Uma Biografia Ilustrada do Profeta Muhammad (Maomé)
07/10/2020Obs: O artigo a seguir retrata um resumo da vida do Profeta Muhammad de um ponto de vista histórico-político, suprimindo detalhes religiosos que deixariam o material muito extenso, porém, mais espiritual. Para quem deseja fazer uma análise mais detalhada, recomendamos que acesse a bibliografia presente no final do texto, bem como narrativas islâmicas de cunho mais espiritual-religioso.
Infância e adolescência de Muhammad
Muhammad Ibn Abdullah ou, como conhecido no mundo lusófono, Maomé, o Profeta do Islã, nasceu no ano de 570 no mês de Rabi al-Awwal, terceiro mês do calendário lunar. Ele pertencia ao clã dos Banu Hashim, parte da tribo de Quraysh, e nasceu em uma família árabe que possuía uma das linhagens mais nobres de Meca.
No ano de seu nascimento, houve uma tentativa fracassada de destruição de Meca comandada pelo rei cristão etíope do Iêmen, Abraha. Segundo a tradição, o ano ficou conhecido como Ano do Elefante, pois o exército invasor teria sido equipado com estes animais.
A vida do Profeta Muhammad é tradicionalmente definida em dois períodos: pré-hijra (emigração) em Meca, de 570 a 622, e pós-hijra em Medina, de 622 até 632.
O pai de Muhammad, Abdullah, morreu quase seis meses antes dele nascer, deixando sua esposa, Amina, sem muitos recursos. De acordo com a tradição islâmica, logo após o nascimento ele foi enviado para viver com uma família beduína no deserto.
Na época, acreditava-se que a vida isolada no deserto era mais saudável para bebês, propiciando um melhor ambiente para a aprendizagem do idioma árabe puro. Muhammad viveu com sua mãe adotiva, Halimah bint Abi Dhuayb, e seu marido até os dois anos de idade.
Aos seis anos, ele perdeu sua mãe biológica, Amina, e foi enviado para ficar sob a guarda de seu avô paterno, Abdul-Muttalib, do clã dos Banu Hashim, até sua morte, dois anos depois. Após a morte do avô, ele ficou sob os cuidados de seu tio Abu Talib, o novo líder dos Banu Hashim, a quem seria muito ligado ao longo de sua vida.
Em sua adolescência, Muhammad acompanhava seu tio Abu Talib em caravanas que iam à Síria para comercializar. A tradição islâmica afirma que quando tinha nove ou doze anos, enquanto acompanhava a caravana dos habitantes de Meca ao Levante, ele e seu tio encontraram um monge cristão chamado Bahira que identificou o menino como profeta.
Poucas narrações falam da juventude do profeta, mas devido ao seu caráter excepcional, ele adquiriu o apelido de “al-Amin”, que significa “fiel/ confiável”, dentre os seus conterrâneos, e era procurado para resolver disputas como um árbitro imparcial.
Vida adulta de Muhammad
Sua reputação atraiu uma proposta de casamento, em 595, de Khadijah, uma viúva de 40 anos que procurava alguém que cuidasse de seus negócios. Muhammad, por volta de seus 25 anos, consentiu com o casamento, que, segundo todos os relatos, foi feliz. O casal teve seis filhos.
No ano de 605, a Pedra Negra, um objeto sagrado, foi removida durante as reformas no santuário da Caaba em Meca. Os líderes dos clãs da cidade não conseguiam concordar sobre qual clã teria a honra de colocá-la no seu lugar.
Eles decidiram que iriam perguntar ao próximo homem que passasse pelo portão do santuário para tomar essa decisão e, por vias do destino, o escolhido foi Muhammad, de 35 anos de idade. Para solucionar a contenda, ele pediu um pano e colocou a Pedra Negra em seu centro.
Os líderes dos clãs seguraram as bordas do pano e juntos carregaram a Pedra Negra para seu lugar no santuário, onde Muhammad a ergueu e a posicionou, satisfazendo a honra de todos.
