Hoje na República da França, politicos e setores da sociedade civil defendem o direito de que seus cidadãos possam deboxar de todas as formas da figura revernciada por 10% de sua população muçulmana, o Profeta Muhammad (Maomé). Após o trágico incidente no qual um professor foi morto após exibir em sala de aula uma foto na qual a figura do profeta foi retratada como um homem na posição islâmica de oração com o anus aberto, o debate sobre políticas mais repressoras em relação aos muçulmanos franceses voltou a tona.

Porém, não é uma tradição da República francesa o costume de provocar reações de extremistas islâmicos com dessacralizações do Profeta. Seu líder por exelencia, Napoleão Bonaparte, tinha uma abordagem completamente diferente em relação a esta questão.

A passagem de Napoleão por um oásis egípcio, por Robert Alexander Hillingford (1828-1904)

De acordo com o historiador egípcio Abdulrahman al-Jabarti em seu livro ‘Aja’ib al-athar fi’l-tarajim wa’l-akhbar (As maravilhosas composições de biografias e eventos), em Agosto de 1798, dois meses após sua chegada no Cairo e vitória sobre os mamelucos na Batalha das Piramides durante a invasão do Egito, Napoleão Bonaparte comissionou juntamente com os eruditos da Universidade de al-Azhar uma suntuosa celebração em horna do nascimento do Profeta Muhammad, o Mawlid an Nabawi ou Feté de Mahomet, onde o líder francês comeu com as mãos a moda islâmica e atendeu a apresentação de dervixes sufis, e das massas muçulmanas que entoavam poemas de elogios ao Profeta pelas ruas da cidade em cortejos suntuosos.

Napoleão, para tentar agradar seus novos súditos muçulmanos os quais via como pragmaticamente úteis em seu jogo político para dominação do Oriente Médio, escreveu uma proclamação em 2 de julho de 1789 na qual dizia:

“Em nome de Allah, o Clemente, o Misericordioso.

Não há divindade além de Allah, que não possui filhos, nem tem um associado em seu domínio. Infelizmente, esse grupo de mamelucos, importados das montanhas de Circassia e da Geórgia, agiu de forma corrupta durante séculos na terra mais bela que se encontra na face do globo (o Egito). No entanto, o Senhor do Universo, o Todo-Poderoso, decretou o fim de seu poder. Ó egípcios, eles podem dizer a vocês que eu não fiz uma expedição aqui para qualquer outro objetivo além daquele de abolir sua religião; mas isso é pura falsidade e vocês não deve dar crédito a isso, mas diga aos caluniadores que eu não vim a vocês exceto para o propósito de restaurar seus direitos das mãos dos opressores e que eu mais do que os mamelucos, sirvo a Allah. – Que Ele seja louvado e exaltado – e reverencio Seu profeta Muhammad e o glorioso Alcorão.

Ó qadis, sheykhs e imãs; digam à sua nação que os franceses são também muçulmanos fiéis e, em confirmação disso, invadiram Roma e destruíram a Sé Pontifícia, que sempre exortava os cristãos a guerrearem com o Islã. E então eles foram para a ilha de Malta, de onde eles expulsaram os Cavaleiros, que afirmavam que Deus, o Exaltado, exigia que eles lutassem contra os muçulmanos. Além disso, os franceses sempre se declararam os mais sinceros amigos do sultão otomano e inimigos de seus inimigos, que Deus perpetue seu império! E, ao contrário, os mamelucos negaram sua obediência ao sultão e não seguiram suas ordens. Na verdade, eles nunca obedeceram a nada além de sua própria ganância!Bênção sobre bênção aos egípcios que agirão de acordo conosco, sem qualquer atraso, pois sua condição será devidamente ajustada e sua posição elevada. Mas ai da aflição para os que se unirem aos mamelucos e os ajudarem na guerra contra nós, pois não encontrarão o caminho da fuga, e nenhum vestígio deles permanecerá.”

Já durante seu exílio em Santa Helena anos mais tarde, Napoleão criticou a peça satírica Mahomet de Voltaire e disse que o escritor francês tornara o Profeta em apenas um impostor e tirano, sem representá-lo como o grande homem que foi:

”Voltaire no caráter e na conduta de seu herói, se afastou tanto da natureza quanto da história. Ele degradou Maomé, fazendo-o descer às intrigas mais baixas. Ele representou um grande homem, que mudou a face do mundo, agindo como um canalha, digno da forca. Ele não fez uma caricatura menos absurda do personagem de Omar, que desenhou como o de um assassino em um melodrama.”

Bibliografia:

-Tradução inglesa da proclamação de Napoleão: t.ly/5Ccq

Quand Napoléon était le champion de l’islam: t.ly/eMjQ

-Christopher de Bellaige, The Islamic Enlightenment. The Struggle between Faith and Reason: 1798 to Modern Time, (New York, Liveright, 2017), 

Memoirs of the Life, Exile, and Conversations of the Emperor Napoleon, volume 2, Emmanuel-Auguste-Dieudonné comte de Las Cases, Redfield, 1855, p.94