Depois de concluído o Cerco de Antioquia, em 28 de junho de 1098, que resultou num extremar da violência dos cruzados contra os muçulmanos e no massacre dos habitantes da cidade, os ocidentais continuavam com poucos mantimentos.

Ineficazes na avaliação e proteção das linhas de provisões, os peregrinos da Primeira Cruzada sofriam com a fome generalizada e a falta de equipamentos adequados. O recurso para a obtenção destes bens foi a pilhagem dos arredores de Antioquia, que aumentariam com a chegada do Inverno.

Em Julho de 1098, Raymond Pilet, um cavaleiro do exército de Raimundo IV de Toulouse, liderou uma expedição contra Maarate, uma cidade importante na estrada que levava a Damasco. Este contingente enfrentou a mais numerosa guarnição muçulmana na cidade e foi completamente derrotado, sofrendo muitas baixas.

Durante o resto do verão, os cruzados continuaram uma lenta marcha em direção ao sul, conquistando várias pequenas povoações, visando finalmente alcançar seu objetivo final, Jerusalém.

No final do mês de Novembro, milhares de cruzados começaram a cercar Maarate. Com a aproximação do Inverno e a falta de provisões, os católicos não podiam permitir que este se tornasse num cerco demorado, mas as defesas da cidade, que incluíam um fosso profundo e fortes muralhas, revelaram-se difíceis de ultrapassar.

Inicialmente, pouco preocupados, devido à derrota que tinham infligido anteriormente aos invasores, os defensores da cidade, na sua maioria uma milícia urbana e cidadãos sem experiência em batalha, conseguiram repelir, durante duas semanas, os ataques.

Entretanto, os cruzados construíram uma torre de cerco, o que lhes permitiu ultrapassar as muralhas ao mesmo tempo que um grupo de cavaleiros escalava os muros não defendidos do outro lado da cidade.

Em 11 de Dezembro, os cruzados ocuparam as muralhas e os muçulmanos se retiraram para o interior da cidade. Todos se prepararam para aguardar o amanhecer antes de voltar a atacar, mas os peregrinos cristãos mais pobres aproveitaram para iniciar ações de saque.

Na manhã de 12 de Dezembro de 1098, os muçulmanos já haviam se rendido mediante a um acordo com Boemundo de Taranto, que firmava a liberação e a garantia de salvo-conduto dos moradores que abrissem os portões para o exército cruzado.

Porém, após a abertura dos portões, teve início um massacre que, de acordo com o cronista Ali Ibn al-Athîr, fez 100.000 vítimas, entre muçulmanos, judeus e, até mesmo, cristãos ortodoxos.

E, na falta de comida após a invasão e o massacre, os cruzados passaram a comer suas vítimas. Depois de incendiar as casas e destruir as fortificações de Maarate, em 13 de Janeiro de 1099, a Cruzada prosseguiu a marcha na direção sul, onde cometeria uma chacina ainda pior.

Particularmente, durante esta expedição, mas também nas cruzadas subsequentes, os peregrinos cometeram numerosas atrocidades contra as populações muçulmanas, judias e cristãs ortodoxas: execuções em massa, o catapultar das cabeças dos inimigos sobre cidades cercadas, exibição e mutilação de cadáveres nus dos muçulmanos e canibalismo, como neste caso.

Vários autores sugerem que o comportamento dos cruzados não se deveu necessariamente só à fome, mas à sua crença, nascida do ódio pregado contra os muçulmanos pelos sacerdotes cristãos, de que os sarracenos estariam num nível de consideração abaixo dos animais. Este ponto de vista ficou expresso na crônica de Alberto de Aquisgrão:

Os cristãos comeram não apenas os turcos ou sarracenos mortos, mas até mesmo cães […]

Um outro cronista, Radulph de Caen escreveu (em 1107, 9 anos após o fato):

Algumas pessoas disseram que, constrangidos pela falta de comida, ferveram os pagãos adultos vivos nas panelas e empalaram crianças no espeto, devorando-as grelhadas.

Estes eventos foram também narrados pelo padre Fulcher de Chartres, um dos religiosos católicos que acompanhava a marcha da Primeira Cruzada:

Tremo só de dizer que muitos de nossos povos (cruzados europeus), assediados pela loucura da fome excessiva, cortaram pedaços das nádegas dos sarracenos já mortos, que eles cozinhavam, mas quando ainda não estavam torrados o suficiente pelo fogo, eles os comiam daquele jeito, com suas bocas selvagens.

Bibliografia