Sua aparência
De acordo com as descrições detalhadas nos hadiths, narrações descritivas dos ditos e atos do Profeta, Muhammad era de tamanho médio, pele clara, e possuía um rosto circular e cabelos que lhe chegavam até os lóbulos das orelhas. Seus olhos eram grandes e negros, seus cílios eram longos, as sobrancelhas extensas e finas e possuía uma veia em sua testa que saltava quando se zangava.
O seu rosto era complementado por um nariz aquilino e uma barba cheia e bem cuidada. O seu porte físico era robusto e firme, não era gordo nem magro, mas proporcional. Tinha o peitoral e ombros largos e, quando andava, o seu caminhar aparentava como se tivesse descido uma declividade com elegância.
O início do Islã
Muhammad não era aderente ao paganismo idólatra predominante em Meca, e costumava meditar sozinho em uma gruta chamada Hira, no Monte Jabal al-Nour, por várias semanas, todos os anos.
A tradição islâmica sustenta que durante uma de suas visitas àquela caverna, no ano de 610, o anjo Gabriel lhe apareceu de forma inesperada e ordenou que recitasse os primeiros versos das revelações que, mais tarde, seriam conhecidas como Alcorão.
Muhammad ficou profundamente angustiado ao receber suas primeiras revelações. Depois de voltar para casa, ele foi consolado e tranquilizado por Khadijah e seu primo cristão nestoriano, Waraka ibn Nawfal.
A revelação inicial foi seguida por uma pausa de três anos, um período conhecido como fatra, durante o qual Muhammad se sentiu deprimido e se entregou a orações e práticas espirituais. Quando as revelações começaram, ele foi tranquilizado e ordenado a começar a pregar a Mensagem.
De acordo com a tradição islâmica, sua esposa Khadija foi a primeira a acreditar que ele era um profeta. Ela foi seguida pelo primo de dez anos de Muhammad, Ali ibn Abi Talib, seu amigo íntimo Abu Bakr e filho adotivo Zaid.
Por volta de 613, Muhammad começou a tornar suas pregações públicas. A maioria dos habitantes de Meca ignoraram e zombaram dele, embora alguns poucos se tornassem seus seguidores. Haviam três grupos principais de primeiros convertidos ao Islã: mulheres, escravos e membros de tribos sem status ou importância política, pessoas consideradas excluídas da sociedade.
A oposição em Meca passou a se intensificar quando Muhammad proferiu versos do Alcorão, que na época era uma tradição oral ainda não reunida em livro, que condenavam a adoração de ídolos e o politeísmo.
À medida que seus seguidores cresciam, ainda que fosse um movimento completamente pacífico, Muhammad começou a ser visto como uma ameaça pelas tribos locais e pelos governantes da cidade, cuja riqueza repousava sobre a peregrinação à Caaba, o ponto central da vida religiosa do paganismo na Arábia.
Mercadores poderosos tentaram convencer Muhammad a abandonar sua pregação. Foi-lhe oferecido a admissão ao círculo interno de comerciantes poderosos, bem como um casamento vantajoso. Ele recusou ambas as ofertas.
A tradição registra que a perseguição e os maus-tratos em relação a Muhammad e seus seguidores foi longa. Sumayyah bint Khayyat, escrava de um proeminente líder de Meca, Abu Jahl, é famosa como o primeiro mártir do Islã. Ela foi morta com uma lança pelo seu mestre depois de se recusar a desistir de sua fé.
Bilal, outro escravo muçulmano, foi torturado por Umayyah ibn Khalaf, que colocou uma pedra pesada em seu peito para forçar sua conversão. Em 615, alguns dos seguidores do Profeta emigraram para o reino etíope de Aksum e fundaram uma pequena colônia sob a proteção do imperador cristão etíope, Aṣḥama ibn Abjar.
