O passado de Yasuke é pouco conhecido, mas é estimado que tenha nascido entre os anos de 1555 e 1566. De acordo com o missionário jesuíta François Solier, em seu livro Histoire Ecclesiastique Des Isles Et Royaumes Du Japon, de 1627-9, Yasuke era um “mouro (muçulmano) cafre (infiel)” de Moçambique.

Ele teria chegado ao Japão em 1579 a serviço do missionário jesuíta napolitano, Alessandro Valignano (1539 – 1606), enviado para supervisionar as atividades do missionaríssimo católico no Oriente distante.

O nome pelo qual ficou conhecido na Terra do Sol Nascente, talvez, seja uma derivação dos nomes arábicos “Yasufe” ou “Ishaque”, na pronúncia dos macuas, tribo moçambicana da qual sua origem é traçada.

O uso do termo “mouro” para descrever Yasuke por europeus católicos não remete a uma mera conotação racial africana do mesmo, e sim, naquele contexto especificamente, a uma questão religiosa islâmica.

É sabido que até mesmo muçulmanos chineses eram chamados de mouros por exploradores europeus católicos da região, ainda que etnicamente eles eram diferentes de árabes ou berberes magrebinos, como consta nos relatos do português Galeote Pereira, do século XVI.

Não há um retrato confirmado de Yasuke desenhado por um contemporâneo. Mas, Kanō Eitoku era um distinto pintor patrocinado por Oda Nobunaga e teve uma audiência com Oda quando Yasuke o serviu. A escola Kanō era famosa por seus Nanban byōbu, e há pelo menos um byōbu representando um homem negro bem vestido que poderia ser Yasuke. Uma ilustração feita pelo artista Rinpa em 1590 pertencente ao Museu do Caramulo retrata um homem negro que usa roupas de alta classe que não parece mais subordinado aos portugueses. É possível que esse homem seja Yasuke em trajes portugueses.

Não se sabe também porque se uniu à viagem dos padres, especulando-se que poderia ter sido, originalmente, um mercenário muçulmano africano oriundo de algum potentado indiano, um soldado de navio, algo extremamente comum no Índico daqueles tempos.

Estes mercenários eram largamente empregados nas embarcações da região, retratados até mesmo nas crônicas de Ibn Battuta, mais de um séculos antes, e até hoje há toda uma comunidade de muçulmanos africanos na Índia, formada por seus descendentes que foram influentes na história islâmica do país. A crônica de François também menciona outros escravos muçulmanos a serviço dos padres em variadas funções na missão.

Partindo para Kiyoto, em Março de 1581, Yasuke causou um imenso alvoroço na capital japonesa, e uma multidão se acotovelava em furor para ver aquela figura “estranha” de pele escura, única ali. Os padres temeram que a própria igreja onde estavam fosse destruída pelo tumulto da multidão.

Ouvindo aquele pandemônio, o grande daimyo Oda Nobunaga (1534 – 1582) que estava hospedado em um templo próximo, dirigiu-se ao encontro do mouro de 1,88m de altura, duvidando que sua pele fosse real, fazendo-o se lavar da cintura para cima.

Após ser convencido de que aquela era a pele do homem e admirando sua força, Oda simpatizou-se por ele, que era descrito como de bom trato pelos jesuítas, porém, com a força dez vezes superior à dos homens normais. Dali em diante, Yasuke passou para o serviço do senhor feudal, tornando-se o primeiro samurai estrangeiro nos registros históricos do Japão.

Detalhe de uma luta de sumô desenhada em 1605 por um artista anônimo retrata um homem negro lutando com um homem japonês na presença de samurais nobres. Este samurai é dito ser Oda Nobunaga ou Toyotomi Hideyoshi, o negro provavelmente Yasuke.

Em Maio de 1581, Yasuke foi com Oda para o seu castelo em Azuchi. É dito que foi sagrado nobre, ganhando sua katana, e que seu mestre gostava muito de conversar com ele, o que mostra que tinha aprendido algo do japonês, anteriormente, na missão dos padres.

Um retrato de Oda Nobunaga

Em junho de 1582, Oda foi atacado e, ao ser derrotado, foi forçado ao auto-suicídio (seppuku) em Honnō-ji, Quioto, pelo exército de Akechi Mitsuhide. Yasuke também estava lá no momento e lutou contra as forças de Akechi para defender seu mestre.

Imediatamente, após a morte de Oda, Yasuke juntou-se ao filho e herdeiro de Oda Nobunaga, Oda Nobutada, que tentava adentrar com as forças de Oda no castelo Nijō. Yasuke lutou ao lado das forças de Oda Nobutada por um longo período, mas eventualmente entregou sua espada aos homens de Akechi.

Estes perguntaram a Akechi o que fazer com Yasuke, e o último disse que o homem negro era uma “besta estupida estrangeira”, de modo que não deveriam matá-lo, mas levá-lo para o “templo dos bárbaros sulistas”, como eram descritas as igrejas católicas no Japão.

Diz-se que a razão pela qual Akechi falava deste modo de Yasuke era a forma de, misericordiosamente, apresentar motivos para não matá-lo. Uma vez que os negros não eram discriminados no Japão, mas, na verdade, admirados. Inclusive, Buda foi frequentemente retratado como negro em templos japoneses.

Pintura japonesa do século XVI em estilo nanban representando mercadores portugueses, dentre eles alguns servos negros.

No entanto, talvez Akechi também não quisesse ofender os Jesuítas matando um personagem famoso anteriormente ligado a estes, pois necessitava de todos os amigos que pudesse ter neste momento de turbulência política.

Não há mais nenhuma informação escrita sobre Yasuke após este episódio, embora outro jesuíta contemporâneo, Luis Frois, na sua “História do Japão”, faça menção a um negro africano artilheiro a serviço de Arima Harunobu, em 1584, logo após a temporada passada por Yasuke com Oda Nobunaga, que pode ter sido Yasuke.

A história de Yasuke abunda em referências na cultura pop desde então, sendo retratado em diversos livros, jogos, mangás e até num modelo de carro da Mitsubishi, lançado em homenagem a ele em Moçambique, em 2016.

Bibliografia:

Recomendações de Leitura