Texto de: Youssef El Alaoui

A Expulsão dos Mouriscos da Espanha não passou despercebida entre aqueles que viviam nesse período, não somente nos países muçulmanos1 como também nos países Cristãos como a França, que viria a ter, relutantemente, um papel secundário nessa tragédia.

O cardeal Richelieu, em suas memórias, menciona o ocorrido no ano de 1610. Em quatro páginas, ele nos oferece a perspectiva de uma pessoa de fora que, apesar de não estar governando o país – ele se tornaria o todo-poderoso primeiro ministro e o favorito de Luís XIII de 1624-1642 – parece ter estado bem informado e ciente da história dos Mouriscos (muito embora ele iria inflar, como muitos outros, o número dos [mouriscos] expulsos, colocando em 800,000). Para Richelieu, o que ocorreu em 1610 foi “o mais imprudente e bárbaro conselho que a história de todos os séculos anteriores já registrou”: ele se refere, obviamente, a expulsão dos Mouriscos, que, ele afirma, foram banidos de seu país após terem sido abusados, menosprezados e tratados como escravos. Ele compara essa Expulsão à transmigração do êxodo dos Judeus do Egito, concluindo que o destino dos Mouriscos foi ainda mais cruel: enquanto os Judeus pediram permissão para retornar para suas próprias terras, os Mouriscos foram expulsos das deles:

“Nós contamos mais de 800 mil dessas pessoas, de modo que essa transmigração não foi menor do que aquela dos Judeus do Egito; havendo, entretanto, essas duas diferenças entre os dois, que no primeiro caso os Hebreus forçaram os Egípcios a deixar eles irem embora, enquanto que no segundo os Mouriscos foram forçados a partir; no primeiro, os Hebreus saíram de uma terra estranha a fim de sacrificar à Deus e chegar até uma [terra] fértil que havia sido prometida a eles, enquanto que no segundo caso os Mouriscos saíram de sua terra nativa para passar por uma [terra] desconhecida onde eles teriam de viver como estranhos, e em grande perigo de abandonar a verdadeira adoração à Deus.”

Em um clima de hostilidade entre as duas potências, isso seria uma oportunidade para a França, “que é conhecida em todo o mundo como um refúgio para os aflitos”, em demonstrar sua generosidade e piedade ao acolher aqueles que professavam a fé Católica e facilitar a passagem para as terras Islâmicas para aqueles que preferiram manter sua antiga religião.2

Embora tenha alguns relatos contemporâneos dos ocorridos, a atitude da Espanha continuou sendo julgada de uma maneira negativa, como vemos nos autores que trataram sobre a Expulsão nos séculos XIX e XX, valendo-se das mesmas fontes de novo e de novo. O historiador Henri Martin, por exemplo, dedicou várias páginas de sua obra de história da França de 1857 para tratar do drama Mourisco: empregando, como Richelieu, uma comparação Bíblica, ele pensava que:

“nós devemos voltar para as conquistas do antigo Oriente, para as pessoas vencidas que foram retiradas de suas casas em massa, ao cativeiro da Babilônia, para encontrar cenas comparáveis ao que a Europa testemunhou no século XVII! A responsabilidade por esse grande ataque à humanidade recai inteiramente no Catolicismo Espanhol: o Papado se recusou a ser associado com isso. Tão implacável contra os inimigos internos, contra os hereges, [a Espanha] não sentiu a mesma fúria contra o inimigo de fora, o Islã. A Corte Espanhola não conseguiu persuadir Paulo V a se juntar à condenação de todo um povo.3

Esse seria o tom geral de algumas obras publicadas sobre os Mouriscos, principalmente no século XIX.

Saindo dos fatos para a ficção com Cervantes, que bem conhecia os Mouriscos, encontramos na Parte II de Dom Quixote o que Ricote diz para Sancho, em um famoso discurso:

“Como estava dizendo, eu saí da nossa vila, fui para a França, e apesar de eles terem nos acolhido lá, eu queria ver tudo. Viajei para a Itália, fui para a Alemanha, e lá parecia que eu poderia viver com grande liberdade porque os habitantes não se preocupam com sutilezas: cada homem vive como ele bem entender, porque na maioria dos locais há liberdade de consciência.”

Ele fala ainda de seu plano de desenterrar seu tesouro e encontrar sua esposa e filha “e arranjar uma forma de leva-las até um porto Francês, e de lá para a Alemanha”. Ele conclui, “O que me surpreende é não saber como minha esposa e filha foram para a Berbéria ao invés da França, onde elas poderiam viver como Cristãs.”4

De acordo com Philippe Berger5, esse capítulo sobre o tema da Expulsão teria sido escrito por volta de 1614 – ou seja, depois da morte de Henrique IV em 1610 e a mudança da política de Maria de Médici que advogava pela remoção de todos os Mouriscos da França.

Qual era a realidade do “acolhimento” na França, e o que nós sabemos sobre a habilidade Mourisca de “viver como Cristãos” lá? Veremos que ambas as afirmações precisam ser esclarecidas, como a sobre a liberdade de consciência na Alemanha.

Juan Goytisolo, em um artigo de opinativo intitulado “Moriscos, la historia incómoda” [Mouriscos, uma história inconveniente], observa sobre a citação de Ricote com as seguintes palavras: “Liberdade de consciência! À parte, e sem ênfase, o autor de Dom Quixote expõe aqui o cerne da questão. Os sentinelas do Santo Ofício estavam sempre alertas, mas um bom leitor não precisaria de mais palavras”.6 Luce López-Baralt, discutindo sobre a imagem que Cervantes ilustra de Ricote na passagem citada, pensa que “quando Cervantes escreve sobre os Mouriscos Espanhóis, que ele conhecia intimamente, ele normalmente não está muito distante da verdade histórica.”7 Ela se refere principalmente ao seu conhecimento sobre a realidade Mourisca e especialmente de sua realidade clandestina. Roland Labarre, que discorda da interpretação de Márquez Villanueva (e, podemos acrescentar, de Goytisolo) da frase de “liberdade de consciência” de Ricote, acredita que “alegar que tem o mesmo significado positivo aqui que os protestantes lhe deram, e que ainda conota, requer ignorar sua crítica incontestável à falta de delicadeza – isto é, de escrúpulos religiosos – dos alemães; em todo caso, devemos aceitar que a intenção da frase era pejorativa, nunca esquecendo que Cervantes estava escrevendo para os súditos do Monarca Católico.”8

Qual era, então, a verdade sobre aquela suposta liberdade de consciência na Alemanha (nas Províncias Unidas havia, de fato, uma forma de tolerância do final do século XVI em diante), no contexto da confessionalização9 das monarquias europeias após a Paz de Augsburgo (1555) e especialmente depois do Concílio de Trento (1563)? Acreditamos que devemos adotar uma visão diferenciada da extensão da tolerância e da liberdade de consciência no século XVI e no início do século XVII. Como sugere o trabalho de Joseph Leclerc, no século XVI após a Paz de Augsburgo, havia liberdade de culto na Alemanha para governantes soberanos, mas não para seus súditos:10 o princípio prevalecente era cujus regio, ejus religio. A Contra-Reforma alemã foi marcada por intensa atividade literária no âmbito político-religioso, mas poucas obras promoveram a tolerância (no sentido de concessão ou permissividade em matéria de liberdade religiosa), e sua influência foi limitada. Leclerc nos diz que a massa da opinião pública – seja católica, luterana ou calvinista – não aceitava a diversidade religiosa no Estado. Neste contexto, a ideia de um acordo entre as três confissões não prevaleceu (exceto na Boêmia e Brandemburgo, onde acordos locais foram feitos),11 e a Guerra dos Trinta Anos (1618-1648) não ajudou em nada. Wolfgang Kaiser sustenta que a Europa confessional, ao invés de abrir um espaço para a liberdade religiosa ou tolerância no sentido moderno, criou uma estrutura restritiva12 para judeus e muçulmanos.13 Como podemos inferir desses estudos, a esposa de Ricote – se ela era uma boa católica ou não – teria achado difícil estabelecer-se não apenas na Alemanha, mas até na França, como veremos a seguir. Mas primeiro devemos tentar responder a uma série de questões que surgem quando nos propomos a escrever uma “história” dos mouriscos na França. Quantos mouriscos passaram pela França? Quais foram as condições de acolhimento, pelas autoridades e pela população local? Quantos se estabeleceram lá e quantos simplesmente cruzaram a França em seu caminho para o Norte da África ou Turquia?

Do ponto de vista de hoje, podemos afirmar que os mouriscos não deixaram vestígios significativos na historiografia francesa. Os trabalhos sobre os mouriscos na França são poucos: de Henri Lapeyre,14 que fornece dados sobre o número de mouriscos que entraram na França; Bonifacio de Echegaray,15 membro da academia de línguas bascas, que seguiu os passos dos mouriscos no País Basco francês; Louis Cardaillac,16 que estudou sua passagem pelo Languedoc; Osmin Ricau,17 Robert Sauzet,18 e Pierre Santoni19 para os Mouriscos em Provença. Esses autores usam as poucas fontes publicadas sobre o assunto, particularmente Francisque Michel20 e Jules Mathorez,21 que, por sua vez, contam com ainda menos relatos contemporâneos dos eventos: o Mercure Français22 (de 1605), as memórias do Duque de La Force,23 Pierre Davity (1665),24 e algumas histórias locais como as escritas sobre Marselha25 no século XVII e sobre os Pirineus,26 Bayonne,27 Biarritz28 e Montpellier29 no século XIX. O valor dessas obras reside no recurso a uma variedade de arquivos – municipais, departamentais, eclesiásticos e notariais – das principais regiões ou cidades envolvidas: Saint Jean de Luz, Bayonne, Pau, Bordéus, Toulouse, Aix-en-Provence, Agde, Marselha e outras pequenas comunidades pelas quais os mouriscos passaram após o exílio da Espanha.

Hoje, a Internet nos dá acesso a muitos documentos digitalizados dos séculos XVI e XVII (por exemplo, certificados de batismo, casamento e falecimento) dos arquivos departamentais de Les Landes, Gironde, Bouches du Rhône e Hérault,30 embora possa ser difícil explorá-los em busca dos mouriscos. Santoni chama a atenção para uma série de fontes importantes que valem a pena explorar: o Parlamento de Aix e as coleções notariais em Aix, Arles e Toulon.31

Francisque Michel, Cardaillac e Santoni são os estudiosos que mais contribuíram para o estudo deste grupo minoritário na França, apresentando questões de pesquisa e conclusões provisórias que se sobrepõem e, embora não sejam definitivas, constituem um ponto de partida necessário para o desenvolvimento de uma história dos mouriscos na França. A duração dessa história foi breve: cerca de 40 anos, se começarmos com os primeiros contatos com autoridades francesas na década de 1580, quando os mouriscos tentavam persuadi-los a invadir a Espanha, até o momento em que esses espanhóis desaparecem do registro documental. (Não contamos aqui os muitos mouriscos que entraram na França no século XVI apenas para deixá-la em seu caminho para o Império Otomano, o Magrebe ou Meca.) Mas tal história pode ser escrita para algumas cidades ou regiões francesas, particularmente no sul.

A história na França dos mouriscos, em particular dos aragoneses e dos andaluzes, expulsos da Espanha, se desenrola no curto intervalo entre 1610 e 1614, anos em que aparecem repetidamente nos documentos. A maioria deles teria deixado a França, ou sido expulso dela por sua vez, entre 1610 e 1611. Após a última data, eles são registrados esporadicamente até a década de 1630, talvez representando a ponta de um iceberg cujo tamanho agora não podemos calcular.