O boicote aos muçulmanos
Em 617, os líderes dos Banu Makhzum e Banu Abd-Shams, dois importantes clãs da tribo Quraysh, declararam um boicote público contra o clã dos Banu Hashim, buscando pressioná-los a retirar sua proteção a Muhammad.
O boicote durou três anos, levando o Profeta, sua família e seguidores a viverem num gueto desértico, ao redor de Meca, com pouquíssimos recursos e em grande dificuldade. Porém, o boicote acabou entrando em colapso, já que seu objetivo nunca foi atingido.
Durante esse tempo, Muhammad só foi capaz de pregar durante os meses sagrados de peregrinação, em que todas as hostilidades entre árabes eram suspensas. A esposa de Muhammad, Khadijah e seu tio, Abu Talib, morreram em 619, ano que ficou conhecido como o “Ano da Tristeza”.
Com a morte de Abu Talib, a liderança do clã dos Banu Hashim passou para Abu Lahab, outro tio, porém, grande inimigo do Profeta. Logo depois de assumir a liderança do clã, Abu Lahab retirou a proteção sobre Muhammad. Isso colocou-o em perigo. A retirada da proteção do clã implicava que a vingança de sangue por sua morte não seria exigida.
Muhammad então visitou Taif, outra importante cidade da Arábia, e tentou encontrar um protetor e local para que pudesse garantir a liberdade religiosa de sua comunidade. Porém, seu esforço fracassou e ainda o colocou em perigo físico, pois nela foi apedrejado por seus habitantes até seus sapatos ficarem encharcados de sangue.
Ele foi forçado a retornar a Meca. Um homem de Meca, chamado Mut’im ibn Adi, e a proteção da tribo de Banu Nawfal, possibilitou que ele voltasse a entrar com segurança em sua cidade natal.
A Jornada Milagrosa
A tradição islâmica afirma que, em 620, Muhammad experimentou o Isra e Miaraj, uma jornada milagrosa que teria ocorrido com o anjo Gabriel. No início da jornada, o Isra, ele teria viajado de Meca em uma criatura conhecida como al-Buraq para Jerusalém.
Mais tarde, durante o Mi’raj, Muhammad teria percorrido o céu e o inferno e falado com profetas anteriores, como Abraão, Moisés e Jesus, bem como com o próprio Deus (Allah). Foi neste evento milagroso que o Profeta recebeu as ordens para as cinco orações diárias, praticadas por muçulmanos até os dias de hoje.
Aliança com habitantes de Yathrib
Em Meca, na temporada de peregrinação de 620, o Profeta Muhammad encontrou seis homens dos Banu Khazraj da cidade de Yathrib, 454 quilômetros de distância de Meca, e apresentou-lhes as doutrinas do Islã. Convencidos por elas, os seis abraçaram a religião e na Peregrinação de 621, trouxeram outros homens com eles.
Esses novos muçulmanos informaram Muhammad que havia um movimento de desenvolvimento gradual do Islã em sua cidade, e assumiram uma promessa formal de lealdade.
No ano seguinte, em 622, uma delegação de cerca de 75 muçulmanos, dos Banu Aws e Khazraj de Yathrib, vieram para a peregrinação e, além de reafirmar as promessas formais, asseguraram a Muhammad seu total apoio e proteção se ele e sua comunidade perseguida em Meca, migrassem para a sua cidade. Eles também o convidaram para vir a Yathrib como um árbitro, para fazer uma reconciliação entre tribos hostis.
Durante o início do século VII, Yathrib era habitada por dois tipos de população: árabes judeus e pagãos. Os judeus daquela cidade tinham três clãs principais: Banu Qaynuqa, Banu Nadir e Banu Qurayza. Os pagãos árabes tinham duas tribos: Banu Aws e Khazraj. Naquela época, os judeus daquela localidade tinham a vantagem de seu grande assentamento e imensa propriedade.
Antes do encontro entre Muhammad e os seis homens de Yathrib, em 620, seguiu-se uma terrível batalha entre Aws e Khazraj, conhecida como a Batalha de Buath, na qual muitas personalidades importantes, de ambos os lados, morreram, deixando Yathrib em um estado de desordem.
