O Papado e os Mercenários Cristãos do Norte da África do Século XIII
Autor: Michael Lower 04/05/2024No período medieval, os governantes muçulmanos frequentemente empregavam soldados mercenários cristãos para defender suas pessoas e reforçar seus exércitos. Em nenhum outro lugar esta prática era mais comum que no Norte da África, uma região que, tanto antes quanto agora, se conectava à Europa através da migração, diplomacia e comércio. Desde o século XII até o século XVI, os regimes norte-africanos de todos os tipos acharam que seria útil recrutar europeus para lutar ao seu lado. Alguns destes mercenários eram antigos prisioneiros de guerra, enquanto outros eram proeminentes exilados políticos. A maioria, no entanto, eram de origem mais humildes, combatentes que encontraram um animado mercado para seus serviços no ambiente político descentralizado e ferozmente competitivo do Magrebe do fim da Idade Média.
Apesar de seus termos de serviço serem informais a princípio, por volta do século XIII os mercenários cristãos eram uma presença bem-definida no Norte da África. Tratados negociados entre suas pátrias e os governos que os contrataram especificavam seus salários, armas e suprimentos minuciosamente. Apesar da crescente natureza contratual de seu emprego no Magrebe, havia, de qualquer forma, muita coisa que permanecia incerta sobre o status destes mercenários cristãos servindo em terras islâmicas. Os tratados podiam detalhar o quanto de cevada o cavalo de um mercenário poderia comer em campanha, mas não tinha nada a dizer sobre as questões maiores sobre propriedade, pertencimento e fidelidade que pairava sobre o empreendimento mercenário. Numa era de cruzadas e jihad, agir contra a fé do outro era, às vezes, definido como um crime similar à traição, lutar por um governante muçulmano seria sequer lícito para um cristão? Seria possível permanecer sendo membro da comunidade dos crentes enquanto servia um inimigo declarado da fé em armas? Era possível ser um bom mercenário e um bom cristão ao mesmo tempo?
Estas eram as questões destinadas aos clérigos, não para os diplomatas, e especialmente para o papado, que via a si mesmo como árbitro das relações cristãs com o resto do mundo. Mesmo para os papas-advogados do século XIII, o mercenário cristão no Norte da África revelou-se um enigma. Não havia nenhum corpo legal ou pensamento escolástico fixo sobre esta categoria de cristão. Canonistas e teólogos pastorais abordaram algumas das questões que rodeavam o seu trabalho, mas não as abordaram diretamente. No entanto, os riscos eram elevados, tanto para os mercenários quanto para o papado. O mercenário precisava saber o quão seriamente ele estava comprometendo seus prospectos na Próxima Vida ao se juntar à comitiva de um príncipe norte-africano. O papado precisava decidir se o mercenário tinha se excluído de uma apropriadamente ordeira sociedade cristã ao fazer esta escolha. Seu exílio era apenas físico ou também era espiritual? Além do julgamento pastoral, havia considerações políticas. Que impacto a decisão de condená-lo ou apoiá-lo teria na abordagem de recristianização da África, a terra de Tertuliano, Cipriano e Agostinho?
Papas, canonistas e teólogos eventualmente trabalhariam nas dimensões legais e pastorais da guerra mercenária inter-religiosa nas primeiras décadas do século XIII. Durante este tempo, o ensinamento da igreja a respeito dos mercenários e da ajuda militar a muçulmanos evoluiu significativamente, ganhando flexibilidade e refinamento no processo. Em meados da década de 1230, autoridades religiões do cristianismo latino conceberam critérios que legitimavam algumas formas de serviço militar cristão a governantes muçulmanos. Seu trabalho lançou as bases jurídicas para uma improvável parceria no Magrebe Ocidental. Em vez de expulsar os mercenários da comunidade dos fiéis, o papado passou a tolerar e, por vezes, encorajar ativamente seu trabalho. Ao longo do século XIII, papas que reinaram no auge da monarquia papal – Gregório IX, Inocêncio IV, Nicolau IV – desenvolveram uma relação notavelmente simpática com os soldados que desempenhavam seus deveres fora dos limites da cristandade, ao serviço de uma fé rival.
O apoio do papado aos mercenários estava ligado ao seu objetivo maior para o Norte da África: recristianizar o que fora o coração da antiga igreja. Visto que os mercenários eram uma significativa porção da população cristã norte-africana, os papas viram eles como cruciais para a realização deste objetivo. Primeiramente, as aspirações papais se uniram ao redor de uma estratégia diplomática específica no qual os mercenários apareciam com destaque. Conforme um enfraquecido Império Almóada se tornava mais dependente de mercenários cristãos para ter apoio militar, os papas se tornaram capazes de ligar sua contínua presença nos exércitos almóadas à criação de uma Igreja Cristã e Latina no Marrocos. Quando as negociações com os almóadas sobre o direcionamento futuro da igreja e da segurança dos mercenários alcançaram um impasse no início da década de 1250, o papado endossou os planos castelhanos de uma “Cruzada Africana”. Dado os problemas que precipitaram a ruptura nas relações – cristianização e segurança mercenária – a virada para a cruzada não parece ter representado uma mudança fundamental nas aspirações regionais mais amplas do papado ou um repúdio aos mercenários. Na verdade, por volta do fim do século, os papas estavam louvando os mercenários como uma presença cristã exemplar no Magrebe.
Ao trabalhar com os mercenários para reviver o Cristianismo Latino no Norte da África, o papado demonstrou flexibilidade em um reino de atividade – as relações interreligiosas – onde muitas vezes se pensa que enfatizou a separação, divisão e a diferença. Esta flexibilidade se manifestou tanto no ensinamento papal sobre os mercenários quanto nas políticas que os papas adotaram em relação a eles. A relação entre a ideologia e a prática é uma questão importante nos estudos modernos sobre o Mediterrâneo Medieval. Desde que o influente estudo de David Nuremberg sobre as relações intercomunais na Coroa medieval de Aragão surgiu em 1996, estudiosos têm explorado como atores locais se envolveram com os discursos prevalecentes sobre a diferença religiosa. Uma série de estudos destacou o poder das comunidades locais para empregar, minar ou transformas as normas cristãs latinas que regem as relações interreligiosas para se adequarem a propósitos muitas vezes intensamente locais. Mas e as normas em si – elas podem ter sido mais flexíveis do que imaginávamos? O relacionamento papal com os mercenários cristãos do Norte da África nos permite responder esta questão com precisão, porque o papado não só tentou desenvolver uma série de ensinamentos coerentes acerca do apoio militar aos governantes muçulmanos da região, mas também trabalharam ativamente para moldar o destino dos mercenários cristãos que viviam lá. O resultado destes esforços não foi uma disjunção entre ideologia e prática, mas um grau surpreendente de harmonia. Os ensinamentos papais eram suficientemente adaptáveis para promover uma diplomacia aventureira. Era, de fato, a própria praticabilidade da sua doutrina e política que permitiu que os papas do século XIII perseguissem um objetivo patentemente idealista, que o Padre Burns chamou de “sonho da conversão”: a recristianização da região mais islamizada da Bacia do Mediterrâneo.
Mercenários Cristãos na Europa
Lutar pelo infiel em troca de dinheiro: não soa o tipo de atividade que um papa medieval endossaria ao seu rebanho. Os papas do século XIII, de fato, podiam recordar uma firme tradição de condenação papal em relação aos mercenários que lutaram por príncipes cristãos, quem dirá príncipes muçulmanos. Esta tradição tinha raízes nos esforços eclesiásticos de frear a violência nas companhias mercenárias que atormentou o sul da França em meados do século XII. O papa Alexandre III agiu contra estas companhias no Terceiro Concílio de Latrão em 1179. No Cânone 27, o papa condenou os “brabantes, aragoneses, navarros, bascos, coterelli e triaverdini, que praticam tanta crueldade sobre os cristãos e que não respeitam igrejas nem mosteiros, e não poupam viúvas, órfãos, velhos ou jovens, nem idade ou sexo, mas, como os pagãos, destroem e transformam tudo em escombros”. O cânone condenava grupos específicos que se envolviam tipos específicos de mau comportamento. Ele não proibiu a prática de lutar por dinheiro em geral, que era difundido no fim do século XII. Reconheceu assim, implicitamente, a legitimidade de um combatente que poderia prosseguir licitamente a sua ocupação violenta. O problema para os comentadores posteriores era como distinguir este soldado legítimo do mercenário.
Tomando para si o desafio no início do século XIII, havia três teólogos pastorais iminentes: Pedro Cantor, Roberto de Courçon, e Tomás de Chobham. Eles começaram tornando explícita a distinção implicada no Cânone 27 entre a luta por dinheiro que era lícita e ilícita. Roberto de Courçon identificou dois tipos de combatentes: os coterelli, seu termo favorito para os mercenários, e os milites stipendarii, ou “cavaleiros assalariados”. Para distinguir um do outro, ele se voltou a teorias da guerra justa e o do preço justo, observando que aqueles que “lutavam numa guerra justa” deveriam receber “seus devidos salários”.
Uma vez distinguido do cavaleiro que licitamente receberia seu pagamento, o mercenário foi alvo de duras críticas. Pedro Cantor listou os mercenários dentre as profissões pecaminosas e instou que aqueles que buscavam esta profissão deveriam ter a Eucaristia negada. Roberto de Courçon os chamou de homens malignos infectados pelo sacrilégio. Tomás de Chobham concordou que ofício mercenário era perigoso para alma. No início do século XIII, portanto, havia uma tradição legal e teológica que condenava o combate mercenário cristão na Europa por causa de sua violência ilícita e amor pela pilhagem. Ao mesmo tempo, esta tradição legitimava o cavaleiro que servia num conflito justo por salários apropriados. Visto que esta tradição não proibia lutar por dinheiro, os mercenários cristãos no Norte da África não poderiam ser condenados apenas por estas bases. Mas essa pessoa poderia ser paga por um governante muçulmano? Essa era outra questão.