A localização geográfica deste grupo minoritário estaria concentrada ao sul de uma linha traçada de Bordeaux e seus arredores (Francisque Michel fala de vestígios de mouros ou mouriscos no departamento de Charente, entre Bordeaux e Angoulême32) até Cannes. Mas podem muito bem ter estado presentes em cidades ao norte da Dordonha (Paris, Rouen), ou ter vivido nessas zonas antes mesmo da Expulsão.

Os contatos Mouriscos com a França em busca de apoio para uma invasão militar na Espanha começaram em 1587 e continuaram até 1608. Nas palavras do Bispo Hardouin de Péréfixe de Rodez (nos Midi-Pirenéus), “Agora [os mouriscos] regressaram neste ano de 1608 para implorar [ao rei Henrique IV] que aceitasse suas propostas e ofertas de uma vez […]: ele fez com que eles entendessem muito claramente que sua posição como o Rei Mais Cristão não permitia que ele os defendesse enquanto a Paz de Vervins permanecia em vigor.”33 Este tratado, assinado em maio de 1598 entre Filipe II e Henrique IV, pôs fim à guerra entre a Espanha e a França e deixou a Holanda nas mãos de Isabel Clara Eugenia, filha de Filipe II e esposa do arquiduque Albert. O monarca francês foi obrigado a respeitá-lo, mas se os espanhóis não o respeitassem, il auroit juste sujet de les recevoir sous sa protection [ele teria justa causa para recebê-los (os mouriscos) sob sua proteção]. Os mouriscos acabaram apelando para o rei da Inglaterra, que se mostrou igualmente surdo aos seus pedidos.34

Sully, ministro de Henrique IV (1553-1610), resume em suas memórias36 as negociações que aconteceram entre os mouriscos e os protestantes franceses antes da ascensão de Henrique ao trono em 1589. Esse monarca planejava fazer aliados dos mouriscos, “aqueles inimigos internos, que devem ser levados em conta menos por causa de seu número do que por causa do ressentimento vivo que ainda sentiam em virtude de sua opressão.” Os mouriscos esperavam montar uma revolta geral, financiada inteiramente por eles mesmos, com ajuda militar francesa (eles pediram um general e oficiais para liderá-los); em troca, eles pediram asilo na França, prometendo se converter ao protestantismo:

Eles pareciam tão inclinados para a religião que se ofereceram para adotar a de nosso reino; não, na verdade, a religião romana, pois a tirania da Inquisição tornara aquela segunda servidão ainda mais insuportável para eles do que a primeira, mas a religião reformada. Eles descobriram que podiam se conformar facilmente com um culto que era livre de imagens e cerimônias (que eles consideravam idólatra), e em que quase o único objeto era um Deus, adorado e invocado igualmente por todos.37

Depois que as autoridades espanholas descobriram o complô, os mouriscos apelaram mais uma vez ao rei francês para solicitar, desta vez, que os aceitasse como seus súditos; mas, mais uma vez, eles não receberam nenhuma resposta positiva.38 Sully conclui falando sobre o número de mouriscos expulsos da Espanha, cerca de 500.000, segundo ele; em nota de rodapé, o editor das memórias (J.-F. Bastien, 1788) faz um interessante comentário sobre a posição de Henrique IV, dando a entender que os mesmos motivos que causaram sua expulsão impediram seu acolhimento.39

Luís Cardaillac coloca os primeiros contatos entre mouriscos e protestantes franceses em 1575, quando eles buscaram, necessariamente, aliados para uma invasão da Espanha. Ele também alude às conversões de mouriscos ao protestantismo, citando alguns julgamentos dos arquivos do tribunal da Inquisição em Toledo.40

Werner Thomas41 cita contatos semelhantes de 1574 em diante e oferece dados interessantes sobre casos isolados de proselitismo por protestantes bearneses em aldeias mouriscas em Aragão. Menciona as cidades de Letux e Lagata (na região do Campo de Belchite), onde o bearnês Juan de Secas se ofereceu como pregador para o caso de os luteranos invadirem a Espanha.42

Tanto Cardaillac e Werner sobre os mouriscos, e Victor Segesvary sobre a questão mais ampla das relações entre o Islã e a Reforma,43 enfatizam as áreas de concordância entre as duas crenças (rejeição de imagens, antipapismo, crítica dos sacramentos e dos abusos clericais, etc.), mas mesmo assim insistem que não houve aliança doutrinária e que os objetivos respectivos dos dois grupos continuaram a ser diferentes. Para os protestantes, a primeira prioridade era reformar a Igreja; para os Mouriscos, pressionar os argumentos protestantes a serviço de suas polêmicas anticristãs. Podemos falar de uma espécie de simpatia estratégica, mas no final Muhammad, como o Papa, ainda representou o Anticristo para os protestantes. Pode ter havido algumas conversões – não sabemos quantas – mas podemos adivinhar pela reação das autoridades religiosas protestantes que elas não acreditavam que as conversões dos Mouriscos fossem sinceras. Cardaillac oferece o exemplo do Sínodo de Vitré em 1617 (não 1677),44 que resolveu tomar medidas contra os abusos dos mouriscos e controlá-los melhor:

Todas as Igrejas são advertidas a prestar muita atenção nos mouros expulsos da Espanha que se mudam de Igreja em Igreja, para que não os recebam levianamente e possam atestar por eles somente após um exame atento de suas vidas e crenças: e aqueles que já foram recebidos e entraram na Igreja devem também ser examinados com cuidado, tanto sobre seu nível de instrução quanto e especialmente sobre sua conduta. E quando alguém testemunhar em seu favor ele deve mencionar seu batismo e a quantidade de filhos, especificando ainda se os filhos foram batizados e em qual idade. E tais certificados devem mencionar por quais sinais se pode saber se essas são as mesmas pessoas.45

Apesar de tudo, no estado atual da pesquisa, a conclusão de Cardaillac continua válida: a conversão de mouriscos ao protestantismo não foi mais do que um fenômeno secundário entre os eventos de seu êxodo.46

Outros documentos ilustram ainda mais esses contatos franceses com mouriscos e a possibilidade de uma aliança com eles contra a Espanha. Em 1602, os mouriscos de Segorbe47 enviaram uma petição ao rei Henrique IV em que propunham uma frente única de mouriscos espanhóis, judeus e luteranos que estavam dispostos a se revoltar: “e outros povos que estão na Espanha, alguns da Religião de Cristo e outros da Lei de Moisés, vão se aliar ao lado da França; são muitos, embora vivam escondidos; nós os conhecemos bem e nos consolamos uns aos outros…”48 Este plano pode explicar a recepção calorosa que os mouriscos receberam quando cruzaram a fronteira francesa entre janeiro e 15 de abril de 1610. Nesta última data, uma nova ordem mais severa foi expedida que anulou a anterior de 22 de fevereiro. Aquela tinha sido muito favorável aos mouriscos que professavam o catolicismo: foram autorizados a estabelecer-se ao norte dos rios Garonne e Dordogne (as autoridades tinham receio de os ter muito perto da fronteira espanhola), enquanto outros tiveram de abandonar o país através dos portos do Mediterrâneo. A citação de Ricote (ver acima) deve ter se referido a esse período de tempo, porque o decreto de 15 de abril proibia a entrada de mais mouriscos e deixava claro que ninguém poderia permanecer na França por mais sinceros que parecessem ser em seu cristianismo: “forçar os que estão lá a partir e cruzar para a Berbéria.”49 Mesmo antes da morte de Henrique IV em 14 de maio de 1610, a política em relação aos mouriscos havia mudado e as coisas não melhoraram com a regente Maria de Médici.

O Parlamento de Toulouse (junho de 1610), o Parlamento de Provença (dezembro de 1610) e as cidades de Bordéus (1611, 1612 e 1613) e Marselha tomariam medidas semelhantes para expulsar todos os mouriscos, em um ambiente que se tornara tenso pelo medo das epidemias e pelas dificuldades de abrigar tantos indivíduos (com a consequente mendicância, pilhagem, sinais manifestos da identidade muçulmana, etc.). Por exemplo, o Parlamento de Provença em 4 de dezembro de 1610 tomou medidas para banir os mouriscos que viviam na região porque “a grande maioria são maometanos, e tal raça de pessoas não deveria viver entre os cristãos”.50

Como explicar a mudança? Situação semelhante à do ano anterior, 1609, quando os mouriscos de Valência foram enviados a Oran: Mikel de Epalza chamou a esta operação, muito bem organizada no extremo peninsular, uma chapuza [caso fracassado].51 Osmin Ricau fala da “casualidade criminosa e falta de previsão do cardeal [sic] Lerma e do rei Filipe III ao lançar nas estradas essas multidões de infelizes fugitivos […] sem a menor consideração por seu destino em uma terra estrangeira, especialmente depois do choque de uma incursão tão numerosa que sobrecarregaria totalmente as capacidades de recepção e abastecimento das províncias invadidas.”52 Na ausência de qualquer acordo por parte das autoridades locais, que não haviam feito nenhum preparo, os empobrecidos habitantes berberes locais – que já estavam sofrendo com uma forte seca – agiram agressivamente com os recém-chegados.

Quando os mouriscos entraram na França, as autoridades espanholas foram igualmente descuidadas, mas as autoridades francesas permitiram a entrada no início porque foram pegos de surpresa (17.000 granadinos cruzaram a fronteira entre fevereiro e abril de 1610); eles fecharam a fronteira temporariamente em junho de 1610, exigindo que cerca de 14.000 mouriscos retornassem a Los Alfaques, e então a reabriram em setembro de 1610 para evitar consequências ainda piores.53 As populações locais reagiram mal pelos mesmos motivos que os nativos de Oran: seca , falta de comida para tantos exilados, sentimentos de insegurança (acompanhados de muitas reclamações sobre o comportamento dos granadinos), medo de epidemias e rejeição das práticas religiosas dos mouriscos.54

Fontes documentais contêm casos de abuso por parte de franceses comuns, por capitães de navios e marinheiros encarregados do transporte e por alguns funcionários como Pierre d’Augier, responsável pelo embarque dos mouriscos em Perpignan. Mas os mouriscos tinham a opção de denunciar esses abusos, de modo que uma série de processos foram iniciados e as autoridades francesas impuseram sanções severas, incluindo até a pena de morte, aos culpados.

Os historiadores franceses da época e do século XIX estimaram o número de mouriscos expulsos entre 400.00055 e um milhão; o Mercure François, por exemplo, falou de 900.000. Uma tradução do decreto de expulsão de 12 de janeiro de 1610 contra os mouriscos da Andaluzia, Castela e Múrcia, publicada em Paris pela imprensa de François du Carroy em 1611, traz na capa a cifra de mais de 900.000 expulsos.56 Vimos que Richelieu acreditou estar em cerca de 800.000. Para Francisque Michel eram um milhão, dos quais 15% ou cerca de 150.000 teriam passado pela França. E. Castelot estima o número em cerca de 500.000.57

Só com os estudos de Lapeyre, Cardaillac e Santoni é que se ofereceriam números mais realistas: segundo esses escritores, entre 50.000 e 60.000 mouriscos teriam atravessado a França, ou seja, entre 15% e 20% de todos os expulsos. Esses números se aproximam dos propostos por d’Augier,58 o oficial encarregado do embarque dos Mouriscos em Provença. Não podemos saber com certeza quantos ficaram na França: talvez os catalães – cerca de 3.000 -, algumas famílias sevilhanas ricas e o aventureiro ocasional.

O Granadino Ciumento, o Mourisco Travesti e o Camaleão

Porque, como vimos, a história dos mouriscos na França foi muito curta – uns 40 anos não contínuos, desde os primeiros contatos na década de 1580 até à década de 1630 – e deixou poucos vestígios no registo documental, podemos optar por seguir os passos de alguns indivíduos que tiveram destaque ou chamaram nossa atenção porque foram apontados em uma fonte particular.