As regras tradicionais para manter a lei e a ordem tornaram-se disfuncionais e, sem um homem neutro com autoridade considerável sobre as coisas, a estabilidade parecia improvável.
Como os pagãos árabes de Yathrib viviam em estreita proximidade com os judeus, eles haviam adquirido algum conhecimento sobre suas escrituras e haviam ouvido os judeus esperando a chegada de um futuro profeta.
É, em parte, por causa desse conhecimento, tomado em conjunto com a necessidade de um juiz, que os seis homens que encontraram Muhammad na temporada de peregrinação, de 620, aceitaram prontamente sua mensagem.
De acordo com a tradição muçulmana, depois de receber orientação divina para partir de Meca, o Profeta começou a se preparar e informou Abu Bakr de seu plano.
Na noite de sua partida, sua casa foi sitiada por homens dos coraixitas, que planejavam matá-lo pela manhã. Muhammad pediu que seu primo Ali ficasse em sua cama, para que se fizesse passar por ele, sabendo que assim que os coraixitas o descobrissem, viriam que era seu primo.
Logo, Muhammad se juntou a Abu Bakr, deixou a cidade, e os dois se abrigaram em uma caverna nas redondezas da cidade. Na manhã seguinte, os sitiantes ficaram frustrados ao encontrar Ali na cama de Muhammad. Enganados e contrariados pelo plano de fuga, eles vasculharam a cidade em busca dele, alguns deles chegaram ao limiar da caverna, mas o sucesso lhes escapou.
Quando os líderes coraixitas souberam da fuga de Muhammad, anunciaram uma pesada recompensa para quem o trouxesse de volta, vivo ou morto. Incapaz de resistir a essa tentação, os perseguidores se espalharam em todas as direções, mas, novamente, não conseguiram encontrar o Profeta. Após oito dias de jornada, Muhammad entrou nos arredores de Yathrib, por volta de junho de 622, mas não entrou diretamente na cidade.
Ele parou em um lugar chamado Quba, a alguns quilômetros da cidade principal, onde estabeleceu uma mesquita. Depois de uma estada de quatro dias em Quba, Muhammad, junto com Abu Bakr, continuou a sua migração para Yathrib, e, ao chegarem à cidade, foram recebidos cordialmente por seu povo, após doze anos sofrendo de dura perseguição e violência em Meca.
Desde aquele dia, a cidade de Yathirb passou a ser conhecida como “Medinat al-Nabawi”, “A Cidade do Profeta”, ou simplesmente Medina.
Entre as primeiras coisas que o Profeta fez para aliviar os conflitos de longa data entre as tribos de Medina, foi redigir um documento conhecido como a Constituição de Medina, estabelecendo uma espécie de aliança ou federação entre as tribos de Medina e os emigrantes muçulmanos de Meca.
Esses direitos e deveres eram específicos de todos os cidadãos e possuía diretrizes para o relacionamento das diferentes comunidades de Medina, incluindo a comunidade muçulmana com outras comunidades, especificamente os judeus e outros “Povos do Livro”.
A comunidade definida na Constituição de Medina, Ummah, tinha uma perspectiva religiosa, também moldada por considerações práticas, e preservou substancialmente as formas legais das antigas tribos árabes.
Isto foi seguido pela aceitação geral do Islã pela população pagã de Medina, com algumas exceções. Os habitantes de Medina que se converteram ao islamismo e ajudaram os emigrantes muçulmanos a encontrar abrigo, se tornaram conhecidos como os Ansar (apoiadores), enquanto os vindos de Meca se tornaram os Muhajirun (emigrantes).
Início das Jihads
Após a emigração, o povo pagão de Meca tomou todas as propriedades que os muçulmanos, que viajaram para Medina, deixaram. Este fato foi entendido como o estopim para uma resposta armada de uma comunidade religiosa que, até então, havia suportado pacificamente mais de uma década de morte e tortura.