Apoio militar cristão para muçulmanos
O papado buscou proibir a assistência militar cristã aos muçulmanos desde o final do século XII. Isso estava de acordo com o pensamento jurídico contemporâneo. De acordo com o canonista Huguccio, um cristão que realizava serviço militar voluntário para um muçulmano era um pecador. As proibições papais visavam não só o apoio e aconselhamento aos muçulmanos, mas ao comércio cristão de suprimentos militares também.
Na decretal Ita quorundam, o papa Alexandre III proibiu o suprimento de materiais militares e expertise naval para muçulmanos sob pena de excomunhão, perda de propriedade e potencial escravização se o supridor fosse pego em guerra. O papa Clemente III (1187-91) aumentou o escopo do banimento papal sobre o apoio cristão no esforço de guerra muçulmano. Numa série de decretais, ele expandiu a lista de itens proibidos de serem comercializados, pedindo por um embargo de guerra total com o Mundo Islâmico e os proibiu de servir não só nos navios de guerra muçulmanos, mas “qualquer tipo de ajuda ou aconselhamento, enquanto haja guerra entre nós e eles”.
No Quarto Concílio de Latrão de 1215, o papa Inocêncio III baseou-se na concepção ampliada de Clemente e deu ao embargo papal sua expressão clássica. Ele adicionou mais itens à lista de bens proibidos de serem comercializados (ferro, galés e embarcações estavam incluídas junto a armas e madeira) e impediu os cristãos de prover apoio militar aos muçulmanos a qualquer momento. Mais importante, ele deu uma justificativa explícita para estas proibições. Inocêncio argumentou que eles estavam evitando que danos fossem causados aos cristãos e aos assentamentos cristãos na Terra Santa.
Havia uma latente tensão na apresentação do embargo de Inocêncio. Ao ilegalizar o apoio militar e o comércio cristão com os muçulmanos a qualquer momento, ele ofereceu bases legais para um banimento completo nestas práticas. Ao justificar essa proibição em termos de evitar danos aos cristãos e à Terra Santa, no entanto, ele abriu a porta para uma possibilidade intrigante: poderia haver comércio e apoio aos muçulmanos que não danificavam a cristandade e seus projetos cruzados?
Os comentários canônicos sobre a versão de Inocêncio do embargo não fizeram nada para eliminar essa possibilidade. Em geral, afirmavam que o dano aos cristãos ou à Terra Santa eram as razões principais para impor o banimento. De acordo com o papa Inocêncio IV, a pirataria cristã em nome dos muçulmanos era inaceitável “por causa das seguintes palavras, em ajuda à Terra Santa”. A visão de Ramón de Peñafort era que “não devemos enviar armas aos sarracenos, com as quais eles poderão lutar contra nós”.
Esta não foi a única declaração de Ramón sobre a questão. Em 1234, frades mendicantes que trabalhavam em Túnis enviaram uma longa lista de perguntas sobre como ministrar para os comerciantes, cativos e mercenários que faziam parte de seu rebanho. Ele era a pessoa certa para se perguntar a esse respeito. Além de ser um proeminente canonista e um proponente da missão mendicante no Norte da África, ele estava servindo como penitenciário do papa Gregório IX, o que significava que ele lidava com as questões relacionadas ao foro interno que vinham até ele de todos os cantos da cristandade e além. Uma das questões dos frades tinha relação com os mercenários que trabalhavam para o emir local. Deveriam estes cristãos, que lutam por um regime islâmico, ser excomungados? Ramón encontrou sua resposta no Ad liberandum e no comentário decretal sobre ele. Ele respondeu que aqueles que apoiavam os muçulmanos em seus exércitos não deveriam ser excomungados, a menos que o combate fosse “feito em detrimento da Terra Santa ou de outros cristãos”.
A distinção de Ramón entre assistência militar danosa e não-danosa aos muçulmanos abriu um caminho para a aceitação papal dos soldados cristãos do Magrebe. Se o papado julgasse que estes combatentes não representavam nenhuma ameaça aos seus correligionários e à Terra Santa, então poderiam permanecer cristãos em boa posição. Esta é precisamente a determinação que o papado fez. Ao legitimar sua violenta ocupação, os papas se tornaram capazes de construir uma relação solidária com esses mercenários, uma relação que eles esperavam ser capazes de promover o Cristianismo Latino no Norte da África em meados do século XIII.
Mercenários cristãos no Norte da África
Os mercenários cristãos chegaram no Magrebe há centenas de anos. Muitos deles eram prisioneiros de guerras capturados pelos almorávidas durante suas Campanhas Ibéricas. Esses recrutas logo se juntaram a voluntários de verdade, o mais famoso dele sendo Reverter, visconde de Barcelona e lorde de La Guardia de Montserrat, que ascendeu a uma posição de liderança no exército almorávida antes de morrer no Magrebe, em 1144. Naquela época, os almorávidas encaravam desafios ao seu governo por parte de grupos dissidentes andalusos na Espanha e por parte dos almóadas no Marrocos. O califa almóada, Abd al-Mumin, capturou a capital almorávida, Marrakesh, em março de 1147. Suas tropas massacraram muitos dos habitantes da cidade, mas deu aos soldados cristãos a possibilidade de se converter ao Islam ou voltar para a Ibéria. Um grande êxodo de mercenários cristãos para Toledo logo ocorreu.
Enquanto os sucessores de Abd al-Mumin lutavam com as exigências de se governar um império transmediterrânico e multiétnico, mercenários cristãos logo se viram novamente aceitos ao serviço almóada. Fernando Rodríguez de Castro se juntou às forças do califa almóada Abu Yaqub Yusuf em 1174 e os ajudou a atacar as propriedades de seu antigo senhor, o rei de Leão. Geraldo Sempavor, um senhor da guerra português, lutou por Abu Yaqub Yusuf no Magrebe e foi recompensado com uma propriedade no Atlas Ocidental.
O fluxo de mercenários europeus para o Norte da África aumentou após uma grande aliança de monarquias ibéricas derrotarem os almóadas na Batalha de Las Navas de Tolosa em julho de 1212. Embora considera na altura um triunfo da unidade cristã face a um rival religioso, a batalha, na verdade, aumentou o mercado para mercenários cristãos ibéricos dispostos a ultrapassar a divisão religiosa. 1213 trouxe seca e fome à Península Ibérica, o que desencorajou as potências cristãs de prosseguirem a reconquista mais profundamente em al-Andalus. O papa Inocêncio III retirou as indulgências às cruzadas ibéricas, procurando redirecionar as energias militares da cristandade para a Terra Santa. Importantes líderes dos dois lados morreram, incluindo o Rei Pedro II de Aragão, rei Afonso VIII de Castela e o califa almóada Muhammad an-Nasir. Enquanto estes estados se reorganizavam internamente, o conflito interreligoso parou, pelo menos por enquanto. Castela e o Império Almóada fizeram uma trégua em Salé, em 1215, que foi renovado em 1221. Com as oportunidades de combate na fronteira ibérica restritas, muitos guerreiros castelhanos começaram a ponderar suas opções. A insatisfação com o novo governo real e conflitos internos à nobreza encorajaram vários combatentes a buscar suas fortunas do outro lado do Estreito.
Eles encontraram uma calorosa recepção lá, porque a derrota almóada em Las Navas criou um tipo de ambiente político caótico e descentralizado nos quais os mercenários costumavam prosperar. Grupos rivais emergiram para explorar a crescente fraqueza do regime almóada. No Magrebe Oriental, os hafsidas estabeleceram um emirado autônomo ao redor de Túnis no início da década de 1230; no Magrebe Central, os zayyanidas retiraram os almóadas do poder em Tlemcem logo depois; e no Magrebe Ocidental, as últimas dinastias almóadas lutavam com os marinidas enquanto travavam uma guerra civil interna. Os marinidas eventualmente prevaleceriam no Marrocos, mas não até 1269. O lento colapso do poder almóada inaugurou o apogeu dos mercenários cristãos no Norte da África.
As dinastias hafsidas, zayyanidas e marinidas estabeleceram, todas elas, guardas mercenários cristãos ao longo do século XIII. Mas nenhum poder norte-africano dependia mais dos soldados cristãos que os próprios almóadas. O califa Yusuf al-Mustansir (1213-24) empregou duas unidades militares cristãs. Uma estava baseada em Meknes e era comandada pelo renegado Abu Zakariya Yahya, cujo pai era um caid castelhano (comandante mercenário) chamado Gonzalo e cuja mãe (como é dito) era irmã do rei de Castela. A outra tropa tinha sua sede em Marrakesh e era liderada por um aristocrata de alta patente: o infante Pedro Fernandes, irmão do rei Afonso II de Portugal. A juntar-se a estes nobres recrutas da guarda mercenária cristã de al-Mustansir estava o magnata castelhano Conde Fernando Nuñez de Lara.