Gregorio Marañón59 oferece uma lista de Mouriscos que permaneceram na França e que podem ter tido relevância socioeconômica: o rico Juan Burra, de Huesca, em Toulouse; Lope Alexandre e Baltasar Barbastro. Em Marselha ele afirma a presença de “cientos de ellos muy ricos” [centenas deles muito ricos], como Manuel Granada e Épila de Aragão, Alonso Muley e um certo Fierro de Lérida. Santoni cita outros mouriscos ricos que certamente ficaram na França, e tiveram um papel importante como intermediários entre as autoridades francesas e os Mouriscos que estavam cruzando a fronteira: Diego de Cárdenas e Jerónimo Enriquez em Marsellha.60

Gostaríamos de aqui destacar as histórias de três Mouriscos, dois dos quais possuem anedotas que merecem ser contadas, enquanto o terceiro é tão fascinante quanto um romance.

Charles d’Aigrefeuille dedica apenas alguns parágrafos de seu Hisoitre de Montpellier para tratar da passagem dos Mouriscos pelo Languedoc61, nos informando indiretamente da presença dos Mouriscos em Montpellier antes e depois de sua passagem e Expulsão. No Livro XVIII, Capítulo 1, ele conta a história de um jardineiro Mourisco de Granada que se refugiou em Lunel (cerca de 21km ao sudeste de Montpellier) e que teve um papel fundamental em um evento que incitou toda a região em 1614.

Esse jardineiro, que tinha 45 anos e vivia em uma pequena casa na vila, acolheu outro Mourisco de Granada que, ao passar juntamente com sua esposa e filho, pediu por abrigo. O anfitrião estava feliz em os hospedar, pois “desde o primeiro momento desenvolveu uma violenta paixão pela esposa de seu hóspede”. No decorrer da estadia a esposa rejeitou suas determinadas investidas em várias ocasiões, até que em sua frustração o jardineiro concebeu o cruel plano de eliminar o marido, “o único impedimento de seus desejos.” Convidando-o para o campo, ele o assassinou (“matou-o com golpes de faca e escondeu o melhor que pôde numa vala”). Na volta do anfitrião para casa, o filho o questionou sobre as manchas de sangue em sua camisa; nosso mourisco acabou confessando seu crime, mas ameaçou o filho com o mesmo destino se ele contasse a alguém sobre isso.

A esposa, preocupada com a ausência do marido, perguntou onde ele estava, no que nosso Mourisco respondeu que “ele foi para Montpellier ver os outros membros de sua nação”. O anfitrião continuou a assediar a esposa e, em face de sua rejeição contínua, confessou seu crime a ela; ele implorou que ela se casasse com ele e acabou se forçando sobre ela (“e de boa vontade ou pela força, ele a fez se submeter à sua paixão”). Então ele fez uma petição a um juiz em Lunel para deixá-lo se casar com ela, já que seu marido havia desaparecido. O juiz concordou, mas enquanto o casal se encaminhava para a igreja, apareceu um homem com as roupas do morto; quando perguntado como as conseguiu, ele afirmou que os comprou de alguns pastores que encontraram um cadáver nos campos. Testemunhas lembravam de ter visto essa mesma roupa no primeiro marido da mulher. No alarde que se seguiu, o juiz suspendeu o casamento e transferiu o caso para o tribunal criminal de Montpellier.

Detido e encarcerado, o anfitrião continuou a negar o seu crime até que, sob tortura, confessou e foi executado em abril de 1614 (“mas a dor do interrogatório a que foi submetido fez com que finalmente contasse a verdade: e foi condenado morrer sobre a roda na praça da Prefeitura, sendo a sentença cumprida no mês de abril de 1614 ”).

Este episódio, ao qual o autor dedica o mesmo número de páginas que à passagem dos mouriscos pela região, dá-nos indiretamente algumas informações interessantes sobre o destino do grupo na França. O ano de 1614 caiu após o decreto que obrigava os mouriscos a deixar o país e depois que as autoridades locais adotaram muitas medidas para expulsá-los (com algumas exceções para aqueles que professavam a fé cristã perante as autoridades da Igreja). No entanto, ainda havia mouriscos residindo em Montpellier e arredores: o texto diz sobre o marido assassinado que “ele tinha ido a Montpellier para ver outros membros de sua nação”. Nosso protagonista parece ter “professado” a fé católica, pois após obter a permissão do juiz se preparava para se casar na Igreja. Não sabemos quando ele chegou a Lunel, mas devia estar lá desde os primeiros anos da Expulsão: o texto fala dele como um exilado (“este homem, um refugiado em Lunel, cultivou um jardim lá”), e tudo que sabemos dele, é o que ele mesmo declarou em seu julgamento, que era “um homem de quarenta e cinco anos […] que tinha visto […] tantas coisas e experimentado muitas mudanças em sua sorte”. 63

O Mercure François64, um ancestral da nossa imprensa moderna e uma das principais fontes de informação contemporânea sobre os mouriscos na França, oferece outra história interessante que ilustra a sua presença ali mesmo antes da Expulsão.

Uma edição do Mercure de 1613 começa com uma série de histórias bizarras (sobre o gigante Teutoboco cujos ossos, “descobertos” por charlatões para perpetrar uma fraude, provaram ser fósseis não humanos; outro enganador que afirmava ser hermafrodita, mas foi desmascarado pela intervenção do famoso anatomista Jean Riolan, o Jovem). A publicação então relata que havia uma Mourisca hermafrodita de 25 anos vivendo em Paris com o nome de Marion Manuel.65 Em vista do escândalo público, esse mesmo Riolan e vários outros médicos da faculdade de medicina de Paris tentaram examinar ela, mas como ela resistiu, eles pediram às autoridades para intervir. Aprendemos com o interrogatório após sua prisão que ela viveu em Paris por dez anos (ou seja, desde 1603) como uma empregada: elle servoit deux Demoiselles logées ensemble [ela serviu a duas jovens damas que viviam juntas].

O exame médico deu um resultado sólido: Marion não só não era hermafrodita, mas apenas fingia ser mulher.66 Os médicos descobriram um membro incircunciso. Seu dono foi preso e obrigado a vestir uma roupa de homem et le garder tousiours sur peine de la vie [e usá-la sempre, sob pena de morte]. Não há referência se ele foi banido.

Além do fascínio mórbido desse tipo de anedota, devemos admitir que a história de um travesti Mourisco é interessante. Não sabemos, e talvez nunca saberemos, como e por que um jovem de quinze anos chegou a Paris antes dos decretos de Expulsão e viveu lá por dez anos disfarçado de mulher, numa época em que tal comportamento costumava acarretar a pena de morte. Mas temos aqui uma ilustração perfeita das diferentes estratégias que os Mouriscos adotaram para sobreviver.

Outro personagem de maior destaque, o mourisco aragonês Alfonso López,67 nos dá informações sólidas sobre as estratégias que desenvolveu em seu novo país, a França. Este indivíduo fascinante viveu dos séculos XVI ao XVII, de modo que podemos ver através das lentes de sua experiência os reinados de Filipe III e seu valido Lerma, Filipe IV e seu favorito, Olivares, a França de Henrique IV e seu ministro Concini, o de Luís XIII e Richelieu, e mesmo os primeiros anos do reinado de Luís XIV e Mazarin.

Nosso protagonista moveu-se em uma atmosfera de antagonismo político e militar entre a Espanha e a França, contra um pano de fundo de hispanofobia aguda durante seus primeiros anos na França durante o reinado de Henrique IV;68 sob Richelieu esse medo tornou-se mais discreto, senão menos hostil. A hispanofobia na França foi espelhada pela francofobia na Espanha. Essas tensões podem ser explicadas pela oposição de longa data da França aos Habsburgos e pela posição da Espanha como superpotência dominante na Europa. Por causa do poder militar, econômico e financeiro da Espanha, afirma Joseph Pérez, ela “às vezes é admirada; mais frequentemente é temida; é criticada; sua arrogância, seus excessos, seus crimes são denunciados. Por que a Espanha é censurada? Pela sua vontade de poder e pelo desejo de ditar a lei ao resto da Europa.”69 Esta imagem da Espanha surgiu de circunstâncias internacionais e não era verdadeiramente universal, já que o ódio pelo seu poder se juntava com atração cultural e uma certa admiração ambígua.70

Essa ambiguidade é refletida em uma obra de um médico converso [judeu convertido] e amigo do nosso Alfonso López, Dr. Carlos Garcia: La oposición y conjunción de los dos grandes luminares de la tierra. Obra apacible y curiosa en la cual se trata de la dichosa Alianza de Francia y España. Con la Antipathía entre Españoles y Franceses [A oposição e conjunção das duas grandes luzes da terra. Trabalho pacífico e curioso em que se trata da feliz Aliança da França e da Espanha. Com a Antipatia entre espanhóis e franceses] (Paris, 1617), melhor conhecida pelo título Antipatía entre españoles y franceses. Foi escrita para celebrar a iminente reconciliação das duas potências através do casamento do futuro Luís XIII com a infanta espanhola Ana da Áustria em 1615. Carlos García relembra em sua obra as razões históricas da discórdia e antipatia mútua entre as duas nações, e termina louvando a reaproximação que o casamento traria; no entanto, o texto foi empregado mais tarde como uma prova de que as duas nações eram irreconciliáveis. Para Pelorson, o testemunho de García foi a evidência mais direta e concreta da hispanofobia contínua sofrida pela comunidade hispano-portuguesa em Paris em 1617.71

Para compreender nosso Alfonso López nós devemos estar cientes da atmosfera de hostilidade e rejeição contra os Mouriscos na Espanha, e da xenofobia contra os Espanhóis na França. Outro elemento importante era o contexto das elites espanholas em Paris. Isso foi tanto político – no círculo ao redor do secretário de Filipe II, Antonio Pérez (1591-1611), um círculo que Alfonso López frequentava em Paris – quanto religioso: Paris possuía uma comunidade de conversos Espanhóis e Portugueses em que Alfonso López era próximo e mantinha contatos e até mesmo amigos. Ele também mantinha a companhia de alguns Mouriscos (seus empregos, por exemplo), cujos os historiadores não identificaram.

Todos esses grupos eram marcados pela ambiguidade em sua lealdade para a Espanha: alguns sentiam ressentimento e rancor de seu país natal, enquanto outros sonhavam em voltar um dia. Portanto seria mais preciso chama-los de anti-Habsburgos ao invés de anti-Espanhóis. Sua nostalgia pela Espanha os levaria a trabalhar como informantes ou espiões para ambos os lados, na esperança de um retorno futuro. John Elliott e Alain Hugon acreditam que Alfonso López foi um agente duplo72, muito embora até então nada em sua história nos permite confirmar isso. De qualquer forma, caso ele tenha sido um, seria somente com a aprovação de Richelieu, pois López era criação do Cardeal.

