavam unidos 
a uma esmagadora maioria sunita. Não demorou muito para os oficiais 
alauítas do exército, dentre eles Hafez al-Assad, se unirem para tentar 
resolver a questão, suspeitando que os líderes do Baath Sírio – agora unido 
ao egípcio – haviam entregado a Síria de bandeja à Nasser. Em 1961 a 
União colapsou e a Síria foi atingida por uma série de golpes de estado e 
complôs políticos que culminaram no golpe de 1963, levando Assad a um 
importante cargo no governo como primeiro-ministro. Enquanto isso, 
alauítas, druzos e ismailitas, outrora inimigos, agora aliavam-se entre si e 
monopolizavam o Partido Baath, junto de alguns poucos sunitas: a esta 
altura, os alauítas ganhavam cada vez mais e mais terreno dentro do 
partido, especialmente nas pessoas de Zaki al-Arsuzi, Muhammad Umran e 
Hafez al-Assad. Em 1966, um outro golpe, orquestrado por oficiais 
alauítas, druzos e ismailis, tomou Damasco e forçou Salah ad-Din al-Bitar e 
Michel Aflaq – um sunita e um cristão -, fundadores do Baath sírio, a 
fugirem do país; 1966 marcou a vitória dos “regionalistas” sírios e causou 
um cisma entre o Baath sírio e o iraquiano, bem como com o egípcio. Após 
o golpe, começou uma purga para “alauizar” ainda mais as forças armadas.
Em 13 de novembro de 1970, Hafez al-Assad deu um golpe de estado e 
derrubou o governo do presidente Nur al-Din al-Atasi e de seu premiê 
Salah Jadid. Em fevereiro, ele se tornou o primeiro presidente alauíta do 
país, completando o gradual processo de subida ao poder pela comunidade 
antes marginalizada. Os alauítas, que antes apenas queriam autonomia para 
si mesmos em sua área, tornaram-se os mestres da Síria e suas instituições. 
O autor Robert Kaplan compara a subida de Assad ao poder como “um 
intocável tornando-se marajá na Índia ou um judeu tornando-se Tzar na 
Rússia”. A comunidade que antes sofria rejeição, discriminação e abusos 
evoluiu de uma retrógrada sociedade tribal para uma população 
emancipada em posição de dominância. 
Durante o governo de Hafez al-Assad, para tornar a comunidade alauíta 
mais “palatável” ao mundo islâmico e integrá-la melhor, Assad iniciou um 
processo de “sunificação” dos alauítas, argumentando que o alauísmo nada 
mais eram que xiitas duodecimanos (como os xiitas do Irã e Iraque), 
construindo mesquitas em estilo sunita nas cidades e vilas alauítas, para dar 
ao menos uma aparência de religiosidade comum. Os alauítas também 
foram encorajados a fazer o Hajj, peregrinação à Meca, algo que é 
considerado supersticioso e herético (até mesmo pecaminoso) na tradição 
alauíta. Hafez tentou fazer dos alauítas “bons muçulmanos”, em troca em 
troca de estabelecer uma sociedade modicamente secular e plural. Um dos 
atos de seu “Movimento Corretivo” de modernização e reorganização da 
Síria foi rechaçar o secularismo extremo de seu antecessor e dar mais 
proeminência, porém limitada, aos clérigos sunitas e cristãos. Apesar de 
tudo isso, décadas de ditadura de Hafez e seu filho, Bashar, tiveram o 
sentido contrário: muitos sunitas e até outras minorias veem os Assad como 
carrascos e os alauítas como espoliadores do país, contribuindo ainda mais 
para o sectarismo na sociedade síria, apesar de uma aparência de coesão 
social. O sectarismo escancarou-se com a eclosão da Guerra Civil Síria, 
com os alauítas formando milícias pró-governo, as shabihas, resposáveis 
por torturas e execução de opositores, que são em sua esmagadora, sunitas. 
Grupos extremistas como a Frente al-Nusra, Ahrar al-Sham e Daesh 
antagonizam e pregar a morte da minoria alauíta, que compõem, no 
máximo, 12% da população síria na primeira década do século XXI.
Islamizar ou não islamizar, eis a questão diria Shakespeare, se ele fosse 
alauíta (teria o nome de Sheykh Pir), uma vez que esse é o dilema que 
intriga não apenas o atual presidente sírio, Bashar al-Assad, filho de Hafez, 
como também à alta cúpula alauíta do Baath Sírio. Os alauítas não querem 
– e não irão – islamizar-se mais, enquanto Bashar, estigmatizado por ser 
alauíta, tem na islamização a possível solução de seus problemas.Com cada 
vez mais jovens alauítas sendo mortos na guerra, uma geração perdida, e a 
crise de identidade e de sectarismo em ebulição, o futuro e a sua 
sobrevivência dos alauítas volta a ser o que sempre foi: difícil.
Referências bibliográficas:
- Yaron Friedman, The Nuṣayrī-ʿAlawīs - An Introduction to the Religion, 
History and Identity of the Leading Minority in Syria (2010).
- Matti Moosa, Extremist Shi'ites - The Ghulat Sects (1987).
- T. E. Lawrence. Seven Pillars of Wisdom, Book 5, Chapter 58.
-http://joshualandis.oucreate.com//syriablog/2004/10/asads-alawidilemma.htm
-https://www.theatlantic.com/magazine/archive/1993/02/syria-identity