Estes soldados ajudaram al-Mustansir a segurar os marinidas, que lançaram uma rebelião na região próxima de Fez. Os mercenários eram impotentes para prevenir a crise dinástica dos almóadas quando al-Mustansir morreu em 1224. No Marrocos e em al-Andalus Ocidental, um membro da família governante muminida chamado Abu Muhammad Abdul Wahid obteve a aprovação das famílias almóadas mais poderosas. Em Al-Andalus Oriental, no entanto, um tio de al-Mustansir, Abu Muhammad Abdullah al-Adil, se autoproclamou califa em Múrcia. Ele ganhou apoio suficiente na Espanha Muçulmana para convencer os marroquinos a eliminar Abdul Wahid. Eles o depuseram e o assassinaram em setembro de 1224. No meio deste conflito civil, a al-Andalus almóada começou a ruir. Emirados independentes surgiram em Valência em 1224 e em Baeza, em 1225. Uma vez no poder, al-Adil praticamente não teve chance de reconstituir seus domínios destruídos. Tendo assistido seu antigo rival ser removido do poder e assassinado em 1224, ele sofreu o mesmo destino apenas três anos depois.
Após a morte de al-Adil, dois possíveis sucessores se anunciaram. Um era o irmão de al-Adil, Abu al-Ula al-Mamun, que se proclamou califa em Sevilha em 15 de setembro de 1227. O outro era o sobrinho de al-Adil, Yahya ibn an-Nasir, que ganhou a lealdade do sheikhs almóadas e ganhou controle de Marrakesh, Sijilmassa e do sul do Marrocos. Esta rápida consolidação do poder no Marrocos deu uma vantagem inicial a Yahya. Pior ainda para al-Mamun, ele enfrentou oposição em al-Andalus do emir de Baeza, al-Bayasi, e de Muhammad ibn Yusuf, dos Banu Hud, que reivindicou o califado para si em Múrcia, em 1227-28. Enquanto os candidatos à sucessão de al-Adil multiplicavam, al-Mamun decidiu fazer uma aposta desesperada. Ao invés de tentar unificar al-Andalus sob sua candidatura, ele atacaria o coração almóada e tentaria ganhar o califado expulsando Yahya de Marrakesh.
Só havia um problema com o plano: com o Marrocos e a maior parte de al-Andalus estando contra ele, al-Mamun tinha poucos soldados ao seu dispor. Assim, ele pediu ao rei Fernando III de Castela por tropas para tomar o Marrocos. De acordo com Ibn Abi Zar, o rei concordou em lhe ceder doze mil homens, mas exigiu uma série de concessões em retorno:
“Não lhe darei o exército, senão com a condição de que você me dará dez fortalezas, que eu mesmo escolherei, na fronteira de minha terra; se o favor de Deus estiver sobre ti e entrares em Marrakesh, construa uma igreja no centro da cidade para os cristãos que forem contigo, onde eles possam expor sua religião e soar seus sinos na hora de suas orações. Se um cristão tentar se converter ao Islam, ele não deve ser recebido como muçulmano e será devolvido aos seus irmãos para que eles possam julgá-lo de acordo com suas leis; e se um muçulmano se converter ao cristianismo, ninguém deverá fazer nada consigo”.
Estudiosos questionaram alguns aspectos do relato de Ibn Abi Zar sobre este acordo. A figura de doze mil soldados é quase que certamente exagerada. A estimativa de Ibn Idhari de quinhentos parece fazer mais sentido com aquilo que sabemos sobre o tamanho dos exércitos mediterrâneos medievais. Então, há provisões governando a conversão entre Islam e Cristianismo. Mesmo o mais desesperado dos pretendentes almóadas concordariam com o tráfico de sentido único de convertidos que Ibn Abi Zar descreve? Se estes detalhes permanecem abertos ao questionamento, outras fontes confirmais elementos críticos do acordo: que al-Mamun recrutou mercenários castelhanos para sua invasão do Marrocos, permitiu-lhes construir uma igreja em Marrakesh e permitiu o soar dos sinos. Desta forma, o tratado entre Fernando III e al-Mamun conectou o apoio militar cristão aos almóadas com o avanço do Cristianismo Latino no Marrocos.
Al-Mamun recebeu suas tropas no verão de 1229 e no fim de setembro saiu de Algeciras em direção a Ceuta, na costa marroquina. Após um lento avanço em direção a Marrakesh, suas forças encontraram as forças de Yahya ibn an-Nasir fora da cidade em 11 de fevereiro de 1230. Al-Mamun venceu uma vitória clara, com seus mercenários cristãos desferindo o golpe crucial. Eles atacaram a tenda de Yahya e a destruíram, criando pânico enquanto seus soldados temiam sua morte. Yahya, na verdade, sobreviveu à derrota e fugiu para as fortalezas nas montanhas de seus aliados na tribo Hintata.
Uma vez sob controle de Marrakesh, al-Mamun quebrou radicalmente com as tradições políticas e religiosas almóadas. Os almóadas baniram descrentes de se assentarem permanentemente na cidade. Eles podiam entrar em seus muros durante o dia, mas tinham que sair ao anoitecer. Agora, al-Mamun manteve sua promessa ao rei Fernando e permitiu que uma igreja cristã fosse construída em Marrakesh. Ela era dedicada a Maria e, se os relatos do século XVI estão certos, estava localizada perto do quartel-general dos mercenários cristãos, a oeste da Mesquita de al-Mansur. De acordo com Ibn Khaldun, o novo califa permitiu que os fiéis cristãos soassem os sinos de suas igrejas.
Ao recompensa seus seguidores cristãos, al-Mamun voltou-se com ira feroz contra os líderes tribais almóadas que apoiaram Yahya ibn an-Nasr para o califado. Declarando-lhes traidores, ele os executou e ordenou que suas cabeças fossem penduradas nos muros de Marrakesh. Ele despachou um édito no império negando que Ibn Tumart, o fundador almóada, era o Mahdi – o redentor divinamente inspirado da teologia islâmica que restauraria a justiça no mundo: “Saibam que rejeitamos a falsidade e publicizamos a verdade e que não há outro Mahdi além de Jesus, o filho de Maria”. Ele negou que Ibn Turmat possuísse “infalibilidade” e ordenou que seu nome fosse removido das orações de sexta-feira e das moedas.
A declaração de al-Mamun de que Jesus era o verdadeiro Mahdi pode ter impressionado alguns dos combatentes cristãos que o ajudaram a conquistar Marrakesh. Mesmo assim, sua renúncia a Ibn Turmat provavelmente almejava mais que reter a lealdade dos mercenários. Seus ensinamentos sobre o Mahdi enquadravam-se nos limites da ortodoxia sunita, conforme definido pela escola de jurisprudência Maliki, que, naquela época, se tornava cada vez mais influente no Norte da África. O abandono de al-Mamun ao almóadismo alinhou as ideias religiosas que animaram seu regime com a doutrina maliki. Por isso, pode ter representado uma forma de alcançar tanto círculos muçulmanos em seus domínios quanto sua guarda cristã. No longo prazo, essa estratégia pode ter se provado bem-sucedida. No curto prazo, deixou al-Mamun mais dependente dos seus soldados cristãos do que nunca.
Apesar do expurgo, a oposição almóada ao governo do califa permaneceu forte no Marrocos. Al-Mamun foi forçado a enfrentar Yahya ibn an-Nasir uma segunda vez no verão de 1230. Yahya sofreu outra derrota, escapando nas montanhas novamente. Em 1232, o irmão de al-Mamun se rebelou contra ele em Ceuta. Al-Mamun investiu a cidade, mas foi incapaz de destruir seus muros. Enquanto a ocupação se arrastava, Yahya se aproveitou de sua ausência para lançar um ataque em Marrakesh. Al-Mamun tentou voltar para sua capital, mas morreu antes de chegar. Yahya saqueou a cidade.
Em meio à destruição geral, os soldados de Yahya se certificaram de destruir a igreja cristã. De acordo com Ibn Abi Zar, eles também mataram “muitos judeus e Banu Farkhan e tomaram seus bens”. O significado original da palavra árabe farkh é “passarinho”. Num registro pejorativo, poderia significar “jovens homens” ou mesmo “bastardos”. Muçulmanos norte-africanos e andalusos usavam o termo para se referir a soldados mercenários cristãos. A palavra entrou no espanhol como farfan (plural: farfanes). Um pequeno grupo de descendentes dos mercenários cristãos de Marrakesh que retornaram para a Península Ibérica no fim do século XIV apareceram nas fontes como farfanes. O que Ibn Abi Zar parece estar descrevendo, então, é a morte de alguns membros da guarda mercenária cristã de al-Mamun durante o ataque de Yahya ibn an-Nasir a Marrakesh em 1232. Uma crônica franciscana do século XIV dá um importante complemento a este relato. Ela descreve o martírio de cinco frades franciscanos na Igreja da Abençoada Maria de Marrakesh nesta época, junto ao massacre de uma “grande multidão de cristãos de ambos os sexos”.
Estes relatos sobre o ataque a Marrakesh mostram o quanto os inimigos de al-Mamun associaram a causa do cristianismo ao seu governo. Os relatos também questões mais amplas sobre a comunidade cristã do Norte da África medieval e o local dos cristãos nela. Quem eram estes cristãos “de ambos os sexos” que foram mortos no ataque de 1232? Como os franciscanos chegaram na capital almóada? Por que eles retornaram para uma cidade em que vários de seus irmãos sofreram um martírio público doze anos depois?