Muhammad, então, recebeu versos do Alcorão permitindo que os muçulmanos combatessem os habitantes de Meca que ainda os prejudicava, nascendo assim as primeiras Jihads.
Em março de 624, Muhammad liderou cerca de trezentos guerreiros em uma marcha a uma caravana mercante de Meca. Os muçulmanos montaram uma emboscada para a caravana nos arredores dos Poços de Badr. Conscientes do plano, a caravana de Meca escapou dos muçulmanos.
Uma força de Meca, composta por mais de mil homens, foi enviada para proteger a caravana e confrontou os muçulmanos. Ao receber a notícia de que a caravana estava segura, a batalha de Badr começou. Embora em menor número, três para um, os muçulmanos venceram a batalha, matando pelo menos 45 pagãos, com quatorze muçulmanos mortos.
Eles também conseguiram matar alguns líderes de Meca, incluindo Abu Jahl, conhecido como o Faraó dos Muçulmanos, devido ao nível de perseguição empreendida por ele contra a comunidade islâmica. Setenta prisioneiros foram adquiridos como resultado da batalha, muitos dos quais foram resgatados.
Muhammad e seus seguidores viram a vitória como confirmação de sua fé. Os versos do Alcorão deste período em Medina, ao contrário dos versos de Meca, relacionados largamente com questões de credo, lidavam com problemas práticos do governo e questões como a distribuição de espólios.
A vitória fortaleceu a posição de Muhammad em Medina. Após a Batalha de Badr, Muhammad também fez alianças de ajuda mútua com várias tribos beduínas, buscando proteger sua comunidade dos ataques da parte norte da Península Arábica por parte dos aliados de Meca.
No entanto, a comunidade muçulmana de Medina teria de enfrentar a primeira tensão por parte de seus aliados judeus. Depois de Badr, um dos chefes do clã judaico dos Banu Nadir, Ka’b ibn al-Ashraf, foi aos Coraixitas de Meca para lamentar a perda de Badr e incitá-los a pegar em armas contra os muçulmanos para recuperar a honra perdida, planejando abertamente um ataque por trás.
Relatos narram que uma mulher muçulmana visitou uma joalheria no mercado da tribo judaica dos Banu Qaynuqa e lá foi molestada. O ourives, um judeu, prendeu sua roupa de tal forma que, ao se levantar, ela foi despida. Um homem muçulmano que se aproximou da comoção resultante, matou o comerciante em retaliação. Porém, uma multidão de judeus da tribo Qaynuqa atacou o homem e o matou.
Isso se transformou em uma cadeia de assassinatos por vingança, e a inimizade cresceu entre os muçulmanos e os Banu Qaynuqa. O profeta considerou os acontecimentos uma violação do pacto de não-agressão dos quais esta tribo judia, em específico, era signatária.
Por este motivo, foi decidido que eles seriam expulsos de Medina, entretanto, alguns membros da tribo escolheram ficar na cidade e se converter ao Islã.
A Batalha de Uhud
Os habitantes de Meca estavam ansiosos para vingar sua derrota em Badr. Para manter a prosperidade econômica, os habitantes de Meca precisaram restaurar seu prestígio, que havia sido reduzido após a derrota. Abu Sufyan, o novo líder pagão, reuniu um exército de 3.000 homens e partiu para um ataque a Medina.
Um batedor alertou Muhammad da presença e número do exército de Meca. Na manhã seguinte, na conferência muçulmana de guerra, surgiu uma disputa sobre a melhor maneira de repelir o exército pagão. Muhammad e muitas figuras importantes sugeriram que seria mais seguro lutar dentro de Medina, aproveitando as fortificações.
Porém, muçulmanos mais jovens argumentaram que os habitantes de Meca iriam destruir as plantações, e se amontoar em suas fortalezas destruiria o prestígio muçulmano. Muhammad acabou por concordar com os muçulmanos mais jovens e preparou a força muçulmana para a batalha.