Existem alguns estudos dedicados a Alfonso López: o melhor documentado é ainda o de Henri Baraude, Lopez, agente financier et confidente de Richelieu.73 Julio Caro Baroja dedica um capítulo para ele com o título de “El último abencerraje.”74 Um artigo por Françoise Hildesheimer75 e outro por Sauzet76 completam o quadro. Uma boa quantidade de estudos dá a ele algumas linhas, ou na melhor das hipóteses, uma página ou duas;77 mas esses repetem, até mesmo reproduzem os mesmos erros, da obra de Henri Baraude e das fontes que ele se baseou (e.g., Tallemant des Réaux’s Historiettes,78 La Force’s Mémoires,79 e Richelieu).80

Muitas dessas obras fazem a questionável suposição de que López era um judeu ou um converso. O interessante estudo de Francisque Michel traz luz à origem dessa confusão: no Volume II de seu Histoire des races maudites de la France et de l’Espagne [História das Raças Amaldiçoadas da França e Espanha] o autor dedica várias páginas para a Expulsão dos Mouriscos e sua passagem pela França, e quatro páginas (81-85) para López, quem ele apresenta como Mourisco, mas acrescenta: “Em Paris, até mesmo pessoas acima da médio confundem o Maometanismo com Judaismo e tem López como judeu, muito embora ele fosse um Maometano. Não é irônico que Mouriscos venham da Espanha para serem tratados como Marranos? D’Aigrefeuille nos conta que esse rótulo permaneceu associado às famílias dessa raça [Mouriscos] que se estabeleceram em Languedoc.”81

Outro escritor, Jules Mathorez (1919), também dedica algumas páginas para López em seu Les étrangers em France sous l’Ancien Régime (Estrangeiros na França no Ancien Régime)82 e também o considera como Mourisco.

Mais recentemente, Pierre Santoni forneceu provas claras das origens mouriscas de López e o identifica especificamente como um aragonês da província de Saragoça.83 Gregorio Marañón pensava que era de Granada, mas esta opinião se baseia apenas na afirmação de nosso protagonista de ser descendente de a família dos Abencerrajes. A evidência documental disponível faz dele um aragonês nascido em 1572 ou 1582 que morreu em Paris em 21 de outubro de 1649 (portanto, com 67 ou 77 anos).

Ouvimos falar de Alfonso López pela primeira vez em 1602–1604: nesses anos, ele aparece em documentos do Duque de La Force, governador de Béarn,84 como negociador e intermediário entre as autoridades francesas e os mouriscos. Nesse ponto, ele entra para a história como o procureur / procurador [agente ou representante] dos mouriscos aragoneses que esperavam montar, com a ajuda francesa, uma rebelião interna na Espanha combinada com uma invasão do norte.85 Sua chegada à França, como no caso dos dois mouriscos que discutimos antes, precedeu o decreto de Expulsão da Espanha.

Nosso Mourisco aparece mais uma vez quando na locomoção de seu povo pelo sul da França, e podemos acompanha-lo até sua morte em Paris. Sua biografia ainda contém grandes lacunas entre a data de seu nascimento, 1572 ou 1582, e o momento em 1610 em que ele pode ser seguramente colocado em Toulouse: lá ele administrava os preparativos para o embarque dos mouriscos e defendia seus interesses contra abusos cometidos pela população local e algumas de suas autoridades. Não sabemos ao certo como ele veio a servir como representante dos mouriscos. Ele é chamado, de forma nada lisonjeira, de soy disant procurur [agente autoproclamado] em documentos publicados por Cardaillac do processo de López contra Pierre d’Augier, o oficial encarregado de embarcar os mouriscos em Perpignan: ele acusou o francês de roubar dinheiro dele e seus pupilos.86 Mas, de acordo com Francisque Michel, López foi escolhido para seu cargo (junto com outros dois homens, Pedro Bibero e Tristán Oscén) por ​​mouriscos notáveis.87 Santoni descreve, com base em documentos não publicados, o processo de nomeação de vários representantes dos Mouriscos.88

Esse foi o primeiro degrau da escada que o levaria ao estrelato e à fama: na época, sua legitimidade aos olhos das autoridades francesas residia apenas no fato de pertencer à comunidade mourisca, mas seu caminho até o cume distanciaria ele dessa comunidade. A sua ascensão não se deveu a ela – embora a utilizasse como trampolim – mas sim às estratégias que utilizou e, sobretudo, às relações que forjou com pessoas-chave que abririam as portas a Paris e à Corte. No decorrer da defesa dos interesses dos mouriscos contra d’Augier, ele conheceu o marquês de Rambouillet, o embaixador francês na Espanha (1618-1629), que o apresentou na corte e o fez ser conhecido pelo favorito do rei, Concini, e acima de tudo para a esposa de Concini, Leonora Galigai, que era confidente da rainha.

Em Paris ele se estabeleceu na Rue Saint-Honoré, no bairro mais animado da capital, local de intensa atividade artesanal, comercial e financeira e lar também de uma comunidade de convertidos que ele ficaria intimamente próximo.

López também aproveitou o casamento de Luís XIII com a infanta espanhola Ana da Áustria em 1615 como forma de entrar nos círculos hispanófilos da Corte. Paradoxalmente, o fato de ser espanhol (como é descrito nos documentos) abriria essas portas para ele. Integrante de um grupo expulso da Espanha por não ser considerado espanhol (ou seja, não católico), mas considerado espanhol e se apresentar como tal em uma França hispanofóbica, ele encontrou sua identidade de mourisco – rejeitado em seu próprio país – valorizada, com algumas limitações, em sua terra de exílio. Ali sua origem mourisca o colocava entre os inimigos da Espanha, fator fundamental em um momento em que ambas as potências lutavam pela hegemonia na Europa. Não devemos esquecer, porém, que os mouriscos só poderiam se estabelecer na França, mesmo que temporariamente, se fossem cristãos.89

Quanto às suas crenças religiosas – e apesar das especulações sobre o seu judaísmo – López, como muitos de seus compatriotas mouriscos, parece ter praticado um cristianismo exterior. Ele se gabava de comer porco com frequência; mas uma de nossas principais fontes sobre ele, Tallemant des Réaux (cujo pai era seu vizinho) nos diz que “quase morri de tanto rir, porque meu pai morava perto, ao vê-lo comer porco quase todos os dias. Ninguém o considerava um cristão melhor por causa disso.”90

Esta é uma das facetas mais interessantes da carreira espetacular desse homem, que acabou se tornando o conselheiro, confidente e espião de Richelieu e um dos homens mais ricos de Paris (dono de joias, ouro, obras de arte, móveis luxuosos, etc.). Richelieu até lhe confiou missões estratégicas, entre elas a compra de navios de guerra e armas na Holanda, e um relatório sobre a reconstrução do porto de Le Havre, cujo esboço geral foi seguido posteriormente por Colbert em 1671.91 Também o encontramos como o principal promotor para construir a cidade de Richelieu, entre Tours e Poitiers, um projeto que surgiu de um capricho do Cardeal a partir de 1631.92 Tudo isso mostra que nosso protagonista foi capaz, por meio de suas relações, mas também de seus próprios méritos, chegar ao topo da sociedade francesa do século XVII sob a proteção do todo-poderoso Richelieu.

Seria interessante analisar as estratégias que López e outros Mouriscos desenvolveram para integrar em uma sociedade que, como descendentes tanto de Mouros como de Espanhóis, eram duplamente estrangeiros. Entretanto, López viria a ter mais sucesso que a maioria: ele obteve a cidadania francesa em 1630-1631 e eventualmente ascendeu à nobreza.

Mercedes García-Arenal e Gerard Wiegers acreditam que López, que na França foi considerado um judeu espanhol ou um mourisco, é um bom exemplo dos dois grupos de exilados de sua terra natal. Sua carreira altamente incomum mostra como alguns descendentes de judeus e mouros habilmente trilharam um caminho de ambiguidade cultural.

Os três personagens Mouriscos que traçamos eram pessoas reais, mas suas vidas continham elementos da melhor ficção. Como observou Luce López-Baralt,93 O Ricote de Cervantes, embora imaginário, representou bem os mouriscos que entraram e saíram da Espanha antes, durante e depois da Expulsão: apoiados em redes de solidariedade que começamos a identificar, eles ilustram o drama Mourisco à sua própria maneira e representam exilados de todos os tempos e lugares que tiveram que criar novas vidas longe de suas casas. Alguns administraram por conta própria, enquanto outros tiraram proveito de uma variedade de redes criadas pela Expulsão. Valeria a pena explorar mais detalhadamente os seguintes tópicos: conversos de origem judaica que ajudaram mouriscos a levar suas propriedades em segredo para fora do país e para a França; redes mouriscas na França antes e depois da Expulsão;94 colaboração entre mouriscos e conversos95 e entre mouriscos e protestantes (alargando os caminhos traçados inicialmente por Cardaillac); e notáveis ​​indivíduos Mouriscos. Estas são as linhas de investigação que serão mais fecundas para a história dos mouriscos na França.

A história dos mouriscos espanhóis teve seu epílogo na Europa; na França, contos sobre o ciumento granadino, o travesti de Paris, e o fascinante camaleão Alfonso López.

NOTAS

[1] Luis F. Bernabé Pons, “Notas sobre la cohesión de la comunidad morisca más allá de su expulsión de España,” Al-Qanṭara 29–2 (2008), 307–332, esp. 7–8. Podemos ilustrar a preocupação das autoridades otomanas pelo destino dos mouriscos exilados com esta descrição de um embarque de mouriscos em Agde sob a supervisão de um embaixador otomano: “Todos esses mouriscos são naturalmente astutos, usando todos os tipos de fraudes, truques subversões: não confiam em estranhos e mostram pouca caridade uns com os outros. O Sieur d’Augier estava bem ciente disso em Agde, onde ocorreu o maior embarque. Hachy-Ybrahim Mutafaracca, o embaixador adjunto do Grande Turco na França, chegou lá no início de agosto para observar as condições em que os ditos mouriscos estavam sendo deportados; e tendo testemunhado o embarque de quatro mil deles, e sabido do bom tratamento que todos eles receberam dos oficiais de Sua Majestade, ele partiu para a Berbéria para dar ordens para que lá recebessem” (“Tous ces Morisques sont naturellement subtils, usans de toutes sortes de fraudes, de supercheries et trahisons: ils ne gardent point la foy aux estrangers, sont peu charitables entr’eux-mesmes: ce que le sieur d’Augier reconût assez à Agde où le plus grand embarquement s’est fait: et où au commencement du mois d’Aoust arriva HachyYbrahim Mutafaracca député Ambassadeur du grand Turc en France, pour apprendre l’estat de l’embarquement desdits Morisques, lequel ayant veu embarquer quatre mil d’iceux, et appris le bon traitement que tous en général avoient receu des commissaires de sa Majesté très chrestienne, il s’en alla en Barbarie donner ordre à les y faire recevoir”): in Pierre D’Avity, Les estats, empires, royaumes et principautez du monde (Geneve: J.A.&S. de Tournes), 1665, 145. See also Gerard Wiegers, who notes “the growing tendency in the Ottoman policies noticed by al-Hajarî in Paris: to consider them [the Moriscos] Ottoman subjects in need of and entitled to protection”: in “Managing Disaster: Networks of the Moriscos during the Process of the Expulsion from the Iberian Peninsula around 1609,” Journal of Medieval Religious Cultures 36–2 (2010), 151.

[2] “Le plus hardi et le plus barbare conseil dont l’histoire de tous les siècles précédens fasse mention”; “On fait compte de plus de huit cent mille de ces gens; de sorte que cette transmigration ne fut pas moindre que celle des Juifs hors d’Égypte; y ayant toutefois ces deux différences entre les deux, qu’en celle-là les hébreux contraignoirent les Egyptiens de les laisser aller, en celle-ci les Morisques sont contraints de sortir; en celle-là les Hébreux s’en vont d’une terre étrangère pour sacrifier à Dieu, et passer en une abondante qui leur étoit promise; en celle-ci les Morisques sortent de leur pays natal pour passer en une terre inconnue, où ils doivent vivre comme étrangers, non sans grand hasard d’abandonner le vrai culte de Dieu”; “[la France], qui est réputé[e] par tout le monde l’asile des afligés”: “Mémoires du Cardinal de Richelieu,” edited by M. Petitot in Collection des mémoires relatifs à l’Histoire de France, XXI (Paris: Foucault), 1823, 231–234: [231] “No entanto, antes que este ano [1610] acabe, não posso deixar de mencionar que ele produziu na Espanha o conselho mais precipitado e bárbaro que a história de todos os séculos anteriores registrou, um conselho que deu à França a oportunidade de dar provas de sua humanidade e sua piedade.”