As comunidades cristãs do Norte da África
O destino das comunidades cristãs indígenas do Norte da África é um quebra-cabeça histórico com muitas peças faltantes. Evidência das crônicas, geografias e histórias é esparsa, o mesmo vale para os restos epigráficos e arqueológicos. Há muito trabalho a ser feito para preencher as consideráveis lacunas deixadas pelo estado da evidência sobrevivente. Recentemente, no entanto, estudiosos começaram a desenvolver modelos melhores para entender quando e como o cristianismo norte-africano decaiu e desapareceu durante a Antiguidade Tardia e o Medievo. A tendência geral na academia está longe das interpretações que afirmam a “rápida morte” das comunidades cristãs indígenas no na esteira da Conquista Árabe do Magrebe no século VII. Dominique Valérian, Mohamed Talbi e Mark Handley falam de um longo processo de declínio que chegou até os séculos XI e XII. Talbi descreve uma “lenta asfixia” do cristianismo norte-africano pré-islâmico, marcado por três grandes êxodos de populações cristãs: a primeira durante a invasão árabe inicial; a segunda durante as incursões dos Banu Hilal em meados do século XI; e a terceira durante a retirada normanda do Norte da África em 1160 em face à pressão almóada. Algumas comunidades cristãs sobreviveriam mais tempo, “reduzidas, isoladas e espalhadas” na região. No fim do século XII, uma comunidade cristã indígena pode ter vivida em Qal’a, no centro da Argélia. Al-Idrisi se refere a berberes em Gafsa que falavam um dialeto latino local no século XII, implicando sua fidelidade ao cristianismo. Ibn Khaldun descreve aldeões em Nafzawa, no sul de Bizacena, falando o mesmo dialeto duzentos anos depois.
Um exemplo do crescente enfraquecimento da Igreja Norte-Africa nos séculos XI e XII foi sua maior necessidade de voltar-se a Roma para regular suas questões internas. Enquanto a hierarquia eclesiástica africana encolhia, havia menos bispos disponíveis para assentar disputas entre dioceses e para consagrar um novo clero. Em 1053, o papa Leão IX interviu numa luta por precedência entre o arcebispo de Cartago, a sede tradicional da Igreja Africana e o bispo de Gummi-Mahdia, cujas reivindicações foram favorecidas pelos ziridas. Ao fazê-lo, Leão lamentava que apenas cinco bispos restavam em “toda a África”, que outrora ostentava um episcopado com mais de duzentos homens. Na época do papa Gregório VII, havia apenas dois bispos africanos, menos do que os três necessários para consagrar um novo membro da hierarquia. Em 1076, Gregório foi compelido a pedir ao arcebispo Ciríaco que enviasse um candidato qualificado a Roma para consagração. No mesmo ano, o papa respondeu positivamente a um pedido extraordinário do emir hammadida de Bejaya, an-Nasir, para apontar um bispo para liderar a comunidade cristã da cidade. Gregório esperava ver um renascimento do cristianismo africano, mas seus novos apontamentos falharam em impedir o declínio geral das estruturas eclesiásticas latinas lá.
Muitas vezes se pensa que o século XIII marcou um novo começo para o cristianismo no Norte da África, já que recém-chegados da Europa passaram a residir nas grandes cidades costeiras. Na verdade, porém, houve uma grande sobreposição cronológica entre a chegada destes cristãos europeus e o desaparecimento gradual das comunidades indígenas. Às vezes, os almorávidas enviaram de volta para o Marrocos prisioneiros cristãos que eles tinham capturado durante suas Campanhas Ibéricas. Deportações em massa de cativos ocorreram em 1109, 1126, 1130 e 1138. De acordo com uma fatwa do século XII da coleção de al-Wansharisi, os cristãos deportados podiam construir igrejas onde se assentavam. Alguns destes prisioneiros eram súditos dos reinos cristãos do Norte da Ibéria. Outros eram moçárabes de al-Andalus. Um bispo moçárabe chamado Miguel ibn Abdul Aziz viveu em Fez entre 1126 e 1137. Durante esta época, ele fez uma cópia dos Evangelhos em árabe. Os almorávidas recrutaram soldados de ambas as comunidades cristãs ibéricas para suas primeiras guardas cristãs que, como vimos, rapidamente começaram a atrair também castelhanos recrutados livremente. Juntando-se aos cativos e mercenários entre os novos cristãos que chegaram ao Magrebe Ocidental, estavam mercadores da Catalunha, Provença e das Repúblicas Marítimas Italianas. Pisa parece ter estabelecido relações comerciais com os almorávidas na década de 1130, enquanto Gênova concordou com um pacto comercial com os almóadas na década de 1150. Não há informação firme sobre o tamanho destas novas comunidades cristãs, mas a evidência anedótica que temos sugere que eram modestas.
Mesmo a menor das comunidades cristãs latinas necessitava de clero para administrar os ritos. No século XII, como vimos, nenhuma hierarquia eclesiástica latina efetiva restou no Norte da África. Os primeiros esforços para ministrar aos novos grupos cristãos eram ad hoc. Parece que quando o bispo Miguel ibn Abdul Aziz chegou em Fez como cativo em 1126, ele continuou a desempenhar um papel pastoral; mas ele não tinha um posicionamento formal como bispo norte-africano. Outros do clero também podem ter estado ativos dentre os cativos e mercenários do Marrocos Almorávida. A Crônica do Imperador Afonso VIII relata que os mercenários que fugiram de Marrakesh em 1147 após a conquista almóada retornaram para Toledo “com seu bispo e grande parte de seu clero” (pode ter sido o bispo Miguel, mas não há prova positiva da identidade do bispo).
Estes arranjos informais continuaram no início do século XIII. O infante português, Pedro, trouxe um capelão pessoal consigo para Marrakesh, onde tomou o comando das tropas cristãs que estavam lá: Joan Robert, cânon da Igreja da Santa Cruz de Coimbra. Os comerciantes também usaram seu próprio clero de casa. Cada comunidade mercantil europeia do Magrebe Medieval viva e trabalhava em sua própria fábrica mercantil, ou funduk. Cada funduk abrigava, geralmente, uma pequena capela dirigida por um compatriota. Em Ceuta, no final de 1220, por exemplo, um padre chamado Hugo serviu como “vigário dos genoveses”. A terceira maior população cristã do Norte da África – os cativos – podiam encontrar um padre entre eles, mas não poderiam empregar ninguém do clero. Rumo ao fim do século XII, duas ordens religiosas foram fundadas para ministrar às suas necessidades espirituais e, se possível, adquirir a sua liberdade. Os trinitários e mercedários se estabeleceram rapidamente no Magrebe Ocidental.
A chegada das ordens redentoras deu continuidade à tendência a estruturas eclesiásticas altamente atomizadas na Igreja do Norte da África, com cada comunidade cristã – mercenária, comerciante e cativa – tendo seu próprio clero ou religioso. Em outro sentido, porém, a implantação dos trinitários e dos mercedários no Magrebe representou uma nova partida. Seus esforços reviveram o interesse papal nos cristãos da região. Em 8 de março de 1199, o papa Inocêncio III escreveu para “Miramolin, o ilustre rei do Marrocos” para recomendar os trinitários. Papas posteriores, especialmente Honório III, Gregório IX e Inocêncio IV, se preocuparam com toda a comunidade cristã latina do Norte da África e, estimulados pelas ordens mendicantes, tentaram expandi-la através de um programa de evangelização. O desenvolvimento histórico peculiar desta comunidade colocou o papado numa posição curiosa. Os cristãos indígenas tinham quase desaparecido, a nova população cristã era pequena e um dos seus principais componentes não era livre, enquanto o outro era transitório, indo e vindo com as exigências do comércio. O grupo restante representava uma relativamente permanente e voluntária presença cristã latina no Norte da África. O cuidado pastoral que recebiam era informal e subdesenvolvido. Seu trabalho era valorizado por um enfraquecido, mas ainda formidável, regime norte-africano. Mercenários que serviam aos almóadas – seriam a pedra de fundação para uma nova igreja cristã latina na terra de Agostinho.
Os papas e os mercenários
Honório III desempenhou um papel crucial no desenvolvimento da política papal no Norte da África durante o século XIII. Firme proponente do cruzadismo em outros locais, no Norte da África focou na proteção das comunidades cristãs existentes da região e em conquistar convertidos dentre a maioria muçulmana. Esta abordagem permaneceu influente na cúria papal ao longo da década de 1250.
As pequenas populações cristãs do Norte da África do século XIII parecem ter inspirado esperança e temor em Honório: esperança de que eles cresceriam e estimulariam a recristianização da África; e temor de que eles seriam absorvidos pela população muçulmana ao seu redor. Os primeiros esforços de Honório na região se concentravam em defender uma comunidade que ele via como vulnerável. Em 1219, ele escreveu para o califa almóada al-Mustansir, que empregava duas guardas mercenárias cristãs em seus esforços contra a insurgência marinida. O papa expressou alarde, que o califa poderia estar escutando aqueles que estavam exigindo que ele proibisse os cristãos de sua terra de praticar sua religião livremente. Na opinião de Honório, este não era apenas um conselho ruim – ele citou uma série de admoestações bíblicas sobre o destino de governantes que frustraram a vontade de Deus desta maneira – mas que também era injusto, visto que o papa permitiu que uma “inumerável multidão” de muçulmanos exercessem seus direitos religiosos entre os cristãos. Honório suplicou ao califa para que permitisse que “os homens de nosso povo [cristãos] pudessem usar sua própria lei livremente”.
Se estes cristãos não pudessem praticar sua fé, eles podiam se sentir pressionados a abandoná-la. Os cativos eram vistos como especialmente sensíveis a tal compulsão, por razões óbvias, mas os mercenários também levantaram preocupações neste sentido. O filho do famoso mercenário almorávida, o capitão Reverter, se converteu ao Islam. O comandante da tropa cristã de al-Mustansir em Meknes, Abu Zakariya Yahya, fez o mesmo – seu caso pode ter ficado na mente de Honório enquanto ele apelava por liberdade religiosa para os cristãos no Marrocos.