Muhammad levou sua força para fora, até a montanha de Uhud, localização do acampamento de Meca, e lutou na Batalha de Uhud em 23 de março de 625. Embora o exército muçulmano tivesse vantagem nos primeiros encontros, a falta de disciplina por parte dos arqueiros, estrategicamente colocados, levou a uma derrota muçulmana.
Cerca de 75 muçulmanos foram mortos, incluindo Hamza, o tio do Profeta, que se tornou um dos mais conhecidos mártires da tradição muçulmana. Os habitantes de Meca não perseguiram os muçulmanos, em vez disso, eles marcharam de volta para Meca declarando vitória, pois Muhammad foi ferido durante o combate e considerado morto.
Quando eles descobriram que o Profeta sobreviveu, os habitantes de Meca não retornaram, devido a informações falsas sobre novas forças vindo em sua ajuda. O ataque não conseguiu atingir o seu objetivo de destruir completamente os muçulmanos. Eles enterraram os mortos e retornaram a Medina naquela noite.
Abu Sufyan dirigiu seu esforço para outro ataque a Medina. Ele ganhou apoio das tribos nômades ao norte e leste da cidade, usando como propaganda a fraqueza de Muhammad, promessas de espólio, lembranças do prestígio dos coraixitas e de suborno.
A nova política do Profeta se concentrou em tentar impedir alianças contra ele. Após a derrota pelos Coraixitas no Monte Uhud, em março de 625, o clã judeu dos Banu Nadir passaram a desafiar abertamente a liderança do Profeta. Após duas conspirações de assassinato fracassadas, o Profeta decidiu pôr fim à ameaça do clã judaico, sitiando sua fortaleza por quatorze dias.
Eles esperavam receber reforços de seus correligionários dos Banu Qurayza, porém, a ajuda não chegou, e os Banu Nadir se renderam. O Profeta fez um acordo com eles no qual podiam partir sem mais hostilidades, levando todos os seus bens, com exceção das armas.
Os judeus então formaram uma procissão de 600 camelos e partiram de Medina, cantando músicas e tocando instrumentos, acompanhados por suas mulheres ricamente adornadas que desfilaram pela cidade, deixando todos impressionados.
Batalha das Trincheiras
Com a ajuda dos exilados Banu Nadir, o líder militar de Meca, Abu Sufyan, reuniu uma força de 10 mil homens. Muhammad preparou uma força de cerca de 3.000 homens e adotou uma forma de defesa desconhecida na Arábia naquela época. Os muçulmanos cavaram trincheiras em pontos estratégicos, onde eles estavam mais propícios a ataques de cavalaria.
A ideia é creditada a um persa convertido ao islamismo, Salman. O cerco de Medina começou em 31 de março de 627 e durou duas semanas. As tropas de Abu Sufyan não estavam preparadas para as fortificações e, após um cerco ineficaz, a coalizão decidiu voltar para casa.
Durante a batalha, a tribo judaica dos Banu Qurayza, localizada ao sul de Medina, entrou em negociações com as forças de Meca para trair o Profeta. Após negociações prolongadas, nenhum acordo foi alcançado, parte devido às tentativas de sabotagem por alguns dos batedores do Profeta.
Após a retirada da coalizão, os muçulmanos acusaram os Banu Qurayza de traição e sitiaram-nos em sua fortaleza por 25 dias. Os Banu Qurayza acabaram por se render e foram julgados de acordo com o próprio código judaico para traidores em tempos de guerra. Seus homens foram mortos, porém, mulheres e crianças poupadas.
Tentativa de peregrinação menor (Umrah)
Embora o Profeta tenha proferido versos do Alcorão comandando o Hajj, os muçulmanos não o realizaram devido à inimizade com os pagãos de Quraysh. No mês de Shawwal do ano de 628, Muhammad ordenou a seus seguidores que obtivessem animais sacrificiais e se preparassem para uma peregrinação menor (Umrah) a Meca.