“A Espanha estava cheia de mouriscos, que assim se chamavam porque descendiam de pai para filho dos mouros, que outrora a conquistaram e governaram durante setecentos anos.”

“Os maus tratos que receberam e o desprezo que sofreram dos Cristãos Velhos, fizeram com que muitos deles preservassem em segredo a impiedade e a falsa religião de seus ancestrais contra Deus, por causa do ódio particular que sentiam pelos homens. [232] Como foram tratados como escravos, eles buscaram os meios de obter sua liberdade; e por serem suspeitos disso todas as suas armas foram retiradas, especialmente nos Reinos de Granada e Valência, onde quase toda a população estava infectada com este veneno; eles não tinham permissão para carregar facas, a menos que estivessem cegas.”

“O Conselho [de Estado] da Espanha, tendo em mente que o falecido rei [Filipe II] há muito defendia a causa contra eles, temia ao mesmo tempo que essas pessoas aproveitassem a ocasião para acender a centelha da guerra civil no coração de seu país. Para impedir este plano – que não foi sem fundamento – o Rei católico emitiu, no início deste ano, a ordem de que todos eles, com suas esposas e filhos, partissem da Espanha no prazo de trinta dias; durante esse tempo, eles foram autorizados a vender todos os seus bens móveis e levar seu preço com eles, não em dinheiro, mas em bens permitidos, enquanto todos os seus bens seriam confiscados pelo rei e adicionados aos seus domínios. “

“Os que viviam perto do mar pegaram passagem para a Barbary e, para isso, foram apreendidos todos os navios estrangeiros que então estavam nos portos; o resto partiu para a fronteira com a França, para passar pelas terras do rei.”

“É impossível descrever a pena inspirada por estes pobres, despojados de todos os seus pertences, banidos da terra onde nasceram; os que eram cristãos, e não poucos em número, mereciam ainda maior compaixão por terem sido enviados, [233] como os outros, para a Bárbara, onde não podiam evitar o perigo de adotar a religião maometana contra sua vontade.”

“Você veria mulheres com uma criança no peito, um rosário nas mãos, dissolvidas em lágrimas e arrancando os cabelos de desespero por seu estado miserável, pedindo ajuda a Jesus Cristo e à Virgem, a quem estavam sendo obrigadas a abandonar.”

“O duque de Medina [Sidonia], almirante da costa andaluza, notificou o Conselho de Estado desta deplorável situação; mas foi ordenado de novo a não poupar idade, nem sexo, nem condição, as razões do Estado forçando-o a deportar os bons junto com os maus. O duque foi forçado a obedecer contra sua vontade, dizendo em voz alta que era fácil ordenar de longe uma medida que não poderia ser executada sem grande tristeza.”

“Podemos contar com mais de oitocentas mil dessas pessoas; de modo que essa transmigração não foi menor do que a dos judeus do Egito; havendo, porém, essas duas diferenças entre os dois, que no primeiro caso os hebreus forçaram os egípcios a deixá-los partir, enquanto no segundo os mouriscos foram forçados a partir; na primeira, os hebreus deixaram uma terra estrangeira para se sacrificar a Deus e chegaram na fértil que lhes fora prometida, enquanto na segunda os mouriscos deixaram a sua terra natal para passar para uma desconhecida onde teriam de vivam como estranhos e correm grande perigo de abandonar a verdadeira adoração a Deus.”

“O Rei Henrique [IV] o Grande, ao saber que muitos desses pobres percorriam as estradas de seu reino, que [234] é famoso em todo o mundo como um refúgio para os aflitos, movido de pena por seu sofrimento, emitiu um decreto exigindo que seus tenentes e oficiais os informassem, na fronteira, que aqueles que desejassem seguir a religião católica e declará-la perante o bispo de Bayonne seriam então autorizados a permanecer em seus estados deste lado dos rios Garonne e Dordogne; ali seriam recebidos se fizessem a profissão de fé perante o bispo da diocese em que desejavam residir.”

“Quanto aos que desejassem viver na seita de Muhammad, seriam fornecidos os navios necessários para levá-los à Berbéria.”

“A morte deste grande príncipe impediu que seu decreto fosse executado, mas a rainha se encarregou de ver isso realizado.” ” ([231] “Cependant avant que clore cette année [1610], je ne puis que je ne rapporte qu’elle produisit en Espagne le plus hardi et le plus barbare conseil dont l’histoire de tous les siècles précédens fasse mention; ce qui donna lieu à la France de rendre un témoignage de son humanité et de sa piété tout ensemble.

L’Espagne étoit remplie de Morisques, qui étoient ainsi appelés, parce que de père en fils ils descendoient des Mores, qui l’avoient autrefois subjuguée et commandée sept cents ans durant.

Le mauvais traitement qu’ils recevoient, et le mépris, et le mépris qu’ils souffroient des vieux chrétiens, firent que la plus grande part d’entre eux conservèrent secrètement l’impiété et fausse religion de leurs ancêtres contre Dieu, pour la haine particulière qu’ils avoient contre les hommes. [232] Étant traités comme esclaves, ils cherchent les moyens de se mettre en liberté; le soupçon qu’on en a, fait qu’on leur ôte toutes leurs armes, et particulièrement aux royaumes de Grenade et de Valence, où tout le peuple étoit presque infecté de ce venin; il ne leur étoit même pas permis de porter des couteaux, s’ils n’étoient épointés.

Le Conseil d’Espagne, considérant que le feu roi s’engageoit en une grande entreprise contre eux, eut en même temps appréhension que ces peuples prissent cette occasion d’allumer une guerre civile dans le cœur de leurs États. Pour prévenir ce dessein qui n’étoit pas sans fondement, le Roi Catholique fit, au commencement de cette année, un commandement à tous ces gens-là de sortir d’Espagne, avec leurs femmes et leurs enfans, dans trente jours pour tout délai, pendant lesquels il leur étoit permis de vendre tous les meubles, et en porter avec eux le prix, non en argent, mais en marchandises du pays non défendues, tous leurs immeubles demeurant confisqués au Roi et réunis à son domaine.

Ceux qui étoient près de la mer s’embarquèrent pour passer en Barbarie, et, pour ce sujet, tous les vaisseaux étrangers qui étoient dans leurs ports furent arrêtés; les autres prirent le chemin de la frontière de la France pour passer par les États du Roi.

Il est impossible de représenter la pitié que faisoit ce pauvre peuple, dépouillé de tous ses biens, banni du pays de sa naissance; ceux qui étoient chrétiens, qui n’étoient pas en petit nombre, étaient encore dignes d’une plus grande compassion, pour être envoyés, [233] comme les autres, en Barbarie, où ils ne pouvoient qu’être en péril évident de reprendre contre leur gré la religion mahométane.

On voyait les femmes avec leurs enfans à la mamelle, les chapelets en leur main, qui fondoient en larmes et s’arrachoient les cheveux de désespoir de leur misère, et appeler Jésus-Christ et la Vierge, qu’on les contraignoit d’abandonner, à leur aide.

Le duc de Medina, amiral de la côte d’Andalousie, donna avis au Conseil d’Espagne de cette déplorable désolation; mais il reçut un nouveau commandement de n’épargner âge, sexe, ni condition, la raison d’État contraignant à faire partir les bons avec les méchans; ce qui obligea le duc à obéir, contre son gré, disant hautement qu’il étoit bien aisé de commander de loin ce qu’il étoit impossible d’exécuter sans compassion extrême.

On fait compte de plus de huit cent mille de ces gens; de sorte que cette transmigration ne fut pas moindre que celle des Juifs hors d’Égypte; y ayant toutefois ces deux différences entre les deux, qu’en celle-là les hébreux contraignoirent les Egyptiens de les laisser aller, en celleci les Morisques sont contraints de sortir; en celle-là les Hébreux s’en vont d’une terre étrangère pour sacrifier à Dieu, et passer en une abondante qui leur étoit promise; en celle-ci les Morisques sortent de leur pays natal pour passer en une terre inconnue, où ils doivent vivre comme étrangers, non sans grand hasard d’abandonner le vrai culte de Dieu.

Le roi Henri-le-Grand, ayant avis que plusieurs de ces pauvres gens s’achemionoient en son royaume, qui [234] est réputé par tout le monde l’asile des affligés, touché de compassion de leur misère, fit publier une ordonnance qui obligeoit ses lieutenants et officiers à leur faire entendre, sur la frontière, que ceux qui voudroient vivre en la religion catholique, en faisant profession devant l’évêque de Bayonne, auroient ensuite permission de demeurer en ses États, au-deçà des rivières de Garonne et Dordogne, où ils seroient reçus faisant apparoître à l’évêque du diocèse où ils voudroient s’habituer, de l’acte de leur profession de foi.

Et quant aux autres qui voudroient vivre en la secte de Mahomet, on leur pourvoiroit de vaisseaux nécessaires pour les faire passer en Barbarie.

La mort de ce grand prince prévint l’exécution de son ordonnance, mais la reine la fit exécuter avec soin.”).

Ver também http://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k36420r.image.r=richelieu.fl29.langFR .pagination, 86–89.

[3] “Il faut remonter aux antiques révolutions de l’Orient, à ces nations vaincues qu’on traînait tout entières hors de leurs foyers, à la captivité de Babylone, pour trouver des spectacles semblables à celui que vit l’Europe du XVIIe siècle! La responsabilité de ce grand attentat contre l’humanité porte exclusivement sur le catholicisme espagnol; la papauté refusa de s’y associer. Si implacable envers les ennemis domestiques, envers les hérétiques, elle n’avait pas le même acharnement contre l’ennemi du dehors, contre l’islamisme. La cour d’Espagne ne put obtenir que Paul V visât la sentence de proscription de tout un peuple”: Henri Martin, Histoire de France depuis les temps reculés jusqu’en 1789, X (Paris: Furne), 1857, 560.

[4] “Salí, como digo, de nuestro pueblo, entré en Francia, y aunque allí nos hacían buen acogimiento, quise verlo todo. Pasé a Italia y llegué a Alemania […] [donde] cada uno vive como quiere porque en la mayor parte della se vive con libertad de conciencia”; “dar traza como traerlas a algún puerto de Francia, y desde allí llevarlas a Alemania”; “y lo que me tiene admirado es no saber por qué se fue mi mujer y mi hija antes a Berbería que a Francia, adonde podía vivir como cristiana”: Miguel de Cervantes, Don Quixote, trans. Edith Grossman (New York: HarperCollins), 2003, 813–814

[5] Philippe Berger, “Encore Cervantès et les morisques,” in Siglos dorados. Homenaje a Agustín Redondo, vol. I (Madrid: Castalia), 2004, 120.

[6] “¡Libertad de conciencia! De refilón, y como quien no quiere la cosa, el autor del Quijote pone el dedo en la llaga. Los despiertos centinelas del Santo Oficio eran todo oídos pero a buen relector sobran más palabras”: El País, 15 March 2009. See also Goytisolo’s review of Francisco Márquez Villanueva’s Moros, moriscos y turcos en Cervantes (Barcelona: Bellaterra), 2010, in “Cervantes y el mundo musulmán,” El País, 21 August 2010

[7] “Cuando Cervantes escribe sobre los moriscos españoles, que conoce tan de cerca, no suele estar lejos de la verdad histórica”: Luce López-Baralt, La literatura secreta de los últimos musulmanes de Espaǔa (Madrid: Trotta), 2009, 396.