O medo da apostasia de Honório também o encorajou a ser flexível sobre a maneira como o cristianismo era praticado no Norte da África. No início de 1223 ele recebeu mais informações sobre as relações de al-Mustansir com os cristãos de seu reino. O califa celebrou vitórias militares ao convidar "cinco cristãos de grande piedade e reputação vivendo sob seu poder” para festas onde eram obrigados a comer carne, mesmo na sexta-feira ou durante a Quaresma. Quando o papa soube disso, escreveu para seus “queridos filhos cristãos dispersos no Marrocos”. Ele absolveu aqueles que foram forçados a agir contra sua fé desta maneira, ofereceu suas condolências por seu infortúnio e exortou-lhes a permanecerem firmes em sua fé. Esta carta levanta questões enigmáticas: a que comunidade cristã os participantes da festa pertenciam? Eles eram nobres mercenários que trabalhavam para al-Mustansir à época, como o infante Pedro Fernandes ou o conde Fernando Núñez de Lara? Eles eram cônsules encarregados dos funduks mercantis? Eram cativos distintos que caíram sob posse de al-Mustansir? Eram comerciantes ou capelães mercenários ou irmãos trinitários/mercedários? E porque cinco deles foram convidados para as festas, não mais, não menos? Se o texto deixa estas questões em dúvida, ela deixa claro que Honório estava ansioso para apoiar os cristãos do Marrocos, mesmo quando isso implicava em adaptar a prática cristã às inesperadas exigências da vida das minorias.
As ambições de Honório para o Magreb iam além da defenda de suas modestas comunidades cristãs. Ao longo de 1225 e 1226, ele lançou um programa missionário completo na região. Seus planos tomaram forma depois de um dos episódios mais famosos na história sobre as primeiras missões mendicantes ao mundo islâmico: a morte de cinco frades franciscanos em Marrakesh, tradicionalmente datada como 16 de janeiro de 1220. O Padre Burns cunhou a frase “confronto fanático” para descrever a técnica inicial franciscana de buscar converter pelo exemplo, inspirando indivíduos a receber a fé através do sofrimento, a ponto de chegar ao martírio. Cinco anos depois, Honório promoveria uma abordagem mais sóbria, que certamente buscava conquistar convertidos, mas não à custa da vida do missionário, nem a ponto de arriscar as populações cristãs existentes. Ele expôs sua visão numa carta de junho de 1225 aos frades dominicanos Domingo e Martín, que estavam prestes a embarcar na primeira missão de sua ordem no Marrocos. Inspirando-se no Evangelho, ele lhes disse que seu objetivo deveria ser “converter o infiel, desenvolver o caído, fortalecer o fraco, confortar os duvidosos e confirmar os fortes”. Eles deveriam combinar, em outras palavras, seu objetivo missionário com trabalhos entre os cristãos locais. Com esta agenda balanceada em mente, o papa lhes concedeu autoridade não só para batizar convertidos, mas também impor penitências aos cristãos locais, absolve-los de sentenças de excomunhão e reconciliá-los à igreja do qual apostataram.
Em outubro de 1225, Honório pediu por reforços franciscanos e dominicanos que se juntassem a Domingo e Martín no Magrebe Ocidental. É provável que, a esta altura, ele também tenha procurado um parceiro secular para sua aventura no Norte da África. Este era o Reino de Castela, que entrou num período de interação pacífica com os almóadas, marcado pelas tréguas de 1215 e 1221. Para se aproveitar das boas relações entre as duas potências, fazia sentido buscar novos recrutas missionários em Castela e fazê-lo em conjunto com o principal prelado do reino, Rodrigo Jiménez de Rada, arcebispo de Toledo. Honório, portanto, convidou Rodrigo para designar mendicantes para a missão marroquina. Para fornecer uma base eclesiástica mais permanente para o empreendimento, Honório deu um passo adicional crucial. Ele pediu ao arcebispo para nomear um dos missionários mendicantes como novo bispo do Marrocos. Rodrigo escolheu o irmão Domingo. Não é claro se Domingo exerceu seu ofício episcopal de maneira significativa. Em fevereiro de 1226, Honório escrevia novamente para Rodrigo falando sobre a missão marroquina. Desta vez, ele pediu que o arcebispo despachasse mais mendicantes para o Norte da África e nomear mais um ou dois bispos para a região se parecesse prudente. Após séculos de declínio, uma incipiente igreja cristã no Norte da África tomava forma mais uma vez.
Honório não tinha ilusões sobre o desafio de construir esta igreja. Esquecendo de ganhar convertidos, os mendicantes enviados para o Marrocos lutaram para ministrar para os cristãos residentes. O papa logo concedeu aos frades várias dispensas das regras de sua ordem para permitir-lhes cumprir mais facilmente a sua missão, permitindo-lhes usar barbas, vestir-se à moda local e receber esmolas em dinheiro. E, apesar da ousadia de seu programa missionário, Honório permaneceu convencido de que os cristãos locais eram vulneráveis à apostasia. Em sua carta de 1226 ao arcebispo Rodrigo de Toledo, ele descreveu como os cristãos do Marrocos, espalhados pela “vasta amplitude” do reino, viviam em meio a um povo feroz “que persegue os professores do nome cristão com excessiva crueldade”. Como resultado, o papa observou, arrependido, “no reino de Miramolin há muitos cativos cristãos que dizem ter apostatado por medo de serem torturados e mortos, enquanto outros, fracos em fé, estão cambaleantes em direção à beira de um abismo”.
A fala de Honório sobre um abismo não estava muito errada. O conflito dinástico almóada após a morte de al-Mustansir em 1224 deixou os cuidadosos planos do papa de desenvolvimento da Igreja Latina no Marrocos em dúvida. A luta entre al-Adil e Abdul Wahid sugeriram um futuro incerto para os cristãos na região. Mas a ascensão de al-Mamun ao poder transformou a situação. Ao rejeitar as fontes tradicionais de legitimidade almóada e confiar nos seus mercenários cristãos, al-Mamun criou uma dinâmica que permaneceria em vigor durante décadas. Em seu cerne estava uma troca – mercenários por cristianização – que uniu o papado, os almóadas e Castela numa constelação político-religiosa no Mediterrâneo Ocidental.
Abu Muhammad Abdul Wahid al-Rashid tinha quatorze anos quando seu pai, al-Mamun, morreu em Wad al-Abid, em outubro de 1232. Sua sucessão ao califado deveu muito à sua mãe, Habab, uma cristã e ex-prisioneira, e ao mercenário conhecido como Far Qasil, o caid da guarda cristã do seu pai. O capitão mercenário, que já tinha sido, em sua vida pregressa, um soldado castelhano chamado Sancho, logo provou-se indispensável para o jovem califa. Em novembro de 1232, ele ajudou a derrotar a velha nêmesis de al-Mamun, Yahya ibn an-Nasr, diante dos muros de Marrakesh, o que permitiram a al-Rashid a tomar posse da capital almóada. Um ano depois, o irmão de Far Qasil, Gonzalo, chegou com mais soldados de Castela. Apesar dos reforços, uma rebelião expulsou al-Rashid em Marrakesh em 1235. Tirando o melhor partido de sua expulsão, o califa e seus mercenários cristãos fugiram para o sul, para Sijilmassa, e recapturaram o antigo reduto almóada. Eles não só ganharam a cidade, mas também derrotaram os mercenários cristãos do emir, que se juntaram ao exército que acabaram de derrotar em marcha ao seu próximo alvo: Fez. Aqui, al-Rashid também foi capaz de ganhar reconhecimento de sua autoridade e por volta de 1236 ele se tornou mestre de Marrakesh mais uma vez.
A crescente dependência da dinastia almóada do apoio militar dos mercenários cristãos não escapou da atenção da cúria papal. Em maio de 1233, o papa Gregório IX enviou uma carta ousada “ao nobre homem, Miramolin”. A mensagem do papa para o califa continha uma oferta, um pedido e uma ameaça. A oferta era a de abraçar o cristianismo: “desejamos e exigimos ardentemente que a vocês que andam nas sombras ele revele seu único filho, a verdadeira luz, e os chame misericordiosamente à fé da verdade cristã no reconhecimento de seu Filho, o Senhor Jesus Cristo”. O pedido era para que tratasse os cristãos de seu reino bem, especialmente o franciscano, irmão Agnello, aqui descrito como o “bispo de Fez”, e os outros mendicantes trabalhando consigo. Do contrário (e esta é a ameaça), “se escolher ser um inimigo de Cristo em vez de ser um amigo, não permitiremos de forma alguma, como não deveríamos permitir, o que é feito por você por seus fiéis”. O que os cristãos fizeram por al-Mamun e al-Rashid foi lutar por eles como mercenários. Ao reclamar o controle sobre tal apoio militar cristão, Gregório conectaria sua tolerância a este fato à tolerância do califa à missão mendicante no Marrocos. Os mercenários se tornaram uma fonte de influência nos esforços papais para promover o cristianismo no Norte da África.
O franco apelo para que o califa se convertesse ao cristianismo marca numa nova confiança no trato papal com os almóadas. Gregório despachou mais mendicantes para o Magrebe Ocidental em 1233 e, em 1237, anunciou a nomeação de um novo bispo do Marrocos. O tom da carta de anúncio, endereçada a todos os “fiéis em cristo no Reino do Marrocos”, é celebratória, quase triunfante. “Regozijamo-nos,” proclamou Gregório, “que a igreja do Marrocos, anteriormente estéril, voltou à fecundidade e que a sinagoga dos pecadores, que costumava ter muitos filhos, está enfraquecida”.