Ao ouvir falar dos cerca de 1.400 muçulmanos, os coraixitas despacharam 200 cavaleiros para detê-los. Muhammad evitou-os, tomando um caminho mais difícil, permitindo que seus seguidores alcançassem al-Hudaybiyya nos arredores de Meca.
Negociações para o firmamento de um contrato entre muçulmanos e coraixitas começaram com emissários viajando de al-Hudaybiyya para Meca. Porém, somente 10 anos depois o tratado foi assinado.
Os seus pontos principais incluíam a cessação das hostilidades, o adiamento da peregrinação de Muhammad para o ano seguinte e o acordo para enviar de volta qualquer muçulmano de Meca que emigrasse para Medina, sem a permissão do chefe de seu clã. Muitos muçulmanos não estavam satisfeitos com o tratado, porém, mais tarde, perceberam seu benefícios.
Esses benefícios incluíam o reconhecimento de Muhammad como um oponente político de respeito, uma maior liberdade para a consolidação do poder em Medina, bem como mais liberdade religiosa para pregação e a admiração dos habitantes de Meca, que ficaram impressionados com os rituais de peregrinação islâmicos.
Batalha de Khaybar
Depois de assinar a trégua, Muhammad montou uma expedição contra o oásis judeu de Khaybar, no que ficou conhecido como a Batalha de Khaybar. Isto possivelmente aconteceu pois os judeus do oásis abrigaram os Banu Nadir, que estavam incitando hostilidades contra os muçulmanos através de sua influência.
Segundo a tradição muçulmana, Muhammad também enviou cartas a muitos governantes da época, convidando-os a tornarem-se muçulmanos. Ele enviou cartas, através de mensageiros, a Heráclio do Império Bizantino (Império Romano do Oriente), Cosroes II da Pérsia, o rei do Iêmen, entre outros.
Os bizantinos estavam reocupando territórios árabes após o acordo de paz entre o imperador Heráclio e o general sassânida Sasharid Shahrbaraz, em julho de 629, após as terríveis guerras entre os dois impérios.
Enquanto isso, Muhammad enviou seu emissário ao governante de Bosra. Enquanto estava a caminho da cidade, o emissário foi executado, por ordens de um oficial gassânida, na aldeia de Mu’tah.
Considerando a morte de seu emissário uma declaração aberta de guerra, o Profeta dirigiu suas forças contra os árabes gassânidas, no solo bizantino da Transjordânia, em uma batalha que ficou conhecida como Batalha de Mu’tah. Porém, seus três mil homens foram derrotados pelos dez mil vassalos árabes do Império Bizantino.
Fim da trégua da Hudaybiyyah
A trégua de Hudaybiyyah foi aplicada, porém durou apenas dois anos. A tribo dos Banu Khuza mantinha boas relações com Muhammad, enquanto seus inimigos, os Banu Bakr, haviam se aliado aos habitantes de Meca.
Um clã dos Bakr fez uma incursão noturna contra os Khuza, matando alguns deles. Os habitantes de Meca ajudaram os Banu Bakr com armas e, de acordo com algumas fontes, alguns homens participaram dos combates.
Após este evento, Muhammad enviou uma mensagem a Meca com três condições, pedindo-lhes para aceitar uma delas. O Profeta pediu que eles escolhessem entre: pagar o dinheiro de sangue pelos mortos entre a tribo dos Khuza, se dissociarem dos Banu Bakr ou declarar a trégua de Hudaybiyyah nula.
Os habitantes de Meca responderam que aceitavam a última condição. Logo eles perceberam seu erro e enviaram Abu Sufyan para renovar o tratado Hudaybiyyah, um pedido que foi declinado por Muhammad.
O Profeta começou a se preparar para uma campanha. Em 630, ele marchou sobre Meca com dez mil muçulmanos. Com o mínimo de combates isolados nos arredores, Muhammad conquistou Meca de forma largamente pacífica.