[8] “Mantener que tendría aquí el sentido favorable que le atribuían los protestantes y le ha quedado hoy, supone por lo menos que no se haga caso de la alusión indudablemente crítica a la falta de delicadezas –o sea escrúpulos religiosos- en los alemanes, y, de todos modos, la evidencia de su significado peyorativo se impone por poco que no se olvide que Cervantes escribió para los súbditos del Rey Católico”: Roland Labarre, “Tres antiparadojas sobre Cervantes,” Criticón 54 (1992), 113–121, esp.118–119. See Luis F. Bernabé Pons, “Cervantes y el islam: una revisión historiográfica,” in Cervantes entre las dos orillas (Alicante: Universidad), 2006, 21–58, esp. 47–58.

[9] Ver Ignasi Fernández Terricabras, Felipe II y el clero secular. La aplicación del Concilio de Trento (Madrid: Sociedad Estatal para la Conmemoración de los Centenarios de Felipe II y Carlos V), 2000, 373–380 (on the application of this concept to the Spanish situation); Ronald Po-Chia Hsia, “Disciplina social y catolicismo en la Europa de los siglos XVI y XVII,” Manuscrits, 25 (2007), 29–43; Claire Gantet, “Le Saint-Empire,” in L’Europe en conflits. Les affrontements religieux et la genèse de l’Europe moderne vers 1500-vers 1650 (Rennes: Presses Universitaires), 2008, 61–78; Christophe Duhamelle, “La ‘confessionnalisation’ en Allemagne,” in Des religions dans la ville. Ressort et stratégies de coexistence dans l’Europe des XVIe–XVIIIe siècles (Rennes: Presses Universitaires, 2010), 201–206.

[10] Joseph Leclerc, Histoire de la tolérance au siècle de la Réforme (Paris: Aubier), 1955, I:257.

[11] Ibid., 282 and 296

[12] Wolfgang Kaiser, “Sans issue?,” in L’Europe en conflits, 427.

[13] Ibid., 428. David do Paço, “Coexister dans la diversité religieuse des villes de l’Europe moderne, XVe–XVIIIe siècle,” in Des religions dans la ville, op. cit., 14, descreve esta Europa dos séculos XVI a XVIII como “uma Europa tolerante, que é um lugar onde um tolerava o outro por falta de alternativa; onde um fazia o outro pagar por ser o que era, seja pela imposição de um imposto especial ou pela violência física ” (“une Europe tolérante, c’est-à-dire où l’on souffre l’autre, à défaut de pouvoir faire autrement, dans laquelle on fait payer à cet autre ce qu’il est, que ce soit par le biais d’un impôt spécial ou par celui d’une violence physique”), embora ele insista que é preciso ter em mente a diversidade de situações e contextos.

[14] Henri Lapeyre, Géographie de l’Espagne morisque (Paris: SEvpen), 1959, 100–103, 152–153, 159–162, 186–187, 251.

[15] Bonifacio de Echegaray, “Se establecieron los moriscos en el País Vasco de Francia?,” Bulletin Hispanique 47–1 (1945), 92–102.

[16] Louis Cardaillac, Le passage des Morisques en Languedoc (Montpellier: Université Paul Valéry), 1970; ibid., “À propos du passage des Morisques par le Languedoc. Réflexion sur l’expulsion,” in Questionnement des formes. Questionnement du sens (Montpellier: Éditions du ceRS – Université), 1997, 567–577.

[17] Osmin Ricau, “L’Expulsion des Morisques espagnols en 1610: ses conséquences dans le Midi français,” Pyrénées 103–104 (1975), 249–262 and 361–371.

[18] Robert Sauzet, “Alonso López, procureur des Morisques Aragonais et agent de Richelieu (1582–1649),” in Actes du II Congrès International Chrétiens et musulmans à l’epoque de la Renaissance (Zaghouan: Fondation Temimi), 1997, 213–219.

[19] Pierre Santoni, “Le passage des Morisques en Provence (1610–1613),” in Provence Historique 46–185 (1996), 366–367.

[20] Francisque Michel, Histoire des races maudites de la France et de l’Espagne (Paris: A. Frank), 1847

[21] Jules Mathorez, Les étrangers en France sous l’Ancien Régime (Paris: Champion), 1919.

[22] Online at http://mercurefrancois.ehess.fr/.

[23]

La Force, Mémoires authentiques de Jacques Nompar de Caumont, Duc de La Force, vol. I (Paris: Charpentier), 1843.

[24] D’Avity, Les estats, 145–148

[25] Antoine de Ruffi, Histoire de la ville de Marseille (Marseille: H. Martel), 1696, 454–455. [Online at http://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k1249419.r=ruffi.langFR]. Estas são as poucas linhas sobre a passagem dos mouriscos: “No mesmo ano [1610], dois navios flamengos tocaram nas ilhas ao largo de Marselha, carregados com mil granadinos, homens, mulheres e crianças; eles embarcaram em Sevilha por ordem do rei da Espanha, que os expulsou de seu reino. Um dos navios naufragou após o desembarque de seus passageiros. A maioria deles estava alojada em enfermarias antigas e, como alguns morriam todos os dias e temia-se que morressem de peste, decidiu-se mandá-los embora. Vários navios foram contratados para levá-los a Bône, Tabarka e outros portos do norte da África” (“En la même année [1610] deux vaisseaux flamans abordèrent aux isles de Marseille, chargés de mille Grenatins, tant hommes que femmes et enfans, ils s’embarquèrent à Séville par commandement du roi d’Espagne qui les avoit chassés de ses États un de ces vaisseaux fit naufrage après leur débarquement, ils furent logés la plûpart aux infirmeries vielles, et parce qu’il en mouroit tous les jours quelques-uns, et qu’on apréhendoit que cela ne causât la peste, on résolut de les congédier, on loua quelques navires qui les portèrent à Bonne, à Tabarque, et à d’autres ports de Barbarie”).

[26] V. Chausenque, Les Pyrénées ou voyage pédestre dans toutes les regions de ces montagnes, vol. I (Agen: Noubel), 1854, 72–73: “Ao atravessar os pântanos estéreis de Béarn e Guyenne, não se pode esquecer que em 1610 os mouros, expulsos da Espanha, pediram ao rei da França permissão para se estabelecer nessas regiões, mas não receberam nada além da mais impolítica das recusas. Sem portos ou posições fortificadas, eles não poderiam ter se tornado perigosos; e este miserável remanescente de um povo, ao mesmo tempo o mais ilustrado da Europa, que cavou canais, abriu estradas, dragou lagos, drenou pântanos, estabilizou dunas e transformou areia em campos férteis, teria garantido a fertilidade de uma vasta faixa de terra que hoje é praticamente um deserto. Nossa inimiga África acolheu este povo rejeitado, com sua coragem, seu capital e sua indústria” (“En parcourant les landes stériles du Béarn et de la Guienne, on ne peut oublier qu’en 1610 les Maures, chassés d’Espagne demandèrent au roi de France d’habiter ces landes et qu’ils n’éprouvèrent que le plus impolitique des refus. Sans ports, sans positions militaires ils n’eussent pu devenir dangereux; et ces malheureux débris d’un peuple, qui fut un temps le plus éclairé de l’Europe, en creusant des canaux, ouvrant des routes, évacuant les lacs, desséchants les marais, fixant les dunes, et changeant à la longue des sables en terres fertiles, eussent assuré la fertilité d’une vaste étendue de pays, qui est resté presque désert. Ainsi repoussé, l’Afrique ennemie les reçut avec leur courage, leurs capitaux et leur industrie”).

[27] V. Dubarat and P. Haristoy, Études historiques et religieuses du Diocèse de Bayonne (Pau: Vignancour), 1897, 520. On the Moriscos, this work offers only a document of 1610 that deals with their transit through the area: “Expulsion of the Moriscos of Spain (1610). In this same year the king of Spain emptied his kingdoms of Valencia and Aranoa [sic: Aragón?] of all the Moriscos, about seventy thousand households in number; they were to cross into France, some at one place, some at another, especially through Navarre under the direction of the Sieur de Gramont, governor of Bayonne; others through the Ossau or Aspa Valleys, both young and old. And the said young ones, just like the old, paid XV reials of passage apiece, the strong paying for the weak, beside several abusive hidden costs [?; estremis couvertes] which one and all render, together with the fees for tolls, border crossings and the foreigners’ tax [forana] that they are required to pay and change their coins with the money-changers of the present land of Béarn, even though the said Moriscos do not know or understand the rate of exchange. The Moriscos hold to the damnable Mohammedan sect and hope to go on to Algiers, where people live under that same Mohammedan error and sect.

“In the same year 1610 the king of Spain caused all the Moriscos to be expelled from his lands, and many troops of them passed through this Aspa Valley in the months of July, August and September, heading for Toulouse and Marseille” (“Expulsion des Morisques en Espagne [1610] Lo medix an, lo rey d’España fe boeytar sons rejaumes de Balentia et Aranoa totz los Moriscos en nombre de septante mille casadas ou envyron qui s’en passan en France, los ungs per ung quartier, los autres per autre, notament per Navarre, jus l’appuy deu sr de Gramont, gobernur de Bayona; autres per la bal d’Ossau et autres per aqueste val d’Aspa, los totz petitz et grans; et losd. petitz, comme los grans, pagan XV reyaus de passage chacun et lo fort per lo feble, oultre plusors estremis couvertes [?] que ungs et aultres los fen ransson, ensemps los dretz de peage, port et forana qui son constretz pagar et cambiar lors monedas aus mestes rendadors de las monedas deu present pays de Bearn, nonobstant que losd. Moriscos ignorassan tals cambys et cessassan entender tals cambys. Losd. Moriscos thienen la ley damnable : Mahomyca et aspiran se anar en Urgel ou Argel [Alger], ond viven en semblable secta et error Mahomica. “Lo medix an 1610, lo rey d’Espanha fe boeytar totz los Moriscos de sas terras et forssa troppas en passan per aqueste vallee d’Aspa aus mes de julhet, aoust et septembre, tyrantz a Tholose et à Marseille”): Arch. comm. de Borse, bb 1, f. 15v.

[28] L. André, ed., De Biarritz en Espagne. Aperçus pittoresques et historiques (Bayonne: L. André), 1864, 61–70.

[29] Charles d’Aigrefeuille, Histoire de la ville de Montpellier depuis son origine jusqu’à notre temps (Montpellier: C. Coulet), 1877, book XVII, 29–30; book XVIII, 38–39.

[30] Departmental archives online: http://www.guide-genealogie.com/guide/internet.html# archives

[31] Santoni, “Le passage,” 336.

[32] Michel, Histoire des races, II: 318.

[33] “Or estant revenus en cette année mil six cens huit pour le soliciter [Enrique IV] instamment d’accepter leurs propositions et leurs offres […]: il leur fit entendre nettement que la qualité de Roy Tres-Chrestien qu’il portoit, ne luy permettoit pas de prendre leur défense, tandis que la Paix de Vervin subsisteroit”: Péréfixe de Beaumont, Histoire du roy Henry le Grand (Amsterdam: Elzevier), 1661, 441–442.