Apesar de todo o otimismo de Gregório, havia riscos inerentes à ligação do apoio militar cristão aos almóadas à cristianização no Marrocos. Uma delas era que se tratava de uma barganha nascida do desespero almóada. Quanto mais fraca a dinastia ficava, mais concessões o papado podia conquistar. Mas se a dinastia se enfraquecesse a ponto de colapsar, a nascente Igreja Latina do Marrocos poderia se partir junto com ela. Alternativamente, um enfraquecido reclamante almóada poderia decidir que o apoio papal já não valia o custo de antagonizar outros grupos de interesse. Ele pode repudiar a estratégia e converter a uma maior dependência a aliados tradicionais. Pior ainda, do ponto de vista da cúria, um califa poderia desmascarar seu blefe: poderia um papa realmente deter o fluxo de mercenários para o Norte da África? Enquanto o sucessor de Gregório, Inocêncio IV, pesava os riscos e as recompensas da diplomacia papal com os almóadas, os mercenários cristãos do Marrocos emergiram como um foco central do interesse papal no Norte da África.
Em outubro de 1246, Inocêncio IV escreveu para o califa almóada Abu al-Hasan al-Said, agradecendo pelo apoio que ele demonstrou à igreja cristã em seus reinos e parabenizando-o pelas vitórias conquistadas sobre seus inimigos. Al-Said chegou ao poder em 1242 após a morte de seu meio-irmão al-Rashid num acidente de barco. O novo califa, que era filho de al-Mamun e uma escrava núbia, continuou a tradição familiar de depender de mercenários cristãos. Numa crucial batalha contra o emir marinida Abu Muarif Muhammad ibn Abd al-Haq, travada em 12 de novembro 1244, o comandante da guarda cristã, conhecido nas fontes apenas como “filho do conde” (ibn al-qamt), liderou o ataque que deu vitória a al-Said. Durante a batalha, o capitão mercenário Juan Gaitan matou Abd al-Haq, eliminando o maior rival marinida do califa.
Em sua carta, Inocêncio destacou que al-Said conquistou sua vitória com a ajuda de combatentes cristãos. Apesar de vencer batalhas por forças islâmicas não parecer a melhor forma de ser louvado por um papa medieval, Inocêncio fez um elogio a estes mercenários. Ele declarou que eles estavam realizando a obra de Deus no Marrocos, pois, quando lutavam em defesa do reino do califa, também estavam defendendo “a fé católica e a igreja”. Apesar de improvável à primeira vista, esta não era uma ideia fantasiosa. A Igreja Latina do Marrocos tornou-se tão associada ao governo de al-Mamun e seus filhos que se tornou um alvo de seus inimigos, como nos Ataques de Marrakesh de 1232 por Yahya ibn an-Nasr e seus seguidores. Inocêncio destacou esta tradição de apoio califal à igreja nas cláusulas iniciais da carta, exortando al-Said a seguir os passos dos “príncipes católicos e seus predecessores, que concederam os privilégios de muitas liberdades à igreja marroquina e a dotaram de muitos benefícios, e que a defenderam até o presente dos esforços e incursões de... inimigos da fé cristã. Até então, al-Said tinha feito jus à reputação da sua família de proteger as comunidades cristãs do reino almóada. Ele também concedeu à igreja liberdades, privilégios, imunidades e defendeu e apoiou “com benefícios oportunos” os cristãos introduzidos nas suas terras pelos seus antecessores.
Estes cristãos – a referência é claramente feita à guarda cristã mercenária fundada por al-Mamun – ajudaram al-Said a repelir os “insultos e violentos ataques” de seus inimigos. Eles também permitiram ao califa que acumulasse uma grande quantidade de pilhagem. Se os cristãos mercenários trouxeram tantas recompensas para ele, que benefícios ele acumularia se aceitasse a fé de Cristo? “Se você ao menos pudesse ascender ao auge da contemplação e saborear um pouco da doçura da sabedoria divina!” Além deste benefício inefável, a conversão também traria a al-Said a proteção especial da Sé Apostólica. Com certeza resultaria em “uma inumerável multidão de pessoas” seguindo-o na fé.
Após conjurar esta visão das conversões em massa no Magrebe Ocidental, Inocêncio retornou para as realidades mais sombrias da vida cristã na região. As tropas cristãs de al-Said conquistaram uma esplêndida vitória em 1244, mas desde então, as ameaças externas ao seu regime se tornaram mais severas. Em 1246, ele estava sob pressão não só dos marinidas, mas também dos zayyanidas, a leste. Os mercenários cristãos estiveram no lado perdedor dos confrontos com estes rivais dos almóadas. Então, enquanto Inocêncio olhava para o futuro, ele não gostava do que via. Apesar do antigo sucesso militar do califa, conquistada com ajuda cristã, seus inimigos estavam ganhando dele. Com mãos fortes e grande astúcia, eles estavam se esforçando para infestar suas terras. Os mercenários cristãos eram, portanto, mais importantes para a segurança do reino do que nunca. Mas e se o inimigo lançasse um ataque inesperado? Os mercenários poderiam ser apagados, deixando o reino indefeso e o califa em perigo. Para prevenir esta catástrofe, al-Said proveria os mercenários com fortalezas nos quais eles poderiam buscar refúgio em momentos de crise, junto aos portos costeiros através dos quais poderiam se retirar e, mais tarde, retornar com reforços. Apesar de os mercenários possuírem fortes e portos, o califa manteria sua suserania sobre eles.
Para entregar seu apelo em nome dos mercenários, Inocêncio anunciou um novo bispo para o Marrocos, Lope Fernández de Aín. Lope trouxe para esta missão uma longa experiência diplomática. Nascido perto de Zaragoza, na Coroa de Aragão, ele se tornou um frade franciscano em 1221. No fim da década de 1230, ele representava a Província Franciscana de Aragão em negociações na cúria papal, que chamaram atenção de Gregório IX. Em meados da década de 1240, ele estava servindo como conselheiro de Inocêncio IV em Lyon. Ele também era bem conhecido na corte real castelhana. Ele permaneceria na vanguarda das iniciativas papais e castelhanas no Norte da África até sua morte, no início da década de 1260.
A missão de Lope não era limitada a discutir a guerra da guarda mercenária cristã de al-Said. Mais uma vez, como nos dias de Honório, otimismo e pessimismo combinavam nos planos papais. Por um lado, Inocêncio parece ter acredito que um grande segmento da população cristã norte-africana estava em apuros tão sérios que necessitavam de fortalezas para se proteger. Isso não parece ser um bom presságio para seu futuro. Por outro, as negociações do papa com o califa sobre a segurança dos mercenários fizeram parte de um esforço maior para revitalizar a Cristandade Norte-Africana. Fortalecer a Igreja Latina do Marrocos permanecia um componente central deste esforço. Inocêncio chamou a Igreja Marroquina de “filha especial da igreja romana” e argumentou que tinha direito a uma consideração especial porque foi “estabelecida nos confins da terra” e que estava “sozinha e única” naquela parte do mundo. Apesar de toda a importância que Inocêncio atribuía ao Magrebe Ocidental, suas ambições para a missão do Bispo Lope se estendiam para além daquela região. Ele queria que o novo bispo revivesse o cristianismo não apenas no Marrocos, mas em todo Norte da África. Inocêncio expandiu o escopo das responsabilidades pastorais de Lope, incorporando partes do Magrebe central e oriental. Ele nomeou bispos para os emires de Túnis, Bejaya e Ceuta, enquanto destacava que “muitos cristãos” viviam em seus domínios e que “muitos também poderiam ir até lá para vender mercadorias”. Finalmente, além de servir a estas comunidades estabelecidas, o empreendimento de Lope teria o objetivo missionário tradicional. Inocêncio proclamou que o trabalho do bispo levaria a uma “nova plantação” do cristianismo na África.
Inocêncio lançou uma campanha promocional para a missão de Lope que era tão ambiciosa quanto os objetivos que traçou para ela. A expedição não era uma cruzada – uma das tarefas de Lope, no fim das contas, era enviar uma carta para al-Said – mas os esforços do papa para conquistar apoio para ela, trazia todas as características da promoção cruzada. Ele apelou por assistência a todos os recipientes tradicionais da propaganda cruzada: monarcas com interesse no resultado (nesse caso, os reis de Castela, Aragão, Navarra e Portugal); prelados que poderiam promover o empreendimento (os arcebispos de Genova e Tarragona; os bispos de Valência, Maiorca, Porto, Burgos, Pamplona, Barcelona, Marselha e Narbona); as ordens mendicantes e militares (neste caso a ordem ibérica de Santiago); e finalmente os leigos (especialmente aqueles que viviam “na costa da Espanha”) que pareciam dispostos a responder positivamente ao apelo. Inocêncio também dispensou privilégios para induzir a participação. Numa tentativa de atrair leigos ao grupo de viagem de Lope, o papa concedeu permissão aos cristãos da África para que se casassem dentro dos graus proibidos de consanguinidade. Esta medida pode ter sido destinada a dissipar as preocupações sobre encontrar um companheiro numa comunidade tão pequena. Ele também ofereceu a indulgência da cruzada da Terra Santa completa para aqueles que se juntassem à comitiva permanente de Lope. Inocêncio não explicou seu raciocínio para conceder a indulgência, mas isso demonstra sua ansiedade em atrair recrutas e, talvez, também sua sensação de que o trabalho pudesse envolver perigo e o uso da força em defesa da fé.