Ele declarou anistia pelos crimes passados dos pagãos, com exceção de dez homens e mulheres que eram culpados de assassinato ou que desencadearam a guerra e perturbaram a paz. Alguns destes foram, mais tarde, perdoados.
A maioria dos habitantes de Meca, que se converteram voluntariamente ao islamismo, junto com Muhammad, destruíram todas as estátuas de deuses pagãos e em torno da Caaba. De acordo com alguns, Muhammad poupou pessoalmente pinturas e afrescos de Maria e Jesus, mas outras tradições sugerem que todas as imagens foram apagadas.
Os anos seguintes foram marcados por algumas poucas campanhas militares contras hostis tribos pagãs, que terminaram em acordos amistosos e a conversão das mesmas à religião islâmica.
Em 632, no final do décimo ano após a migração para Medina, Muhammad completou sua primeira verdadeira peregrinação islâmica a Meca, dando precedência à Grande Peregrinação anual, conhecida como Hajj. No dia 9 de Dhu al-Hijjah, último mês do calendário lunar, ele proferiu seu Sermão de despedida, no monte Arafat, a leste de Meca.
Neste sermão, ele aconselhou seus seguidores a não seguir certos costumes pré-islâmicos. Por exemplo, ele disse que um branco não tem superioridade sobre um negro, nem um negro tem qualquer superioridade sobre um branco, exceto pela piedade e boa ação.
Ele aboliu antigas disputas de sangue e disputas baseadas no antigo sistema tribal. Comentando sobre a vulnerabilidade das mulheres em sua sociedade, Muhammad pediu aos seus seguidores masculinos que fossem bons para suas esposas.
Ao longo de sua vida, o Profeta teve treze mulheres no total, embora dois de seus relacionamentos tenham contas ambíguas, Rayhana bint Zayd e Maria al-Qibtiyya, sendo descritas como esposas ou concubinas.
Após a morte de sua primeira esposa, Khadijah, foi sugerido a Muhammad que ele deveria se casar com Sawda bint Zama, uma viúva pobre, de idade um pouco avançada, ou Aisha, filha de Um Ruman e seu melhor amigo Abu Bakr. É dito que Muhammad fez o pedido dos arranjos para casar-se com ambas.
Os casamentos de Muhammad, após a morte de Khadija, foram realizados principalmente por razões políticas ou humanitárias. As mulheres eram viúvas de muçulmanos mortos em batalha e ficavam sem um protetor, ou pertenciam a famílias ou clãs importantes a quem era necessário honrar e fortalecer alianças.
Os hadiths falam que, em casa, Muhammad realizava tarefas domésticas, como preparar comida, costurar roupas e consertar sapatos, tendo uma vida extremamente humilde e ainda que fosse um poderoso líder, costumava passar fome. Além disso, é dito também que ele havia acostumado suas esposas ao diálogo, jamais sendo rude com elas.
Khadijah, ao todo, teve seis filhos com Muhammad, quatro mulheres, Ruqayyah, Umm Kulthum, Zainab e Fatimah, e dois homens, Abdullah e Qasim, que morreram na infância. Todos, exceto uma de suas filhas, Fatimah, morreram antes dele.
Maria al-Qibtiyya lhe deu um filho chamado Ibrahim, mas a criança morreu quando tinha dois anos de idade. Nove das esposas do Profeta sobreviveram após sua morte e seus descendentes continuaram através de seus netos, filhos de sua filha Fatimah, Hassan e Hussein.
Poucos meses depois da Peregrinação de Despedida, o Profeta ficou doente e sofreu durante vários dias com febre e fraqueza. Ele morreu numa segunda-feira, 8 de junho de 632, em Medina, aos 62 ou 63 anos, na casa de sua esposa Aisha.
Com a cabeça apoiada no colo de Aisha, ele pediu a ela para se desfazer de seus últimos bens mundanos, sete moedas, que foram dadas em caridade. Depois disso, ele falou suas últimas palavras e desfaleceu.
Bibliografia
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