[34] Proof of contacts between Moriscos and the English is found in Luis Cabrera de Córdoba, Relaciones de las cosas sucedidas en la corte de Espaǔa, desde 1599 hasta 1614 (Madrid: J. Martín Alegría), 1857, 240: [16 April 1605] “In Valencia many Moriscos have been imprisoned on account of certain letters sent by the King of England, found among the papers of the late queen [Elizabeth I]; these were written to him by Moriscos who asked for his help if they should rebel, promising that they would allow him to sack the city if he arrived with his fleet. Many of them have been tortured in an attempt to discover the truth of the affair, and some will be punished as an example to the rest” (“En Valencia se ha hecho prisión de muchos moriscos, y por ciertas cartas que el rey de Inglaterra ha enviado, las cuales se habían hallado entre los papeles de la reina pasada [Isabel I] que le habían escrito los moriscos pidiéndoles favor para levantarse, y que ellos daría orden de que pudiese saquear aquella ciudad, viniendo con su armada. Hase dado tormento a muchos de ellos para averiguar lo que pasaba en este negocio, y no dejaran de castigarse algunos para ejemplo de los demás”). There was also the probability of an alliance among Moriscos, Moroccans and English. See Julio Caro Baroja, Los moriscos del reino de Granada: ensayo de historia social (Madrid: Istmo), 1976, 224–225, and also Antonio Domínguez Ortiz and Bernard Vincent, Historia de los moriscos. Vida y tragedia de una minoría (Madrid: Alianza), 1997, 173–175.

[35] “Mais à dire le vray ceux qui vinrent par terre ne furent gueres mieux traittez par les François, que les autres l’avoient ésté par les Espagnols: car en traversant les Landes, ils furent presque tous dévalisez, et leurs femmes et filles violées; de sorte que trouvant si peu de seureté dans un païs où ils croyoient trouver du refuge, ils s’embarquèrent par la permission du Roy aux ports de Languedoc, et traversèrent en Afrique.” Péréfixe de Beaumont, 1661, 443.

[36] Maximilien de Béthune, duc de Sully (1559–1641), Mémoire de Sully, principal ministre de Henri-le-grand (Paris: J.-F. Bastien), 1788, IV: 519–525.

[37] “Ces ennemis domestiques, moins considérables encore par leur nombre, que par le vif ressentiment qu’on leur voyoit conserver de leur oppression”; “Ils paroissoient de si bonne composition sur la religion, qu’ils offroient d’embrasser celle du royaume; non pas, à la vérité, la religion Romaine, la tyrannie de l’inquisition leur avoit rendu cette seconde servitude encore plus insupportable que la première, mais la Religion réformée. Ils trouvoient qu’ils s’accommoderoient sans peine d’un culte dégagé des images et des cérémonies, qu’ils disoient sentir l’idolâtrie, et dont un seul Dieu également adoré et invoqué de tous, étoit presque l’unique objet”: Ibid., 520–521. In another work, Les œconomies royales (1610), Sully alludes to the possible conversion of the Moriscos to Protestantism and the compatibility between the two religions, claiming that the Moriscos “would rather be prepared to embrace the belief of the reformed Christians, in which they knew that only one God was worshipped, prayed to and invoked; that there were no images among them, so that no idolatry was committed, for that is what they detested the most; and in which very few ceremonies were observed of the type that they could not assent to” (“se disposeroient d’embrasser plustost la créance des chrétiens reformes (en laquelle ils sçavoient qu’un seul Dieu estoit adoré, prié et invoqué, qu’il n’y avoit point d’images parmy eux, ne s’y commettoit aucune idolatrie, qui estoit ce qu’il détestoient le plus, et ne s’y observoit que fort peu de cérémonies ausquelles ils ne se résolussent de s’accommoder”): in Collection des mémoires relatifs à l’histoire de France. Œconomies royales, t. VIII (Paris: Foucault), 1821, 328.

[38] Ibid., 523: “Determined to do anything to throw off the Spanish yoke, they asked him to accept them as his subjects on any conditions that he wished. But the same motives that prevented His Majesty from taking the side of the United Provinces openly (in a situation that affected him much more closely) did not allow him to declare himself the liberator of a people who were even more subject to Spain. Further, he would have had to follow them into very distant places, and they were demanding armed vessels: for the center of the revolt was near the coasts of Valencia, Murcia and Granada. And there were several other reasons based on the character of that people, without mentioning the ordinary aspects of any affair that distance always hides, or disguises in part. Because of all this, surely no one could blame His Majesty for not having responded more positively to the desires of the Moorish people” (“Détérminés à tout, pour secouer le joug espagnol, ils le prièrent de les prendre au nombre de ses sujets, à telles conditions qu’il voudroit. Mais les mêmes considérations qui empêchoient sa Majesté de prendre ouvertement le parti des Provinces-Unies dans un intérêt qui le touchoit de beaucoup plus près, lui défendoit aussi de se déclarer le libérateur d’un peuple encore plus particulièrement sujet de l’Espagne, et qu’il falloit de plus chercher dans des lieux fort éloignés, et qui demandoient un armement de mer; car le centre de la révolte étoit du côté de Valence de Murcie et de Grenade sans compter plusieurs autres raisons tirées du caractère de ces peuples, et sans parler des incidens si ordinaires dans les affaires, que l’éloignement cache toujours, ou déguise en partie. Tout cela fait qu’on ne sçauroit assurément blâmer sa Majesté de n’avoir pas mieux répondu aux désirs de la nation Maure”).

[39] Ibid., 525: “One might say that the same reason that caused the Moors to be cast out of Spain also prevented their being received in France. But it seems that it would have been easy to take advantage of their sad situation to make them do anything that one wished” (“On dira que la même raison qui faisoit chasser les Maures de l’Espagne empêchoit aussi qu’on ne les reçût en France. Mais il semble qu’il auroit été facile de profiter de la triste situation où ils se trouvoient, pour les amener à faire tout ce qu’on eût pu désirer d’eux”).

[40] “Morisques et protestants,” in Morisques et chrétiens. Un affrontement polémique (1492–1640) (Paris: Klincksieck), 1977, 140–142.

[41] Thomas Werner, “La complicidad entre protestantes, judíos y moros,” in La represión del protestantismo en Espaǔa, 1517–1648 (Leuven: University), 2001, 103–110. See also by the same author Los protestantes y la Inquisición en Espaǔa en tiempos de la Reforma y Contrarreforma (Leuven: University), 2001, 364–366.

[42] Werner, “La complicidad,” 106

[43] Victor Segesvary, L’islam et la Réforme. Étude sur l’attitude des réformateurs zurichois envers l’islam (1510–1550) (Lausanne: L’Age d’homme), 1977.

[44] Cardaillac, Morisques et chrétiens, 145. 1677 is a typographic error, since the last national synod of the Reformed Church took place in 1659. Moreover Cardaillac notes correctly on the following page that the minutes of synods held after 1617 make no reference to Moriscos.

[45] “Toutes les Eglises sont averties de prendre soigneusement garde sur les Maures chassés d’Espagne, et courans d’Eglise en Eglise, pour ne les recevoir pas trop légèrement, et on ne leur donnera aucune attestation qu’après un bon Examen de leur Vie et Croiance: et ceux qui sont déjà reçus et demeurent dans quelque Eglise, seront aussi soigneusement examinés, tant pour ce qui concerne leur instruction que sur toute leur conduite, et quand on leur donnera des témoignages, on y fera mention de leur ba[p]tême, et du Nombre de leurs enfans, en spécifiant aussi s’ils ont été ba[p]tisés, et à quel âge, et par quelles marques on pourra reconnoitre que ce sont les mêmes personnes, dont il sera fait mention dans lesdits certificats”: Aymon, Tous les synodes nationaux des Eglises réformées de France (Hague: Charles Delo), 1710, II: 96–97. [Online at www.gallica.fr].

[46] Cardaillac, Morisques et chrétiens, 146.

[47] La Force, Mémoires, I: 345

[48] “Et d’autres nations qu’il y a en Espagne, qui sont de la Religion du Christ et d’autres de la Loi de Moïse, se rangeront du parti de la France, et ceux-ci sont nombreux quoiqu’ils vivent fort cachés; nous les connoissons bien, et nous nous consolons les uns les autres…”: “Mémoire adressé à Henri IV par les Morisques d’Espagne,” in Henri Baraude, Lopez, agent financier et confident de Richelieu (Paris: Revue Mondiale), 1933, 183–188.

[49] “Pour ceux qui y sont de les faire sortir et passer en Barbarye”: Ricau, “L’Expulsion,” 259.

[50] “La plus grande partie sont maumétistes, que telle race de gens ne doivent habiter parmi les chrétiens”: Michel, Histoire des races, 86.

[51] Mikel de Epalza, “Los moriscos y sus descendientes, después de la expulsión (después del cuadro del desembarco en Orán),” in La expulsión de los moriscos (Valencia: Bancaja), 1998, 43–70.

[52] “[La] légèreté et imprévoyance criminelles du cardinal de Lerma et du roi Philippe III jetant sur les chemins des foules de malheureux fugitifs […] sans se préoccuper nullement de leur destin en pays étranger, surtout dans la surprise d’une irruption si nombreuse qu’elle allait dépasser grandment les capacités d’accueil et de nourriture des provinces envahies”: Ricau, “L’Expulsion,” 262.

[53] Cabrera, Relaciones, 410 (3 July 1610): “The Moriscos have begun to be removed from Aragón and given permission to travel overland to France; some 14,000 of them arrived at the border crossing at Canfranc, where they learned that the Queen of France had proclaimed that no Morisco would enter her realm, on pain of death; for they were in great need, and she did not want her kingdom overrun with beggars and paupers. This happened after some towns had already expended more than 40,000 ducados for permission to enter France, in addition to the tariffs they had paid on their belongings at the borders, and fees to the officers. Then they had to turn back to Los Alfaques to board ship for Barbary, which is a long journey; and on descending the mountains they began to take sick and die, and it was feared that with the heat of summer some plague would arise in the galleys and ships, if great haste were not made to embark them and take them away” (“Hánse comenzado á sacar los moriscos de Aragón, y darles permisión que puedan pasar por tierra á Francia, de los cuales han venido como 14,000 al puerto de Canfranc, donde supieron que la Reina de Francia había hecho pregonar que ningún morisco entrase en su reino, so pena de la vida, porque iban muy necesitados, y no quería dar lugar se hiciese su reino de mendigos y pobres, lo cual les sucedió después de haber pagado algunos lugares por la licencia para ir á Francia mas de 40,000 ducados, y lo que habían pagado de derechos en los puertos de lo que llevaban, y á los comisarios que los guiaban; y así habían de dar la vuelta á los Alfaques para embarcarse para Berbería, que hay buena travesía; y al bajar de la montaña comenzaban a enfermar y morir, y podía temerse con los grandes calores no se encendiese alguna peste en las galeras y navíos, sino se pone grande diligencia en embarcarlos y llevarlos”).

[54] D’Avity, Les estats, 146: “To hasten the passage of the said Moriscos to Barbary, on account of the complaint made by the inhabitants of Provence and Languedoc about the inconvenience of the Moriscos’ presence, and the danger of contagion through the poverty to which they were reduced (the hospitals of Marseille being full of them); Their Majesties, as I said, sent in response the Sieur d’Aymar, charging him with ridding those lands entirely of Moriscos and seeing that they were escorted and sent to Barbary; not allowing any harm or injury to be done to them, and making sure that everything be done to calm the natives of the said Provinces” (“Pour faire haster le passage desdits Morisques en Barbarie, à cause de la plainte que faisoient les habitans de Provence, et du Languedoc, touchans l’incommodité du séjour desdits Morisques, et le danger de contagion par la misère où estoient réduits plusieurs d’iceux Morisques, dont les Hospitaux de Marseille estoient remplis: leurs Majestez, dis-je, envoyèrent le sieur d’Aymar des requestes, avec commission de délivrer entièrement lesdits païs de tant de Morisques et les faire conduire et passer en Barbarie, sans qu’il leur fust faict aucun tort ny iniure, et regarder à ce que le tout se fist au repos des habitans desdites Provinces”).