A expedição de Lope combinou motivos e métodos díspares. Era meio empreendimento missionário e meia missão diplomática. Foi promovida como uma cruzada, mas seus objetivos eram proteger e expandir o cristianismo norte-africano pacificamente, enquanto defendia os interesses dos mercenários que lutavam por um príncipe muçulmano. Apropriadamente, não foi nem tão bem, nem tão mal quanto Inocêncio esperava. O bispo e sua comitiva foram bem tratados durante sua estadia na corte do califa e nunca estiveram em perigo físico. Em outros aspectos, no entanto, o empreendimento não foi bem-sucedido. Por causa da ampla natureza de suas preparações, o bispo Lope levou muitos meses para ficar pronto para a partida. Em fevereiro de 1247, cerca de quatro meses após sua nomeação como bispo do Marrocos, ele ainda estava na cúria em Lyon, absorto nos detalhes do planejamento. Em 28 de fevereiro, ele recebeu uma dispensação similar para o padre Bernardo, que o acompanharia até o Marrocos. Após isso, o bispo do Marrocos desapareceu dos registros históricos até junho de 1250.
No intervalo, as políticas domésticas almóadas se transformaram mais uma vez. O califa almóada al-Said foi morto enquanto fazia uma campanha contra os zayyanidas em junho de 1248. Seu filho mais novo perdeu a vida na mesma época. Na ausência de um herdeiro direto, os sheikhs almóadas se reuniram em Marrakesh para escolher um novo califa. Após um contencioso debate, eles concordaram num membro de um ramo cadete da linha muminida, Abu Hafs Omar, que recebeu o título califal de al-Murtada. Sua ascensão ao poder não era um bom presságio para a embaixada do bispo Lope. O novo califa devia sua posição mais aos sheikhs almóadas que o escolheram e menos às tropas cristãs que apoiaram al-Mamun, al-Rashid e al-Said. Antes de sua eleição, além disso, tinha servido como governador de Salé, uma cidade portuária estrategicamente significativa e muito cobiçada pelas potências europeias. Al-Said o indicou para este cargo após executar o governante anterior da cidade por tentar se converter ao cristianismo e ceder seu “reino” aos Cavaleiros de Santiago. Al-Murtada precisaria, agora, responder a um pedido do bispo do Marrocos para render as fortalezas costeiras (talvez a própria Salé) aos mercenários cristãos de seu falecido predecessor.
Temos a sorte de ter a resposta de al-Murtada à carta do papa Inocêncio para al-Said, que é datada de 10 de junho de 1250. O califa começou com uma invocação à doutrina unitária almóada que destacava seus contrastes com a fé cristã: “Louvamos a Deus – não há divindade senão Ele – à maneira de quem sabe que é o único Senhor, cuja unidade é estabelecida pelos argumentos e testemunhos mais decisivos. Sabemos que os intelectos superiores detestam admitir que Ele teve um filho ou que deveria ser chamado de Pai; além disso, o Soberano misericordioso está além das opiniões expressas pelos trinitarianos, idólatras e incrédulos”. Tanto, então, para se converter ao cristianismo, como Inocêncio desejava. A crença correta reside, em vez disso, nos ensinamentos de Ibn Tumart. Al-Murtada o louvou como o reconhecido Mahdi e restaurou sua posição de infalibilidade que al-Mamun negou vinte anos antes. Em verdade, ao reafirmar a base doutrinária tradicional da autoridade califal almóada, al-Murtada assinalou uma quebra com a política de al-Mamun e seus filhos. Aqueles califas nunca rejeitaram as fundações tribais do poder almóada – isso seria impossível. Mas eles colocaram uma ênfase maior na atração de apoio externo a seu governo – dos mercenários cristãos, dos castelhanos e do papado. Isto, por sua vez, encorajou-os a tolerar aberturas diplomáticas destinadas a fortificar a presença cristã em seus reinos. A declaração da ortodoxia almóada de al-Murtada anunciou o fim dessa tolerância e do relacionamento especial que a cúria papal acreditava ter desenvolvido com o Califado Almóada desde os dias de Honório III. Al-Murtada estabeleceu os novos termos das relações papais-almóadas numa formulação diplomática primorosamente evasiva: “Confirmamos, à extensão de que isto é legítimo, [nossas] razões para nos conectar convosco, e renovamos, o quanto pudermos, a garantia de nossa consideração”.
O que esta declaração significava em termos políticos para al-Murtada? Certamente significou que a guarda cristã almóada não receberia quaisquer fortalezas costeiras. O califa sequer mencionava a questão em sua carta. Mas, evidentemente, gostaria de manter os soldados cristãos ao seu serviço, porque ele permaneceu aberto ao clero cristão ministrar às suas necessidades espirituais. Na parte final da carta, ele sugeriu que Inocêncio “enviasse aos cristãos em serviço nas terras dos almóadas... um homem que se preocupasse com o que era bom em sua religião e os encorajasse a observar suas leis habituais”. Dado que Inocêncio despachou o bispo Lope para fazer exatamente isso, o pedido do califa parece enigmático à primeira vista. Mas al-Murtada seguiu adiante: o candidato apropriado para a posição seria um homem de “intelecto superior e boa conduta: de modo que pudesse ser um daqueles que, de forma clara, desejavam evitar o mal e que, a seu serviço, se distinguiam por uma doutrina excelente e intenções louváveis. O bispo Lope, parece, não se enquadrava no perfil. Isso, de certa forma, era a mensagem mais ampla que a carta de al-Murtada entregou. O califa estava feliz em empregar mercenários cristãos, mas ele os queria sem compromissos. Eles podiam ter um clérigo piedoso como pastor, mas não haveria nenhum bispo Lope nem sua equipe de mendicantes, ansioso em evangelizar e desenvolver a igreja marroquina.
No início de junho de 1250, Lope deixou a corte do califa para levar as más notícias em pessoa para o papa. Após escutar o relato do bispo, Inocêncio escreveu para al-Murtada em março de 1251. A diferença em relação ao tom e ao conteúdo da carta do papa de 1246 é grande. Não houve regozijo no estado da igreja marroquina, nenhum apelo à conversão. Em vez disso, havia uma severa reiteração à demanda de que al-Murtada concedesse locais fortificados nos quais os mercenários pudessem “viver em segurança e se defenderem contra seus inimigos em tempos de necessidade”. Graças à recusa do califa em ceder ao pedido original, Inocêncio afirmou que “os já mencionados cristãos sofrem graves danos às suas pessoas e propriedades, pois acontece que, como muitos deles vão frequentemente [em campanha] com o seu exército, ou trabalham para você de outras maneiras, eles não possuem um local seguro onde podem deixar para trás suas esposas, filhos ou outros parentes, por isso, os sarracenos, aproveitando-se da oportunidade, mataram a muitos deles e obrigaram alguns a negarem a fé católica”. Se o califa falhasse mais uma vez em ceder as fortalezas, Inocêncio não teria outra alternativa senão comandar o bispo Lope a enviar todos os cristãos que o serviam de volta para casa e proibir quaisquer outros cristãos de viajar para lá. Não sabemos que Inocêncio sustentou esta ameaça. Ele certamente não deu muito tempo a al-Murtada para cumprir a sua exigência, pois em outubro de 1252 o papa estava contemplando uma abordagem mais agressiva para cristianizar o Magrebe e proteger os mercenários.
A virada para a Cruzada
Após as negociações papais-almóadas sobre os mercenários fracassarem, as relações entre os dois lados ficaram mais hostis. A terceira parte nesta relação ocidental-mediterrânea – os castelhanos – exacerbaram a divisão adotando uma postura mais hostil frente ao Magrebe Ocidental no mesmo período. A conquista de Sevilha em 1248 forçou uma série de governantes andalusos, anteriormente hostis, a buscarem acomodações com Castela, que liberou recursos e despertou a imaginação para uma campanha no Estreito. Enquanto o rei Fernando III permaneceu cauteloso até o fim, seu herdeiro, Afonso X, declarou que ele lideraria uma “Cruzada Africana” logo após sua ascensão ao trono em 1252. Inocêncio endossou os planos do rei, autorizando indulgências e outros privilégios cruzados e lançando uma campanha propagandística em Castela, Leão e Navarra no início de 1253.
A expedição africana do rei Afonso demorou bastante tempo para ficar pronta. Sua tentativa de tornar Sacro Imperador Romano provou-se uma distração. O papado permaneceu envolvido, com o papa Alexandre IV continuando onde Inocêncio IV havia parado, e recorrendo a uma figura familiar, o bispo Lope do Marrocos, para liderar uma nova campanha de recrutamento em 1255. Lope se assentou em Toledo após reportar a Inocêncio sobre sua missão marroquina fracassada em 1251. Além de pregar a cruzada, Lope também serviu como legado papal na África. Nesta função, seus deveres incluiriam delimitar dioceses nas terras “reconquistadas” pelo rei Afonso X “das mãos sarracenas”.