[55] Fernand Mourret, Histoire générale de l’Église. L’ancien régime (XVIIe et XVIIIe siècles) (Paris: Bloud et Gay), 1928–1933, 73.

[56] Edict du Roy d’Espagne sur l’expulsion et bannissement de plus de neuf cens mille personnes Morisques de son Royaume, qui machinoient de mettre l’Espagne entre les mains et en la puissance des Turcs et Sarrazins (Paris: F. du Carroy), 1611.

[57] E. Castelot, “L’expulsion des morisques d’Espagne,” Journal des économistes 7–4 (1904), 17.

[58] Santoni, “Le passage,” 355–356. Francisque Michel, describing the Morisco Alfonso López’s suit against d’Augier, writes that “he also produced certificates showing that he had conveyed and caused to be conveyed 60,000 Moriscos in safety across Languedoc, and that he had seen them embarked at the port of Agde with great care and foresight and carried to Barbary, with their belongings and in total safety” (“il produit aussi quelques certificats portant qu’il avait conduit et fait conduire en sûreté à travers le Languedoc, soixante mille Morisques, qu’il les avait fait débarquer au port d’Agde avec beaucoup de soin et de prévoyance et transporter en Barbarie, avec leurs biens, en toute sûreté”): Michel, Histoire des races, 84.

[59] Gregorio Marañón, Expulsión y diáspora de los moriscos espaǔoles (Madrid: Santillana, Fundación Gregorio Marañón), 2004, 79–80.

[60] Santoni, “Le passage,” 365–368

[61] Charles d’Aigrefeuille, Histoire de la ville de Montpellier depuis son origine jusqu’à notre temps [1737], (Montpellier: C. Coulet), 1875–1882, 38–39; 29–30 relate the passage of the Moriscos

[62] “Il conçut dès lors une violente passion pour la femme de son hôte”; “le seul obstacle à ses désirs”; “il le tüe à coups de couteau et le cache le mieux qu’il peut dans une fosse”; “il étoit allé à Montpellier voir quelques-uns de sa nation”; “et de gré ou de force il la fit consentir à sa passion”; mais les douleurs de la question, où il fut appliqué l’obligèrent enfin d’avoüer la vérité; et il fut condamné à mourir sur une rouë, dans la place de l’Hôtel-de-Ville: ce qui fut exécuté au mois d’avril 1614.”

[63] “Cet homme, réfugié à Lunel, y cultivoit un jardin”; “un homme de quarante-cinq ans […] qui avoit vû […] tant de choses e éprouvé l’une et l’autre fortune.”

[64] Jean Richer, ed., Le Mercure François (Paris: J. Richer) 1613, 1613 III: 274.

[65] Ibid., 274: “There was a Morisca aged twenty-five years, with well-formed [traits of] both sexes, which she employed; she used to go about Paris dressed as a girl, recognized by everyone as a Hermaphrodite, and little children would point at her and call her by that name.”

[66] Mercure François, III:275: “but the wily ‘Morisca,’ using his craft, withdrew his testicles into his groin and hid them together with his penis behind crossed hands: and with his fingers (the thumb and index finger of each hand) made his scrotum into the form of a vulva or cleft…” (“mais la moresque rusée, usant de son artifice, retira ses testicules dans les aines, et les cachoit avec sa verge dans le creux de ses mains: et de ses doigts, [qui sont le poulçe et l’indicatif de chaque main] figuroit ses bourçes en façon de vulve, ou fente….” The doctors discovered the trick, and “perceived his virile member, which was of a thickness and length corresponding to his age, while his hanging testicles were the size of hen’s eggs” (“apperçeurent son membre viril prominent avec une grosseur et longueur competente à l’aage, et ses testicules pendants gros comme des œufs de poulle”).

[67] See Youssef El Alaoui and Luis F. Bernabé Pons, “Sur les traces d’Alfonso Lopez, créature morisque de Richelieu,” in L’expulsion des Morisques. Quand? Pourquoi? Comment?, international congress organized by Bernard Vincent (eHESS), 2–3 July 2009, Colegio de España, Paris [in press].

[68] A fine example is a work by Antoine Arnaud (1560–1619), Coppie de l’Anti-espagnol, faict à Paris. Deffendu par les rebelles de Sa Maiesté par Ant. Arnauld (Lyon: P. Ferdelat), 1594, 12–14: after attacking the cruelty of Spanish bouchers [butchers] in the Indies, he predicts that the French will never let themselves be ruled by these Maranes [swine], i.e., Marranos), half Moors and half Jews: “What, are these Swine to be our Kings, our Princes? Shall a French gentleman bow the knee by a Spaniard’s command? Shall France be caught in the snares of this King of Majorca, this half-Moor, half-Jew, half-Sarracen? […] Oh, rather let the earth split open, let the sea overflow its bounds, we shall die without being able to command otherwise […]” (“Quoy? que ces Maranes soyent noz Roys! noz Princes! que le Gentil-homme François fléchisse souz le commandement Espagnol? que la France soit adioustée entre les filtres de ce Roy de Maiorque, de ce demi More, demi Juif, demi Sarrazin? […] O que plustost la terre s’ouvre, que la mer rompe ses rempars, nous mourrons sans y pouvoir donner ordre […]”).

[69] “On admire parfois l’Espagne; plus souvent on la craint; on la critique; on dénonce son arrogance, ses excès, ses crimes. Que reproche-t-on à l’Espagne? Sa volonté de puissance et sa prétention à dicter la loi à l’Europe”: Joseph Pérez, “Les rapports culturels entre la France et l’Espagne (XVI–XVII siècle),” in Les Monarchies française et espagnole du milieu du XVIe siècle à 1714 (Paris: Editions du Temps), 2000, 314. See “Francophobie et hispanophobie” in Alain Hugon, Au service du roi catholique. “Honorables ambassadeurs” et “divins espions.” Représentation diplomatique et service secret dans les relations hispano-françaises de 1598 à 1635 (Madrid: Casa de Velázquez), 2004, 54–63.

[70] Henry Méchoulan, “L’Espagne dans le miroir des textes français,” in L’État baroque. Regards sur la pensée politique de la France du premier XVIIe siècle (Paris: Vrin), 1985, 424ff. For examples of Francophobia in Spanish texts see Asensio Gutiérrez, La France et les Français dans la littérature espagnole. Un aspect de la xénophobie en Espagne (1598–1665)
(Saint-Etienne: Université), 1977: Chapter 2 deals with relations between Spaniards and French immigrants, and with the negative image of the latter in Spain (“Activité des Français en Espagne,” 45–92).

[71] Jean-Marc Pelorson, “Le docteur Carlos García et la colonie hispano-portugaise de Paris (1613–1619),” Bulletin Hispanique 71 (1969), 518–574.

[72] John Elliott, Richelieu and Olivares (Cambridge: Cambridge University Press, 1991), 116, 145, Hugon, Au service, 193, 375.

[73] Baraude, Lopez.

[74] Caro Baroja, Vidas poco paralelas (con perdón de Plutarco) (Madrid: Turner), 1981, 51–68

[75] Françoise Hildesheimer “Une créature de Richelieu: Alphonse Lopez, le Seigneur Hebreo” in Les juifs au regard de l’Histoire (Paris: Picard), 1985, 293–299.

[76] Robert Sauzet “Alonso Lopez, procureur des Morisques Aragonais et agent de Richelieu (1582–1649),” in Actes du II Congrès International Chrétiens et musulmans à l’époque de la Renaissance (Zaghouan: Fondation Temimi), 1997, 213–219.

[77] Por exemplo a obra póstuma de Marañón, Expulsión y diáspora, 85–88; Mercedes García-Arenal and Gerard Wiegers, Entre el Islam y el Occidente: Vida de Samuel Pallache, judío de Fez (Madrid: Siglo XXI), 1999, 158–161 [English translation: A Man of Three Worlds: Samuel Pallache, a Moroccan Jew in Catholic and Protestant Europe (Baltimore: Johns Hopkins), 2003, 116–119]; and Pelorson, “Le docteur.”

[78] Tallemant des Réaux, Les historiettes de Tallemant Des Réaux: mémoires pour servir à l’histoire du XVIIe siècle (Paris: A. Levavasseur), 1834–1835, II: 38–40.

[79] La Force, Mémoires, vol. I.

[80] Martial Avenel (ed.), Documents inédits sur l’histoire de France. Lettres, instructions diplomatiques et papiers d’État du Cardinal de Richelieu (Paris: Imprimerie Impériale), 1853–1874.

[81] “À Paris même des gens d’un rang au-dessus du vulgaire confondaient le mahométisme avec le judaïsme, voulant faire passer Lopez pour un juif, lui qui était mahométan. Et puis ne suffisait-il pas que les Morisques vinssent d’Espagne pour être traités de Marranes? D’Aigrefeuillle nous apprend que cette désignation reste définitivement aux familles issues de cette race qui s’établirent en Languedoc”: Michel, Histoire des races, II: 94–95.

[82] Jules Mathorez, Les étrangers en France sous l’Ancien Régime (Paris: Champion), 1919, I: 168–171.

[83] Santoni, “Le passage,” 366–367.

[84] La Force, Mémoires, I: 379–380.

[85] “Mémoire adressé à Henri IV par les Morisques d’Espagne,” in Baraude, Lopez, 183–188.

[86] “Summary of the suit pending before the King’s Privy Council between Jean d’Augier […]. Against Alonce Loppe [sic], who calls himself the agent for the Moriscos of the land of Aragón […]” (“Sommaire du procès pendant au privé conseil du Roy entre Jean d’Augier […]. Contre Alonce Loppe soy disant procureur des Morisques au pays d’Aragon […]”), in Baraude, Lopez, 196.

[87] Michel, Histoire des races, 81.

[88] Santoni, “Le passage,” 365–367.

[89] Michel, Histoire des races, 92–94; Santoni, “Le passage,” 371–376; ibid., “Les tournées de François de Beaumont pour l’expulsion des morisques de Provence (janvier-mars 1611),” Cahiers de la Méditerranée 79 (2009), 280–281.

[90] “Je me crevois de rire, car mon père étoit son voisin, de le voir manger du pourceaux quasi tous les jours. On ne l’en croyoit pas meilleur chrétien pour cela”: Tallemant, Les historiettes, 46

[91] Philippe Barrey, “Les débuts de la grande industrie havraise,” in Recueil des publications de la Société Havraise d’Études Diverses A83 (1916), 34–35.

[92] Baraude, Lopez, 108; P. Raveau, “Un détail inédit de la construction de la ville de Richelieu,” Bulletin de la Société des Antiquaires de l’Ouest, 3 s., t.V (1919), 260–273.

[93] López-Baralt, La literatura, 395–397

[94] López-Baralt, La literatura, 395–442, analyzes secret routes taken both out of and back into Spain by sixteenth-century Moriscos: toward Tunis and Turkey, passing through France and Italy. Her study completes Chapter 2 of Cardaillac’s thesis Le passage des Morisques en Languedoc (Montpellier: Université Paul Valéry), 1970, 10–14.

[95] Luis F. Bernabé Pons, “Notas sobre la cohesión de la comunidad morisca más allá de su expulsión de España,” Al-Qanṭara 29–2 (2008), 307–332, esp. 314–326 on France. O autor e seu coautor Jorge Gil Herrera expandem essas observações em sua contribuição para o presente volume, uma peça que explora a existência de redes de apoio de mouriscos e conversos no sul da França antes da Expulsão; isso ajudava no trânsito dos exilados até seus destinos finais no Magrebe. É um dos capítulos mais interessantes da história dos mouriscos na França, entre suas respectivas expulsões da Espanha em 1609 e da França em 1610.

Fonte: Brill. HAL