Como a nova atribuição de Lope na África sugere, a virada papal à cruzada na década de 1250, não implicava numa ruptura completa com a política anterior. Tal qual a abordagem anterior de missionar e promover o desenvolvimento eclesiástico incorporou elementos cruzadísticos, a Cruzada Africana tinha um componente missionário. Em setembro de 1258, Afonso X pediu permissão de Alexandre IV para construir uma igreja naquilo que o papa chamava de regnum Tenetu, cujo líder tinha se submetido a Afonso e que parecia, pela estima de Afonso, simpático ao cristianismo. Joseph F. O’Callaghan identificou este “reino” como sendo o porto argelino de Ténès. Na mesma linha, o rei Henrique III da Inglaterra parabenizou Afonso por tentar “não apenas subjugar os nativos bárbaros À Cruz, mas também trazê-los... para a luz da verdade e do conhecimento do nome de Deus”. A cristianização permaneceu uma ambição maior, com a cruzada sendo o novo veículo para alcançá-la. Em face a isto, a nova abordagem pareceu representar um perigo aos mercenários cristãos do Norte da África. Os planos cruzados podem tê-los feito alvo de represálias. Não é totalmente claro, no entanto, se Inocêncio IV e Alexandre IV viram a mudança para a cruzada como colocando os mercenários e suas famílias em ainda mais perigo. Seu patrão, al-Murtada, nunca foi um alvo explícito da cruzada. Em sua correspondência, os dois papas se referiam à cruzada contra os “Sarracenos da África” – possivelmente numa tentativa de manter as opções do rei Afonso abertas. Uma campanha contra os inimigos dos almóadas, como os marinidas, poderia ter ajudado os mercenários que, como Inocêncio percebeu, estavam perdendo várias batalhas com seu crescente poder. Também é crucial ter em mente que a avaliação de Inocêncio sobre a situação da segurança dos mercenários no Marrocos era extremamente sombria. Ele os descreveu vivendo entre “povos bárbaros”; como sujeitos a ataques dos rivais dos almóadas, que estavam prestes a eliminar a dinastia completamente (Inocêncio estava certo sobre isso, é claro); e que precisavam de nada além de fortalezas interiores e costeiras para ficarem seguros. Após al-Murtada rejeitar os apelos por tal proteção duas vezes e demitir o bispo Lope, Inocêncio e Alexandre estariam dispostos a tentar uma nova forma de defender mercenários e outros grupos cristãos no Marrocos.
Deve ser dito, no entanto, que defender os cristãos parece ter estado longe das mentes dos cruzados castelhanos que saquearam Salé, um porto marroquino na costa atlântica, e mataram ou emprisionaram muitos de seus habitantes muçulmanos em setembro de 1260. A cidade, que estava sob controle nominal de um dissidente senhor da guerra marinida, suportou duas semanas de saques e pilhagens. Os cruzados, então, se retiraram sob pressão do emir marinida Abu al-Haq. Isso pôs fim ao único confronto armado resultante da Cruzada Africana do Rei Afonso.
Após a expedição de Salé, os castelhanos, os almóadas e o papado encontraram menos razões para se envolver, fosse diplomaticamente ou no campo de batalha. Cada parte estava muito distraída com problemas domésticos. O papado estava consumido com a questão siciliana, o rei Afonso encarou uma insurreição mudéjar, e al-Murtada lutava contra os zayyanidas e os marinidas. Em 1266, al-Murtada perdeu Marrakesh e sua vida numa revolta liderada por um rival almóada reclamante ao califado. Três anos depois, o império almóada já tinha deixado de existir, varrido com a conquista marinida de Marrakesh.
Se aproveitando deste realinhamento político, os mercenários cristãos entraram no Norte da África em números cada vez maiores. Al-Murtada continuou a empregar soldados cristãos na década de 1260. Na década de 1270, os guardas mercenários da Túnis hafisa e da Fez marinida eram escolhas populares. Os hafsidas recrutavam dentre os combatentes de Aragão e da Catalunha, enquanto os marinidas olhavam para o mercado mercenário castelhano que os almóadas dominaram por tanto tempo. Os zayyanidas também desenvolveram uma substancial guarda cristã.
No fim do século XIII, o papado se envolveu novamente com as comunidades cristãs do Norte da África. Assumindo a liderança estava o papa Nicolau IV (1288-92), um franciscano e antigo ministro-geral da ordem que era comprometida defensora do missionamento. Em dezembro de 1289, ele nomeou um novo bispo para o Marrocos, o frade franciscano Rodrigo. O novo bispo recebeu jurisdição sobre toda a comunidade cristã da África, incluindo moradores permanentes e visitantes (provavelmente comerciantes que iam e vinham a negócio). Ele também obteve o direito de ceder indulgencias de cem dias àqueles que atendessem à sua pregação no Marrocos, para aqueles que permanecessem lá a serviço de seus correligionários cristãos e para aqueles que dessem apoio monetário para a redenção de cativos, a construção ou decoração de igrejas ou para o sustento de convertidos à nova fé.
Com este duplo foco em promover a comunidade existente (redimindo cativos, construindo igrejas, encorajando o atendimento aos sermões) e expandindo-a através da evangelização (apoiando novos convertidos), o papa Nicolau se inspirou na abordagem papal à cristianização do Norte da África inaugurada por Honório III, Gregório IX e Inocêncio IV. Ele também incluiu os mercenários cristãos em seus planos. Em fevereiro de 1290, ele os escreveu diretamente, endereçando uma carta “aos nobres homens, barões, capitães, cavaleiros e outros mercenários cristãos estabelecidos no serviço dos reinos do Marrocos, Túnis e Tlemcen”. Deixando de lado as questões de segurança que preocuparam Inocêncio IV, Nicolau focou em encorajar os mercenários a viver uma vida cristã. Apesar de ansiar que os cristãos de todo o mundo vivessem corretamente, ele queria, especialmente, que aqueles que viviam em terras infiéis fossem puros em sua fé, obras e virtude. Os mercenários, portanto, deviam ser jutos, piedosos e honestos, e não deviam fazer nada que fizesse a fé cristã ser blasfemada. Ao viver uma vida cristã exemplar, eles podiam servir como modelos para cristãos e muçulmanos. Nicolau instou-lhes a serem “zelosos ao demonstrar uma forma de vida reta e conversação com os incrédulos, de modo que, oferecendo orientação com a ajuda da caridade e da piedade, exercendo-se constantemente na misericórdia divina e abstendo-se de qualquer coisa que possa desvirtuar o nome cristão, tanto os fiéis quanto os infiéis que residem nessas partes podem ser informados pelo seu exemplo e colher os frutos de uma vida melhor”. Aqui, então, havia um papel legítimo para o mercenário desempenhar no universo moral cristão. Na visão idealizada do papa, ele poderia ajudar a atrair os incrédulos para a fé, vivendo uma vida irrepreensível em sua presença. Nicolau IV queria que os mercenários cristãos do Norte da África fossem missionários.
Por trás dessa caracterização de aprovação estava uma doutrina jurídica e uma escolha política. Ao longo do curso de um longo desenvolvimento no século XII e início do século XIII, a lei canônica sobre o apoio militar cristão aos muçulmanos ganhou refino e sutileza. Sucessivos papas e canonistas se afastaram da condenação geral da prática e desenvolveram critérios para estabelecer quando ela podia ser legítima. A formulação que eventualmente prevaleceu – a de que o apoio militar cristão aos regimes muçulmanos era inocente se não implicasse em danos à Terra Santa ou a outros cristãos – concedeu ao papado flexibilidade em sua forma de lidar com o mundo islâmico e com os cristãos latinos que viviam em suas fronteiras. No Norte da África, os papas fizeram uso desta flexibilidade para promover objetivos políticos específicos. A aplicação de Ramón de Peñafort da lei canônica sobre o apoio militar a muçulmanos para os mercenários cristãos da região permitiu que o papado desenvolvesse um relacionamento solidário com aqueles combatentes e suas famílias. Visto que representavam um grande e estrategicamente significante segmento da população cristã do Magrebe, esta relação ajudou a cúria a perseguir seu objetivo maior de proteger e expandir a presença cristã lá. No caso dos mercenários cristãos que lutavam pelos muçulmanos, a lei papal e a política papal reforçavam-se mutuamente.
Vale a pena destacar a flexibilidade da doutrina e da prática papal no Norte da África no século XIII. Estudos recentes sobre o Mediterrâneo Medieval fizeram muito para desalojar antigas noções de uma região dividida em linhas confessionais, com identidades religiosas rigorosamente impostas na ordem do dia tanto para muçulmanos quanto para cristãos. A ênfase nos Estudos Mediterrâneos está agora nas identidades pessoais fluidas e nas redes multimodais de interação. Mesmo assim, alguns elementos da antiga visão permanecem. Dentre essas está a ideia de que, enquanto atores individuais podem ter sido flexíveis e pragmáticos, as normas e discursos prevalentes do Islam e Cristianismo Medieval permaneceram fixas ao redor de ideologias de diferença religiosa. As elites religiosas e legais ergueram fronteiras seladas entre as duas religiões e endossaram o conflito, na forma de jihad e cruzada, como a postura normativa de cada religião em relação à outra. Embora os indivíduos possam ter transgredido, as normas permaneceram em vigor. Os papas do século XIII certamente abraçaram o conceito de uma república cristã, ou cristandade, que definia a ordem política em termos religiosos. Eles também endossaram a cruzada como um veículo para defender e manter essa ordem. Dentro deste mundo de pensamento de conflito e divisão, parece haver pouco espaço para tolerar cristãos que serviram nas forças armadas dos governantes muçulmanos. No entanto, os papas se revelaram menos rígidos nesta questão do que os estudos modernos têm permitido. O resultado foi que, quando tentaram reviver a Igreja Latina do Sul do Mediterrâneo, eles foram capazes de se voltar a um aliado improvável para ter apoio: os mercenários cristãos que lutavam pelos regimes islâmicos do Magrebe Medieval.